E agora pergunto eu...
Ia tendo o prazer de dizer que passámos uma semana sem exonerações, mas foi exonerada e depois nomeada a nova administração da empresa de resíduos nacionais, então, querido leitor, mudemos de assunto, até porque a nossa actualidade andou, recheada de acontecimentos, para parafrasear um jovem técnico que conheço, muito, muito caricatos.
A novela brasileira da IURD em Angola, que tem direito a tomadas de igreja pela força, violência, armas, acção, pragas, maldições e vasectomias, é um exemplo de tema cheio de perguntas. Como “Se a IURD é o ‘negócio rentável’ que vale toda esta luta que mensagem está o Estado a passar aos ‘investidores estrageiros’ quando permite (e segundo os brasileiros ajuda) uma tentativa de ‘nacionalização’ pela força e discurso contra estrageiro?”
A propósito de nacionalização, essa palavra tão caricata, o presidente português anunciou a nacionalização da Efacec, a empresa portuguesa de engenharia em que Isabel dos Santos detinha mais de 70% do capital.
E sobre este tema não faltam perguntas....
É que se o restante investimento de angolanos em Portugal podia ser, por um ou outro motivo, questionável, este na Efacec tem muito que se lhe diga...
Em 2015 já se escrevia que a elite angolana havia tornado Lisboa no seu recreio, que Portugal se estava a tornar numa colónia financeira do petróleo angolano, e, a face mais visível dessa colonização dos antigos colonizadores era a da primogénita do ex-presidente. E havia um certo orgulho angolano nisso, “somos os donos da metrópole”, pobres complexados, traumatizados... Entre 2010 e 2014 o investimento angolano, ou melhor, o investimento de angolanos (que a diferença é muita no que toca a quem colhe benefícios) em Portugal subiu de 645 milhões de euros para mais de 1,5 mil milhões de euros, quase 2 mil milhões de dólares em quatro anos. E não ficou por aí com algumas estimativas a duplicar esse valor.
E Isabel dos Santos, a visada na actual cruzada, não estava de todo sozinha nessa empreitada de conquistas portuguesas (que se revelam hoje tão fáceis de reconquistar pelos portugueses).
O gigantesco investimento na banca, apesar das possibilidades da integração no sistema financeiro internacional, do potencial crescimento e internacionalização de empresas nacionais e acesso a crédito, permitiu simultaneamente uma fuga de capitais provavelmente bem superior aos benefícios colhidos pelo país.
Há outros exemplos. Tivemos muito investimento angolano perdido na média portuguesa, numa tentativa vã de influenciar a opinião pública lusa. Fui beneficiária enquanto recém-formada que teve a oportunidade, através desses investimentos angolanos, de estagiar em meios de referência como eram na altura o Económico ao serviço do jornal Expansão e pelo qual só tenho a agradecer. No entanto, os benefícios públicos são pouco relevantes face ao valor dos investimentos nessas empresas.
Este investimento na Efacec era a todos os títulos diferente dos outros. Era de facto estratégico.
A Efacec é a maior empresa portuguesa no campo das energias e actualmente, depois de salva da falência pelo investimento de IS, líder em soluções de mobilidade e carregamento de baterias com presença em diferentes mercados, Espanha, EUA, India. É uma empresa com um know-how com que em Angola só podemos sonhar, altamente especializado, com imensa capacidade científica, e que justifica até o interesse da gigante mundial Tesla, actualmente o mais valorizado produtor automóvel do mundo, que muito por conta da Efacec, planeia uma unidade fabril em Portugal.
Não é à toa que Portugal como um jogador de xadrez experiente, aproveitou a desorganização entre os mangops, para reaver um activo tão valioso a custo quase zero, numa nacionalização justificada com dificuldades criadas por um arresto, por sua vez baseado em acusações ainda por provar, mas que serviram...
Pergunto-me que benefícios para além do óbvio castigo público do governo a IS poderá ter o abdicar de um activo com um potencial multibilionário e incalculável para nós em termos estratégicos e em termos também de transferência de know-how?
É que na era da pressão mundial para a aposta nas energias limpas, a produção de baterias eléctricas e outras soluções alternativas aos fosséis, está nos lugares cimeiros do recurso às tecnologias. E agora pergunto eu, que trunfo irá ‘o nosso jogador de xadrez’ buscar, que de alguma forma compense a perda de uma Efacec?
É que é bom lembrar também que a empresa nem sequer foi comprada com dinheiro saído daqui. Foi comprada com empréstimos que os bancos em Portugal concederam a IS porque confiavam que podia pagar (o racional dos bancos para emprestarem), e que estava de facto a pagar pelo que reaver a empresa para o Estado Angolano (como se soubesse o que fazer com empresas) estaria provavelmente fora de qualquer possibilidade. Mas pergunto-me qual será a compensação que o governo vai buscar para justificar esta perda de participação numa empresa cujo prestigio e importância só dariam a ganhar a Angola... Tem de haver alguma compensação porque Portugal não faria essa jogada sem concertação. Que não tenha sido um mero “fiquem vocês com isso só para ela não ficar” em que sai o país a perder. Terá de haver alguma coisa maior do que a humilhação de uma empresária, que valha, não só a perda completa da Efacec, mas mais esta associação à corrupção e o isolamento que toda essa instabilidade invariavelmente vai trazer.
“Os mangops a lutar, o que podemos ganhar com isso” é o pensamento várias jogadas à frente dos governantes portugueses, e esse sim é estratégico. A desculpa da intervenção para salvar os 2500 postos de trabalho é assim mais ou menos, até porque ainda não havia indícios de que esses empregos estivessem em risco, como há indícios de risco sério para os empregos do Candando em Angola... E que bom seria se o nosso Executivo tivesse (como os portugueses) a mesma preocupação salvar postos de trabalho, acima de tudo...
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