Governo das nossas micro, pequenas e médias empresas: Assembleias-Gerais
O mundo, e Angola não é excepção, tem acima de 95 das empresas constituídas por micro, pequenas e médias empresas, acima de 99% são sociedades por quotas, tanto uni como pluripessoais. Geralmente, e sem qualquer critério racional, apenas a tradição de transmissão oral de constituírem sociedades com capital social mínimo de 100.000 kwanzas. O governo das sociedades constitui uma ferramenta ao serviço das empresas para enfrentar os desafios dos momentos muito especiais que vivemos e construir e incentivar uma cultura empresarial sólida.
No caso das sociedades pluripessoais, e o presente artigo vai focar-se neste tipo de empresas, em que tem mais do que um sócio na Certidão Comercial da Sociedade, pela dispersão de sócios, sendo que pode ser de dois até um número bastante alargado, o momento a que chegamos, Março a Maio, sendo que essencialmente o Abril é o mês de todas as decisões. E vejamos porquê, já de seguida.
Chega uma nova época de Assembleias-Gerais e com ela o tempo de fazer um balanço sobre o governo societário da perspectiva dos vários actores do nosso tecido empresarial, em especial neste contexto pandémico.
1 – Perspectivas da empresa e dos seus stakeholders (sócios, accionistas)
Os compromissos que orientam os objectivos das empresas são testes muito relevantes para qualquer sociedade: A sociedade continua a “criar valor para os clientes”? A empresa “investe nos seus trabalhadores”? A sociedade “trata equitativamente os fornecedores”? A sociedade “apoia as comunidades em que trabalha”? A sociedade está a desenvolver uma estratégica apta a “gerar valor de longo prazo para os accionistas”?
A pandemia vem acelerar a reflexão em torno destas cinco dimensões, dando-lhe um lugar central. Esta centralidade não parece carecer de intervenção legislativa adicional. O quadro vigente tem já flexibilidade para promover uma governação sustentável, por via da Lei das Sociedades Comerciais de Angola. No caso de sociedades pluripessoais, a visão e a definição do curso da sociedade no presente, mas principalmente para o futuro é fundamental e, desta forma, o que se aconselha é que os sócios possam chegar a acordos que sejam os melhores para os superiores interesses da Sociedade.
A gestão da empresa tem já como uma das traves mestras o dever de prossecução do “interesse da sociedade, atendendo aos interesses de longo prazo dos sócios e ponderando os interesses dos outros sujeitos relevantes para a sustentabilidade da sociedade, tais como os trabalhadores, clientes e credores”. No que respeita às grandes empresas e grupos, esta matéria é objecto de deveres de divulgação anual de informação não financeira, isto é, a todas as áreas de negócio, departamentos além do departamento financeiro. Já quanto às sociedades do sector financeiro e sociedades cotadas têm vindo a ser adoptadas regras e recomendações sobre as suas práticas remuneratórias e conflitos de interesses, visando promover o alinhamento com interesses de longo prazo.
2 – Perspectivas da gestão executiva, não executiva e fiscalização
Nos últimos anos, na regulação do governo societário têm assumido grande protagonismo os temas de diversidade e de supervisão da auditoria. Num mundo em rápida mudança e num momento marcado por especial incerteza, exige-se algum recentramento dessa discussão, dando prioridade à liderança eficiente dos órgãos de administração e à adopção de processos de decisão e controlo interno que permitam lidar com este contexto. No fundo, o que se pretende é que haja órgãos de supervisão e órgãos de gestão corrente diária. No casos das micro, pequenas e médias empresas, geralmente é o empresário que tem este papel. Dentro de contexto, podemos advogar que, nas médias empresas, com a nomeação de um director-geral, a gestão fica a cargo desta posição com reporte aos sócios.
Para as nossas micro e pequenas empresas, o que se aconselha é que se possam munir de três posições-chave para a colaboração técnica para a tomada de decisão e mitigar riscos inerentes à actividade da empresa: um jurista, um contabilista e um bom gestor.
3 – Análise, debate e aprovação ou reprovação do Relatório de Gestão
A gerência da sociedade por quotas ou a administração de uma sociedade por acções deve disponibilizar aos sócios ou accionistas o relatório de gestão elaborado e compilado pelas direcções das empresas, com a obrigatoriedade de constar documentos anexos, no caso de empresas ‘SA’, tais como: relatório de certificação de contas/auditoria às contas e parecer do auditor, relatório do conselho fiscal ou fiscal único. No caso das nossas ‘Lda’, cinge-se ao relatório de gestão, que inclui o capítulo do relatório e contas com as demonstrações financeiras: balanço patrimonial, demonstração de resultados económicos e demonstração de fluxos financeiros (vulgo demonstração de fluxos de caixa ou DFC).
No caso das contas do ano anterior e que são apresentadas aos sócios, as mesmas, é na óptica fiscal, isto é, é o que será apresentado ao fisco, que, no caso de Angola, é à Administração Geral Tributária (AGT).
O que a gerência ou o conselho de administração pretende com a assembleia-geral é a aprovação do relatório gestão e, com isto, lavrar-se uma acta que confirme essa aprovação e a mesma conste do relatório técnico e de contas a apresentar e enviar de forma electrónica, pela via do Portal do Contribuinte à AGT, conjuntamente com o Modelo 1 de Imposto Industrial, sempre antes do final dos prazos previstos no Código de Imposto Industrial em vigor.
Se a empresa gera lucros, é nas assembleias-gerais que se decide o destino aos lucros após a dedução das reservas legais para o capital próprio, sendo que pode haver lugar a distribuição de dividendos pela totalidade e pela participação de cada sócio na sociedade, poderão distribuir parte e outra parte ser para reinvestimento ou reinvestimento total dos dividendos, com benefícios fiscais de Imposto Industrial.
Havendo prejuízo económico na óptica fiscal e dependendo do seu volume, e se o prejuízo é isolado apenas no ano anterior ou é continuado e acumulado, os sócios devem analisar cuidadosamente a situação e tomar medidas que possam inverter a situação e ainda conhecer o valor da empresa (‘net-book value’) na parte do capital próprio, para se perceber se há necessidade de capitalização da sociedade ou não.
Pense-se, assim, nas conclusões deste balanço que o governo das sociedades constitui uma ferramenta ao serviço das empresas para enfrentar os desafios dos momentos muito especiais que vivemos e construir e incentivar uma cultura empresarial sólida, quando construído e aplicado com proporcionalidade e adequação às características do nosso tecido empresarial. É muito mais do que análise e aprovação das contas, quando se aplica, mas o fórum próprio para a deliberação da estratégia, nomeação de órgãos de gestão da sociedade, decisões de investimento, venda de património, fusão, cisão da sociedade, entre outras decisões que cabe aos donos do capital tomar e que suplantam o normal mandato das gerências e conselhos de administração das sociedades.
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