Suely de Melo

Suely de Melo

Esta semana o baralho voltou a ser redistribuído com algumas cartadas novas… pra variar! No jogo de mete-mete, tira-tira, algumas cartas ficaram de fora. Houve festa no Cuanza Sul com a saída do activista político, Job Capapinha, que fica assim obrigado a abandonar o tal lugar doce de que há uns tempos falava. Do Huambo foi ‘tundada’ Loti Nolika que, nos últimos tempos, também não granjeava grande simpatia da população. Na tomada de posse, não faltaram os habituais ‘beffs’ do ‘exonerador implacável’, porém desta vez um pouco mais comedido. O que nos deixou a muitos com um gostinho de “quero mais”. Afinal, é apenas e somente por essa via que conseguimos especular os motivos por detrás de algumas exonerações. Entretanto foi possível perceber os atestados de incompetência passados aos então governadores do Cuanza-Sul e do Huambo. Mara Quiosa e Pereira Alfredo, além de governadores, vão para estas províncias com a função de bombeiros, segundo palavras de João Lourenço. Conseguirão apagar o alegado fogo deixado? O tempo no-lo dirá!... Em Cabinda também houve festa… Mal soube que saiu de administradora municipal para governadora, Suzana Abreu juntou familiares e amigos para comemorar. As comemorações estenderam-se a Luanda e, depois de ter tomado posse, juntou mais um grupo algures pela capital, com direito à presença de alguns cantores, dança tradicional e até bolo.

Por onde começar, numa semana tão fértil de acontecimentos que deixam qualquer um boquiaberto?!

Comecemos por pedir que alguém nos esclareça quanto ou o que os angolanos devem a Joel Leonardo, que aparentemente tem mais poderes que qualquer um neste país. Que existam os intocáveis, não é novidade para ninguém. Mas, quando se fala no presidente do Tribunal Supremo (TS), a situação ultrapassa todos os limites do absurdo. Um juiz que quase diariamente é denunciado por alegadamente estar envolvido em actos de corrupção; um juiz que, ao que se diz, faz e desfaz no TS e no Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ), como se de sua casa se tratasse; um juiz que alegadamente vilipendia e persegue os seus pares que não lhe seguem a bala; um juiz alvo de uma acção popular promovida por um grupo de advogados da Ordem; um juiz que é alvo de uma investigação da PGR; um juiz que desrespeita uma decisão do Tribunal Constitucional e consequentemente a Constituição da República de Angola; um juiz que não permite que cidadãos angolanos, entre os quais deputados e o líder do maior partido na oposição, entrem na sua casa, porque é assim que ele vê o TS.

05 Jul. 2024

Não há plano B…

O povo angolano, especial como alguém o chamou, acreditou no discurso daquela figura enigmática, aparentemente honesta que se lhes apareceu em 2017. Os angolanos acreditaram que esta figura de facto estaria disposta e habilitada a resolver os problemas políticos, sociais e económicos. Muito boa gente depositou a confiança e o voto no partido da situação para que, apesar de ter sido quem afundou o país, pudesse ele mesmo ser protagonista da mudança e da construção de um país mais justo para todos. Os discursos indicavam para esse caminho. O povo acreditou e reelegeu o mesmo partido, porém com um rosto diferente, o que dava essa sensação de segurança.

No ano passado, o ‘Dias Andados’ fez o exercício de contagem das viagens do Presidente da República. Isso foi em Setembro e já se contavam uma dúzia de deslocações do chefe de Estado. Este ano o mesmo exercício é feito mais cedo, mas já se contam a mesma dúzia de viagens nos primeiros seis meses de 2024. Em Janeiro, depois de ter regressado das polémicas férias a Seycheles, João Lourenço foi à RDC para a cerimonia de investidura de Felix Tshisekedi. Em Fevereiro fez uma visita oficial à República Checa, e à Etiópia para a 37ª Sessão Ordinária da Conferência de Chefes de Estado e de Governo da União Africana. Já em Março fez uma visita oficial à China e no mesmo mês foi à Zâmbia para a Cimeira da Dupla Troika da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral. Em Abril foi a Portugal participar da comemoração dos 50 anos da revolução dos cravos, de seguida efectuou uma visita oficial de dois dias à Coreia do Sul e ainda no mesmo mês foi aos EUA para a Cimeira Empresarial Estados Unidos-África. Em Maio foi às Ilhas Comores à investidura do Presidente Azali Assoumani. Este mês já foi ao Botswana para uma visita de Estado e à Africa do Sul para investidura de Cyril Ramaphosa.

Já é o ‘habitué’ em tempos de campanha eleitoral vermos por aí as t-shirts vermelhas ‘diambolarem’ pelos municípios a visitarem os potenciais eleitores. Naturalmente, naquele ‘corpo a corpo’, que não é normal no resto da legislatura, ouvem-se reclamações, sugestões e pedidos, que aparentemente, à mesma velocidade que entram, saem. Como se costuma dizer, entram por um ouvido e saem pelo outro. De qualquer forma, seria revelador saber o que se pede nesse ‘tête-à-tête’. Reivindicações colectivas ou individuais, o que realmente querem os ‘eleitores’? Quais os seus anseios? Do que reclamam? Não que já não saibamos o que falta – que é quase tudo – mas o que essas pessoas exigem que possa gerar nos governantes algum compromisso com o cidadão? Por outro lado, haverá efectivamente algo que gere nesses mesmos governantes algum tipo de compromisso com o cidadão? Tudo indica que não. Na politicagem que se faz em Angola, a lição segundo a qual a boa política trabalha e investe todos os recursos para a autonomia do cidadão e a política nociva aposta na dependência das pessoas foi bem estudada. Daí verem-se pessoas supostamente bem estudadas e aparentemente cultas fazerem-se de zungueiras com bacias na cabeça, contendo sabe lá Deus o quê, de porta em porta. O teatro assombroso, sem o mínimo respeito à dignidade humana, repetiu-se no último fim-de-semana, o que nos remeteu à campanha de 2017 em que o MPLA ofereceu, entre outros, kits de engraxador e à de 2022 que ofereceu bicicletas aos potenciais eleitores. O que o partido no poder já deu mostras de não conseguir oferecer é a realização dos sonhos e anseios dos angolanos. A transformação da realidade penosa por que passam. Não consegue oferecer o progresso e a autonomia da população. Não consegue oferecer a dignificação e equidade. Se é assunto para nos lamentarmos? Provavelmente não. Lamentos poderão não mais fazer sentido. Não se grita aos surdos e nem se apresentam caminhos aos cegos. Entretanto, há quem ainda mantenha a esperança de que o jogo venha a virar num futuro não muito distante. Que quem hoje alimenta com migalhas venha a saborear do seu próprio alimento.