Da corrupção persistente à História mal contada…
Que o país está ‘nocauteado’, de rastos e sem qualquer perspectiva de reabilitação, para qualquer um que não se venda por um prato de arroz com peixe frito não tem a menor dúvida. Mas, parafraseando a lei de Murphy, “não há nada que esteja tão mal que não possa piorar”. E, pelo visto, esse é o karma de Angola. Parece haver algum plano para se descobrir as mil formas de se acabar com um país e, ao que tudo indica, já colocaram em prática novecentas e buée. A tal corrupção que, há uns anos, fez o líder dos camaradas apelidar os seus companheiros de “marimbondos” hoje está mais do que escancarada, mais do que institucionalizada, com relatos semanais de novos casos. Se se fizesse a actualização diária dos casos de corrupção como se fez com a covid-19 e hoje se faz com a cólera seria, no mínimo, engraçado de se ver.
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Esta semana foi a vez do Ministério do Ambiente. Segundo o ‘Novo Jornal’, o pelouro de Ana Paula de Carvalho, que passou despercebido por muito tempo, é afinal um terreno fértil para negociatas milionárias. A denúncia dos esquemas terá custado ao ‘Novo Jornal’ a impressão da semana, cuja responsabilidade é da gráfica Dammer, que imprimiu o Expansão, mas, na vez no ‘Tal Jornal’, as máquinas deram boom. É no mínimo conveniente… Pelo andar da carruagem no antro da ‘marimbondagem’ não há quem se safe, portanto torna-se pertinente questionar qual será a nova alcunha utilizada por João Lourenço para se referir aos corruptos da vez. E o MPLA, com a maestria de um ilusionista de quinta categoria, apresentou-nos esta semana mais um capítulo dessa tragicomédia. Neste último acto, o partido único (ops, desculpem, agora é um partido como outro qualquer) decidiu que a história de Angola se resume a uma única página: a sua própria. Com um gesto grandioso e uma pitada de cinismo, o MPLA resolveu quem são os verdadeiros heróis da luta pela libertação nacional. Holden Roberto e Jonas Savimbi, figuras incontornáveis daquela época, foram sumariamente descartados, relegados para o limbo da história oficial. É como se o MPLA dissesse: "Esqueçam tudo o que aprenderam ou ouviram! A única versão válida é a nossa! Nós somos os bons, os puros, os únicos capazes de salvar a pátria. Os outros eram todos uns bandidos." Mas, esperem aí! Não houve um pedido de perdão que quase nos levou às lágrimas? Uma promessa de reconciliação que nos fez crer que se abriria um novo capítulo na história? Ou essa conversa serve apenas para as atrocidades cometidas pelo partido no poder? Como reconciliar um povo com um passado que lhe é negado? Como construir um futuro quando se insiste em apagar as marcas do passado? Numa discussão calorosa, os deputados do maioritário decidiram que apenas Agostinho Neto, também ele com muito sangue nas mãos, preenche os requisitos de líder da Independência de Angola. E ponto final, não se fala mais no assunto. Afinal, a festa da Independência pertence apenas ao MPLA.
E o Governo, numa demonstração de sabedoria sem precedentes, decidiu que a solução para alguns dos nossos males é proibir a importação de vários produtos de origem animal. A ideia, segundo os nossos sábios governantes, é impulsionar a produção nacional. Uma iniciativa louvável, sem dúvida. Mas não seria mais sensato fomentar primeiro, garantir com base em números que há de facto produção suficiente para depois ir-se desacelerando a importação? É como tentar fazer um bolo sem ter farinha. Ou, para usar uma metáfora mais adequada à situação, é como contar com o ovo no traseiro da galinha. É evidente que todos queremos consumir produtos nacionais. É um acto de patriotismo, de apoio à economia local e de promoção da nossa identidade. Mas o patriotismo não pode ser cego. Não podemos fingir que temos galinhas que botam ovos de ouro quando, na verdade, as nossas aves sequer têm acesso a ração de qualidade, à água potável e a cuidados veterinários adequados. O nosso gado é mais magro que os famintos da Somália. Os nossos produtores não têm os meios necessários para aumentar a produção. As nossas infra-estruturas não são capazes de escoar a produção para todo o país? Enfim… há ainda um enorme trabalho de casa a ser feito, mas o Governo prefere ir pelo caminho mais fácil. Será este de facto o caminho mais fácil?!
*Crónica do programa ‘Dias Andados’, referente ao dia 14 de Fevereiro de 2025
João Lourenço revela que já pensou no perfil do seu sucessor depois...