E agora pergunto eu...
A semana que passou foi mais uma de celebração da Dipanda e já se vai tornando hábito a actualidade ser marcada por manifestações um pouco por todo o país, sobretudo marcada pela repressão policial a essas manifestações, que leva invariavelmente a detenções arbitrárias, à violência policial e, no ano passado, até à morte. A vida do jovem Inocêncio de Matos foi tirada numa manifestação a que tinha direito consagrado, e tirada por autoridades encarregadas pela segurança do público como ele. E, um ano mais tarde, a impunidade sobre esse crime que mutilou certamente aquela família que poderia ser a de qualquer um de nós, é total, assim como é a impunidade sobre as mortes que aconteceram em Cafunfo e para as quais não se conhecem responsabilizações sérias num desrespeito exibicionista quanto a direitos humanos básicos. 46 anos de Independência e a nossa democracia continua a não ter esses direitos à expressão e à liberdade de manifestação, consagrados na prática fora do papel. Mas 46 anos de Independência traduzidos numa democracia infantil quanto a direitos humanos revelam-se de diferentes formas conexas. Revela-se na falta de qualidade de vida dos cidadãos, na falta de perspectivas socioeconómicas, na falta de resiliência do tecido empresarial nacional que o Governo inadvertidamente parece incentivar com as intrusões constantes no espaço que deveria ser do empreendedorismo privado. Olhando para os indicadores de desenvolvimento socioeconómico, é fácil encontrar áreas em que a infantilidade é manifesta. O acesso à energia e água, o acesso à educação e saúde de qualidade são alguns. A partidarização das instituições como a polícia como os tribunais... São infantilidades que levam a perguntar quantos anos mais serão necessários para que Angola alcance o potencial que anda há décadas a prometer por conta de tanto recurso natural que tem.
Talvez a pergunta “quantos anos mais serão precisos?” – seja indicada para colocar ao partido no poder nesses 46 anos e que continua assertivo a reciclar promessas e programas (aliás, o único tipo de reciclagem que parece corrente no país é a reciclagem de promessas e programas de governo). O partido que continua a afirmar que o MPLA é o povo e a única solução viável de governação para o país. Mas e agora pergunto eu, se o MPLA é a única solução de governação como diz ser, o que é que isso mostra sobre a democracia que temos 46 anos de subdesenvolvimento depois? E, mais concretamente, o que é que essa falta de alternativas dirá sobre os recursos públicos que são despejados em esforços pagos, em estratégias dispendiosas, para garantir que assim seja, que o partido no poder se mantenha sem oposição séria?
Quando ouvimos "a oposição é desorganizada" como argumento de manutenção do poder é possível deixar de sentir a falta de melhores argumentos assentes em décadas de governação efectiva?
Certamente a oposição tem quota-parte da responsabilidade desta infantilidade democrática. Quanto mais não seja pelo comodismo com o status quo que leva à anormalidadede um contexto em que um partido captura inteiramente um Estado quase meio século (apesar de se professar democrata), e de, não satisfeito, se posicionar para mais um século que há de vir. Esse comodismo da oposição é expresso também na facilidade com que o partido no poder consegue minar a união ou pelo menos a imagem de união entre a oposição e interferir na vida interna do partido alheio.
Vimos o episódio da ‘maça’ em que um pobre ex-militante da Unita teve espaço nobre na televisão pública para expor a sua preocupação com a aquisição do que dizia indignado ser “uma maça” pelo líder do seu partido, e na semana que passou, depois de o poder decidir quem deve ser o presidente do partido (o tal que espera que venha para ficar), as dúvidas sobre a unidade dentro do ‘galo negro’ voltaram a marcar a actualidade e a entristecer uma parte do eleitorado mais esperançosa na mensagem de alternância.
E entristeceram porque, mesmo que não seja totalmente verdadeira a dita desunião no seio do maior partido da oposição, o que é possível porque quem controla os fóruns públicos é o poder, certamente faltou força à oposição para dirimir essas dúvidas plantadas pelo poder.
Se é evidente que o partido no poder faz todos os malabarismos possíveis para tirar o foco de si mesmo, que pouco tem para oferecer que não seja promessas recicladas, faz tudo para que o foco da opinião pública esteja na desorganização real ou fabricada no seio da Unita, é evidente que um partido que quer ser alternativa tem de ter condições de esclarecer essas dúvidas atempada e cabalmente.
A responsabilidade é grande.
É que este eleitorado já tem dúvidas suficientes para gerir, quanto ao seu dia-a-dia, quanto à sua própria sobrevivência e futuro, e não merece ser obrigado a ter mais.
“A Sonangol competia só com as empresas estrangeiras. Agora está a competir...