E agora pergunto eu...

07 Jul. 2021 Geralda Embaló Opinião
D.R

Na semana passada, perguntava aqui neste espaço, onde perguntar não ofende, “quantos angolanos iriam querer ficar no país, como está governado, se tivessem opção viável de imigrar com os seus para outro país qualquer”. Pouco depois o relatório de imigração e fronteiras de Portugal revelava que, em relação ao ano anterior, se viu um aumento de 7,7% do número de angolanos registados a residir em Portugal. Isto angolanos sem dupla nacionalidade ou ilegais, o que significa que o número real de angolanos a residir em Portugal é substancialmente maior e que a tendência é mesmo de ‘fugir’ de Angola. O que leva a perguntar novamente “e se o nível de satisfação com o Governo fosse medido pela vontade de sair do país. E que tipo de êxodo iríamos ver se as pessoas pudessem escolher ir embora com os seus para qualquer outro país?” Lembra um meme que andava online há uns tempos que dizia “preferível ser árvore nos EUA do que pessoa (pobre) em Angola”.

A propósito da qualidade da governação, o ministro de Estado e chefe da Casa Civil, na semana antepassada, fez um grande anúncio, o do novo projecto Simplifica que foi apresentado como solução para acabar com a burocracia e combater a corrupção nos serviços públicos.

“O nosso objectivo estratégico de diversificar a economia e incentivar o investimento privado nacional e estrageiro ficará seriamente comprometido se não formos capazes de melhorar a capacidade de prestar serviços públicos”, dizia Adão de Almeida. A meses de eleições, o Simplifica foi assinado pelo chefe de Estado e anunciado pelo ministro como a solução para “inverter a trajetória rumo à excelência” (palavras do ministro) a meses de eleições... Bom, numa coisa o ministro tem razão, para usar novamente as suas palavras: “quando a administração pública é ineficiente em relação aos serviços que presta, torna-se desacreditada e perde autoridade”. Tudo dito, excepto que a desacreditação é extensiva a toda a administração pública, incluindo aos ministros que vêm a meses de eleições, depois de mais de quatro anos de governo, apresentar as soluções para os problemas do país como se tivessem feito a descoberta da roda ou acordado agora para a necessidade de governar. E não é só este ministro que anuncia o despertar. Também na semana que passou, o ministro da Economia e Planeamento, depois da costumeira reunião do conselho de ministros, veio comunicar, com a pompa e circunstância da descoberta da pólvora, que “o Executivo já trabalha para melhorar a posição no Doing Business da posição 177 para a posição 160”. É até engraçado que o ministro diga isto - que Angola vai passar do lugar 177 para o 160 - porque se diz que é assim que são feitas as estatísticas oficiais nacionais...  o chefe chega e diz “não, esse número de desemprego está muito alto, fica mal, e tem de se ‘batular’”! Os ranking internacionais são feitos com informação completamente fora do controlo do Executivo angolano e sempre em comparação com outros países, cujos governos também trabalham certamente para melhorar os seus respectivos ambientes de negócios. O Doing Business é um ranking do Banco Mundial que analisa e compara o ambiente de negócios de 190 países, não é o INE. Mas enfim, os nossos chefes gostam de fazer esses anúncios para dar a imagem de que controlam este mundo e o outro. O PR disse tantas vezes que, com o combate à corrupção, viriam os investidores que agora perguntar “onde estão os tais investidores” já pode começar a ofender.

Com investidores ou sem eles, anime-se, querido leitor, porque depois de mais de quatro anos de governo João Lourenço e quase meia década de governo MPLA - boas notícas – “o Governo já trabalha para reformar e melhorar o ambiente de negócios". Palmas, vivas...Animemo-nos em vez de perguntar “o que estiveram a fazer até agora?”. Animemo-nos porque o Governo criou um Simplifica.

Ah e claro porque o Presidente já exonerou e já nomeou outra vítima para a cadeira da morte política, que é o Governo Provincial de Luanda, a quarta vítima em quatro anos de governação. Boa sorte à nova governadora, que precisa ela e precisam todos os habitantes da capital que apesar de não conseguir limpar o lixo ou aguentar uma boa chuva, vai ter metro de superfície.

Também na semana que passou o Conselho Económico e Social, que é um de muitos órgãos de consulta do titular do poder executivo, preparou para apresentar ao PR um conjunto de propostas concretas para atenuar o sofrimento da população. Entre essas propostas está a definição de uma política de subsídio de desemprego para quem tenha contribuições de mais de um ano, um abono para estudantes e benefícios fiscais para empresas que empreguem jovens sem experiência profissional e que tenham programas de estágio.

Não será surpresa se, com pompa e circunstância, o Executivo anunciar nos próximos dias um pacote de medidas sociais que visam atenuar a crise. Agora, porque ninguém se lembrou de que era preciso segurança social há mais tempo, como prioridade do programa de governo. Prioridades que, se o fossem, o Governo iria ter adoptado no início de mandato se quisesse chegar ao fim do mandato com outra obra feita que não fosse a destruição da imagem dos Dos Santos.

Mas o que se torna evidente é que os governados e as suas prioridades foram, e talvez continuem a ser, secundárias e terciárias para o Governo. Prioritário, prioritário era mesmo ‘receber as coisas da Isabel dos Santos, isso de segurança social - vê-se depois... Prioritário, prioritário são contratos de construção de grandes obras, de hospitais, de escolas, de tribunais, se temos médicos, professores e juízes e demais pessoal e capacidade para os pôr a funcionar, principalmente nas províncias - isso vê-se depois. Prioridade, prioridade, são contratos para equipar a CNE, compras de carros e construção de instalações - isso de subsídios para incentivar o emprego vê-se depois. Prioridade, prioridade são contratos de compra de aviões de guerra, isso de abonos para estudantes vê-se depois... E agora pergunto eu, ‘passados mais de quatro anos de governação de João Lourenço, com eleições previstas daqui a uns meses, é nesta altura que vamos ver a criação de políticas de segurança social, a desburocratização das instituições públicas? Nesta altura que vamos melhorar o ambiente de negócios para que venham os investidores que já ouvimos que agora vêm, desde o início do mandato?

Parece que o Executivo acordou agora para a necessidade de executar, é bonito isso, esse despertar... Anime-se, querido leitor, vale mais tarde do que nunca e, com esperança de que esse despertar tardio produza frutos, marcamos encontro para a próxima semana.

 

Geralda Embaló

Geralda Embaló

Directora-geral adjunta do Valor Económico