E agora pergunto eu...
Produtos da cesta básica com aumentos de 400 por cento, quatro vezes mais caros desde que o kwanza começou a perder valor. 34% dos angolanos em pobreza moderada, e 35% em pobreza extrema, quase 70% da população pobre.
Desemprego nos 32%, desemprego jovem nos 58%, em cada 10 jovens 6 estão desempregados. Estado altamente endividado, com mais de 60% das receitas destinadas ao pagamento de dívida pública e por isso com recursos limitados para o investimento que pode criar emprego. Investidores estrangeiros muito poucos, então depois da pandemia, quase miragem. Tempestade perfeita de três crises, a que já existia desde 2015, e que continua, a do petróleo, que desde que tombou para mínimos de 10 dólares, ronda os 40 dólares e agora, a crise do Covid19 que vem adicionar mais um prego no caixão. Recessão. Catástrofe económica, catástrofe social. Tudo números e expressões que economistas da envergadura de Alves da Rocha usaram recentemente, e, mais uma vez, para alertar sobre a necessidade de priorizar, de dirigir o pouco que o Estado tem ou consegue obter para políticas que criem soluções de emergência, que criem emprego...
E eis que no meio deste cenário de absoluto pesadelo social, o Presidente da República autoriza a despesa de quase 45 milhões de dólares para construção de nova sede para a Comissão Nacional Eleitoral. João Lourenço diz que a CNE necessita de infraestruturas para acomodar condignamente os seus funcionários visando prestar melhor atendimento na missão da organização e condução dos pleitos eleitorais.
E agora pergunto eu... isto é a sério?
Nesta altura, em que estamos a ver a economia a afundar, sem perspectivas de melhora? Nesta altura em que temos gente em sério risco de vida porque centros de hemodiálise, sem stocks, voltaram a reduzir horas de tratamento. Conta o jornal O País que não recebem pagamentos devidos por um Ministério da Saúde (que anda tão entretido com o Covid-19)? Nesta altura em que temos tanta gente desempregada, que não consegue dar de comer aos filhos. Gente a passar fome...
E é nesta altura que é uma prioridade construir sedes para os funcionários da Comissão Eleitoral poderem trabalhar comodamente? Será que paredes novas para a comissão é que vão dar seriedade aos processos eleitorais?
Esta conversa perfeitamente absurda de “desempenho da missão com dignidade” vem de longe, e não é só do PR para nossa falta de sorte. É a conversa, repetida ao ponto de se tornar narrativa que justifica a despesa estapafúrdia do Estado por exemplo com as milhares de viaturas protocolares de luxo que circulam nas nossas vias permanentemente esburacadas. Vários milhões em carros de luxo para os deputados que representam angolanos que em quase 70 por cento, são pobres.
É a narrativa que justifica embaixadas e casas de embaixadores que custam verdadeiras barbaridades ao OGE. É a conversa da dignidade para desempenho de funções que justifica a construção de obras megalómanas como a da Assembleia Nacional que terá custado mais de 100 milhões de dólares e que, pior do que isso, gastava há dois anos quase dois milhões de dólares só para manutenção tudo em nome da dignidade para exercer cargos públicos...
Dignidade querido leitor... Um conceito que traduz, honra, autoridade nobreza, qualidade moral. Tudo coisas que não se merecem por decreto... Que, como se diz na gíria “não saem na farinha amparo”, que não vêm atreladas por magia a uma nomeação. Mas que se ganham com reconhecimento do trabalho em prol do bem comum. Bem comum esse, que, a avaliar pela pobreza generalizada, pelas desigualdades, pelo empobrecimento não existe em quantidade suficiente no desempenho dos nossos servidores públicos.
E que tal primeiro melhorarem os indicadores sociais, melhorarem a qualidade de vida da população que representam
e assim ganhar a tal qualidade moral merecida, para depois então ostentarem dignidade material?
Na Rádio Essencial 96.1
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