A Sonangol deveria investir no BPC, ao invés de capitalizar a Oi

30 Jul. 2021 César Silveira Opinião
Mário Mujetes

O sacrifício a que têm sido submetidos os clientes do BPC voltou a ser real nos últimos meses e, pelo que tudo indica, deverá manter-se por largo tempo, já que o problema de fundo não se resume nas questões técnicas que, volta e meia, o banco usa para justificar os embaraços. Aliás, estas questões técnicas podem pura e simplesmente ser também consequência da falta de liquidez que, esta sim, é a principal razão para todos os males que os clientes do maior banco público vão enfrentando. É, na verdade, uma consequência da recapitalização do banco por via de títulos públicos. Porque nem sempre a instituição consegue vender os ‘papéis’ à mesma velocidade que necessita do dinheiro para atender aos clientes e, inclusive, às necessidades operacionais.

A pressão é maior no final de cada mês em virtude da demanda dos clientes em busca dos ‘míseros’, mas importantíssimos e necessários salários, uma vez que não existirão muitos na condição de Pedro Lussaty que, segundo se relatou, ficou anos e anos sem usar o salário.

Perante a realidade ‘nua e crua’ do maior banco público, inspira questionar a real intenção das autoridades ao recapitalizar a instituição com papéis. Pode argumentar-se, por exemplo, que se tenha tratado da decisão acertada, tendo em conta os dinheiros públicos já gastos para a recapitalização da instituição e que resultaram em nada. Mas, na verdade, não serve de argumento porque, se a decisão foi no sentido de recapitalizar o banco, esta recapitalização deveria ser feita em moldes que permitissem um funcionamento perto do normal da instituição. O que não aconteceu, criando embaraços ao ponto de colocar a instituição entre as mais gozadas nas redes sociais.

Seja qual tenha sido a intenção e a razão da decisão de recapitalizar com papéis, os clientes são as maiores vítimas desta decisão. A situação que vivem mostra que não foram tidos nem achados no momento da discussão sobre o modelo de recapitalização. E, definitivamente, o escolhido não foi o mais acertado. 

E não se pode dizer que foi por falta de disponibilidade financeira. Ao longo dos últimos anos foram feitas despesas, cujos valores bem poderiam ser canalizados para a recapitalização da instituição. São exemplo disso os 1.000 milhões de dólares que a Sonangol investiu para adquirir 25% da Unitel que pertenciam à brasileira Oi quando, falando apenas em linguagem de negócio, não precisava de reforçar a sua posição na operadora móvel.

A operadora brasileira precisava mais dos 1.000 milhões para capitalizar-se do que a Sonangol dos 25% para reforçar a sua posição na Unitel até porque já tinha colocado os outros 25% que detém na operadora entre os activos a privatizar. Portanto, os 1.000 milhões usados para capitalizar a empresa brasileira dariam um jeitão ao nosso BPC que, assim, provavelmente teria menos problemas técnicos a coincidirem com os pagamentos dos salários da função pública.

 

 

César Silveira

César Silveira

Editor Executivo do Valor Económico