E agora pergunto eu...
Seja bem-vindo, querido leitor, a este seu espaço onde perguntar não ofende depois de uma semana em que a actualidade NÃO foi marcada pela gigantesca manifestação que a Oposição organizou no fim-de-semana passado. Assim como NÃO foi marcada pelo regresso do mais velho que foi presidente do país durante quase 40 anos...
O regresso de JES a casa foi notícia nos países vizinhos da região, nos meios de comunicação em Portugal era notícia antecipada há muito, qual regresso de Dom Quixote, foi notícia da Reuters, da Bloomberg, mas para os nossos media públicos, o regresso do homem que governou o país e (que ocupou mais tempo de antena do que qualquer outro durante quase quatro décadas de enaltecimentos diários, inclusive da parte do actual presidente), de repente, não é noticia que marque a actualidade do país. É notícia, no entanto, que JES falou ao telefone com JLO...
As mutações degenerativas a que a política obriga – e digo mutações porque é uma expressão sem a beleza da metamorfose – estas mutações degenerativas são cada vez mais dignas de dó, e cada vez mais prova de que o outrora grande partido está, de facto, cada vez mais partido, quebrado.
E agora pergunto eu, se as TPAs estão a pôr José Eduardo dos Santos e Adalberto Costa Júnior no mesmo saco de vetados que “não são de interesse público”, será que essa mistura significa que o mais velho, depois de tantos anos, vai ficar oposição, ou será que significa que é o mais novo que se aproxima perigosamente de deixar de o ser?
Correndo o risco de me tornar repetitiva, e porque o ambiente está cada vez mais tenso e inquinado, mais uma vez, vou lembrar, e pedir que se lembre mais vezes, que as pessoas que vêm dar a cara por estes malabarismos mutantes, não são responsáveis pelas ideias estapafúrdias que são obrigadas a regurgitar. Ver caras de jornalistas – alguns que sabemos serem profissionais competentes – associadas ao pardieiro em que a política chafurda os meios públicos, leva a temer pela sua segurança.
Se é verdade que os dois jornalistas que foram cobrir a manifestação não sofreram as agressões que se queria fazer pensar (como as que sofreu o jornalista guineense cuja foto foi usada para ilustrar), é verdade que quem vai dos media públicos cobrir actividades da Oposição ou manifestações está sujeito a sofrer uma violência que é, no fundo, dirigida a quem manipula as empresas publicas de comunicação, não aos profissionais que têm de ter coragem para estar ali. Aqueles dois jovens e os outros jornalistas que vão cobrir estas actividades não têm qualquer poder de decisão sobre a pauta como lembrava o administrador que provavelmente também não tem. Aqueles jornalistas podiam bem ser um membro da família de qualquer um de nós, e que não gostaríamos de ver à mercê de uma multidão em fúria que facilmente pode ultrapassar limites e causar uma desgraça, que não só vai desgraçar uma família, como vai manchar a lógica e a motivação dessas manifestações e certamente vai ser usada para vitimização política de quem originou a raiva popular contra os meios de comunicação públicos. Quanto aos jornalistas que dão a cara por estas pautas editoriais saídas do CAP central (e, por isso, CAPciosas), vale lembrar aqueles actores que fazem o vilão das novelas, e que levam chapada e empurrão na rua, porque há quem não consiga distinguir o que é novela, ou filme, do que é realidade.
Voltando a realidades que, tal como a popularidade de Adalberto Costa Júnior ou o regresso de JES, NÃO são matéria de actualidade com relevância para o país, a Transparência Internacional, uma organização alemã que actua por todo o mundo com parceiros como as Nações Unidas, e que produz o barómetro global da corrupção, emitiu, também na semana passada, um comunicado considerando muito graves os indícios de branqueamento de capitais angolanos envolvendo a Sonangol depois de uma queixa de três organizações angolanas: a Associação Mãos Livres, a Omunga e o Fórum Regional de Desenvolvimento Universitário. As três ONG deram entrada de uma queixa em Portugal contra antigos administradores da petrolífera nacional, entre os quais, não podia deixar de figurar, o ex-Vice-Presidente da República Manuel Vicente, a figura que, quase sozinha, ridiculariza sempre como selectivo o combate à corrupção do Presidente João Lourenço. E uma das questões relevantes que a Transparência Internacional levanta é que o regulador da banca portuguesa “parece não ser capaz de travar a lavandaria e que a banca foi ou ainda é usada para branquear capitais”.
Se depois de quatro anos de luta contra a corrupção, o dinheiro continua teimosamente a sair, que atestado recebe a dita luta? Uma luta CAPciosa como é a pauta editorial das TPAs pode receber uma notação diferente da que recebe o cumprimento da promessa dos 500 mil empregos, ou da Califórnia, ou da aposta na educação (que, na semana passada, se tornou ainda mais cara)?
Salvador Freire, o advogado que falou pela causa, disse que o processo poderia ter sido intentado em Angola, mas as organizações decidiram avançar com a acção "numa esfera em que fosse possível responsabilizar os diferentes actores". Que vergonha! Só queixando fora é que se tem esperança de responsabilização porque em Angola só se for turma ‘dos Santos’.
Esta queixa diz respeito a negócios no valor de 35 milhões de dólares – amendoins perto do que se estima ser a fortuna dos mais ricos da Sonangol – o centro da corrupção multibilionária do país e que permanece opaco, intocado e inescrutável como sempre foi. E bem pode a Oposição pedir comissões de investigação às contas da maior empresa pública que esses apelos certamente NÃO serão actualidade digna de cobertura pelos meios públicos do país.
O entrevistado da Radio Essencial da semana passada, Francisco Viana, que se vê ter o partido (que anda partido) no coração, disse tudo, o cansaço é demais e é geral, é bom descansar, quase meio século de poder é uma excelente idade de reforma.
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