O papel da perspicácia na solução das crises
O equivalente ao Nobel em Ciências Económicas, atribuído pelo Banco da Suécia, foi este ano para três personalidades da área financeira, dois professores e um ex presidente da Reserva Federal norte-americana, Ben Bernanke, em virtude de seus estudos sobre crises. Bernanke com experiência direta da crise do sub-prime e dos efeitos em 2010 da crise europeia. Ou seja, o prémio foi atribuído por razões práticas atuais com uma crise de parcelas difíceis de hierarquizar.
Na verdade, estudar Economia e propor orientações é o mesmo que estudar crises -sucedem-se a ritmo alucinante – e junto com elas a guerra económica é, desde há séculos, a outra situação corrente. Ambas na mesma proporção do progresso tecnológico.
A busca de sobrevivência material, as lutas decorrentes das desigualdades, o exercício do poder por incompetentes ou comprometidos com os desequilíbrios, as diversas fases do que é hoje o hegemonismo internacional, têm ditado essas regras, apesar de sucessivos esforços e acordos para harmonizar interesses.
A dificuldade é a Economia ser refém da política e as ideologias ou os endeusamentos de personalidades estão aí para desequilibrar e criar poderes de agressão, contra seus próprios cidadãos ou em escala global. Assim, não é possível aproximar dos termos de equilíbrio e as relações económicas correm em conflito, às vezes até só por terem resvalado. Mas resvalam com frequência.
Ninguém bom da cabeça e com um mínimo de conhecimento pode desconectar a crise em curso da pandemia de Covid 19. Foram dois anos vertiginosos, de enormes despesas públicas impostas pela urgência da vida, derrubando dogmas ditados por formulações discutíveis desde sempre. Ao mesmo tempo, os lockdowns criaram novas localizações de trabalho, falências, poupança forçada pela limitação de movimentos e, verificamos depois, baixa na produção de eletrônica indispensável – chips acima de tudo – desorganização da logística e, também depois da pandemia, alta na procura geral, facilitada em muitos países por disponibilidades decorrentes da anterior redução de gastos das famílias. Neste caso, o agro-alimentar foi mais pressionado, até porque falências nos transportes agravaram os preços.
Os projetos de recuperação deram lugar a criação de vagas de empregos, novos ou apenas recuperados, mas não conseguiram fugir à inflação. Ficamos na situação até aqui sui generis de inflação alta geral, carência de produtos de base para o funcionamento do sistema e, ao mesmo tempo, o mercado de trabalho ou fica como estava ou melhora, em certos casos melhora muito.
Sem intervalo, começou a guerra da Ucrânia. A opção militar russa é algo para estudar seriamente, exigindo mais tempo para ver atitudes e ligar antecedentes. Desde já, podemos significar que, se o Kremlin se sentia ameaçado pela influência da OTAN, tinha a arma do petróleo e do gás como suficiente para fazer recuar a União Europeia e, por extensão, os demais componentes daquela aliança. Parece evidente em função da conjuntura atual na Europa. Recorrer ao vetor militar, com elevadas despesas, dando motivo para sanções e correndo o risco das coisas não serem tão fáceis como previsto, é uma daquelas inutilidades causadoras de crise, interna e internacional. Acaba sempre mal e, entretanto, vai acabando para os milhares que morrem.
Deixando então de lado (aqui) quais serão os verdadeiros motivos dessa guerra, em termos económicos ela entra em todos os cenários de recuperação económica mundial com peso idêntico ao legado da pandemia e aos desequilíbrios mundiais seculares.
A linha de pesquisa premiada pelo Banco da Suécia tem muito trabalho pela frente. A perspicácia dos governos e de diversos eleitorados também.
*O autor escreve conforme
o acordo ortográfico
“A Sonangol competia só com as empresas estrangeiras. Agora está a competir...