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Fiscalidade em Angola: questões tácticas e estratégicas

03 Jun. 2020 Opinião

Para além de todos as dificuldades estruturais com que se depara há vários anos, Angola confronta-se com dois problemas conjunturais complicados.

O mais relevante, e que já começou há algum tempo atrás, tem que ver com o preço do petróleo. A queda abrupta do preço deste recurso natural essencial para a economia angolana, e que representa cerca de 80% do PIB, começa em Junho de 2014 quando o preço de referência nos mercados internacionais, que se situava nos 115 dólares, inicia uma descida vertiginosa, encontrando-se, actualmente, perto dos 35 dólares. A incerteza sobre o comportamento do preço desta matéria-prima torna assim especialmente difícil, para um país como Angola, o estabelecimento de metas orçamentais minimamente credíveis. O segundo problema conjuntural, e que afecta actualmente todos os países no mundo, é o que decorre da brusca travagem a fundo das economias por causa da pandemia da covid-19.

Dir-se-ia, apesar de tudo, e de acordo com a informação oficial disponível, que Angola, até ao momento, não assistiu a um surto desta doença equiparável ao que se tem visto noutros países, mesmo naqueles que possuem infra-estruturas de apoio médico bem mais avançadas.

Mas, infelizmente, não deixará de ser afectada directamente pelos constrangimentos resultantes da declaração do estado de emergência e, indirectamente, por todos os efeitos que a pandemia está a ter nas diversas economias com as quais Angola tem relações comerciais, começando desde logo pela redução do consumo de combustíveis que, necessariamente, afectará negativamente as suas exportações e a disponibilização de moeda estrangeira.

O sistema fiscal angolano apresenta, em paralelo, uma vantagem significativa e um grande obstáculo. A vantagem significativa reside no facto de a Constituição ser relativamente pouco dirigista no que respeita à sua estrutura. Consagra, no essencial, que os impostos só podem ser criados por lei e que as normas menos favoráveis aos contribuintes não têm efeitos retroactivos.

O aspecto negativo reside na elevada informalidade que complica qualquer esforço para aumentar a base tributável sem sobrecarregar os sectores mais organizados do tecido empresarial.

Uma visão necessariamente simplista da situação levar-nos-ia a afirmar que a melhoria da situação económica do país deve ser sempre equacionada à luz de princípios estratégicos, ou seja, aqueles que são aplicados de forma consistente ao longo do tempo, independentemente das circunstâncias do momento, e de princípios tácticos, que são aqueles a que é necessário lançar a mão quando é preciso responder a uma ameaça ou a uma oportunidade no curto prazo. Sabemos que no plano dos princípios estratégicos, um dos principais pilares é a diversificação das fontes de receita do país, tentando que o mesmo fique cada vez menos dependente das variações caprichosas do preço do petróleo.

Já no que respeita aos princípios tácticos, a situação é mais nebulosa, pois as oportunidades de que Angola tem beneficiado nos últimos tempos têm sido escassas, ao passo que as ameaças não param de se manifestar, oriundas de todas as frentes, internas e externas. Para já, no plano das ameaças, a resposta aos desafios orçamentais decorrentes da baixa do preço do petróleo e os efeitos da Covid-19 parecem estar no topo da lista. Quanto às oportunidades, existe um programa de reactivação da economia (que envolve, por exemplo, um elevado número de privatizações de empresas detidas pelo Estado), a riqueza em recursos naturais que vão muito para além do petróleo e a influência regional que o país exerce.

Ou seja, parece ser lícito concluir que a ajuda que o sistema fiscal poderá dar à economia será mais no plano estratégico do que no plano táctico, pois sem as mudanças estruturais, morosas e complexas que são necessárias, a introdução de novos impostos ou a alteração dos existentes, pouca receita adicional gerará. E isso significa que Angola provavelmente continuará, nos próximos tempos, muito dependente das receitas do petróleo para fazer face às ameaças com que se confronta, e que são de curtíssimo prazo.

Mas não podemos esquecer que os fenómenos associados aos preços das matérias-primas nos mercados internacionais são cíclicos, e a situação pode inverter-se a qualquer momento, por muito que os profetas da desgraça reiterem que o caminho é sempre para baixo. E, quando o ciclo se inverter, talvez seja possível redireccionar recursos para as prioridades estratégicas, criando assim um ciclo virtuoso que, sendo difícil, pode ter sucesso no longo prazo.