África? A culpa é do colono
Mais um 25 de Maio, mais um Dia de África, mais um dia para a prática colectiva de algum exorcismo sobre a trajectória da nossa desgraça comum.
É a praxe estabelecida. Na identificação dos problemas e na consequente pretensa busca de soluções, uns optam por direccionar as baterias da culpa ao passado colonial que nos foi imposto e às amarras do presente, justificadas precisamente por esse passado. No fundo, para esse ponto de vista, não interessa quanto tempo passe e não importam as novas circunstâncias geradas no período pós-colonial. A culpa da desgraça africana até na dimensão que se conhece hoje será sempre, sobretudo, do colono. Outros preferem apostar contra o afropessimismo, atacando, entre outros, os cépticos e os críticos que apontam o dedo directamente à ganância e à incompetência das elites políticas como as razões de fundo da miséria colectiva. Por outras palavras, para esta perspectiva, o continente até tem rumo, independentemente de tudo. E os que não acreditam nisso não passam de uma turma de rancorosos e fanáticos. Finalmente, colocam-se os últimos que relativizam o passivo colonial, ignoram os optimistas e não são propriamente loucos pela crítica. E estes, os últimos, são os que, por via de regra, fazem as perguntas a que todos os outros não dão respostas, apesar de fáceis. Senão, vejamos.
É mesmo o colono o culpado da tentativa de golpe de estado desta segunda-feira no Mali, 60 anos após a sua independência? É mesmo o colono que ensinou a sucessão dinástica no Gabão, que insiste num presidente a cair aos pedaços ao ponto de se deslocar a Paris apoiado em muletas? É mesmo o colono que obrigou Denis Sassou Nguesso a mudar a Constituição congolesa para se permitir a um terceiro mandato, eternizando-se no poder, quando já conta 77 anos? É o colono que mantém Paul Biya, aos 88 anos, à frente dos Camarões, oferecendo-se uma infinidade de mandatos e sem perspectivas de saída à vista? Ou é o colono que obrigou Teodoro Obiang Nguema a fazer da Guiné Equatorial a extensão da sua casa, há mais de 40 anos? É o colono que instruiu o velho Museveni a encarcerar a nova estrela da política ugandesa, por reclamar vitória na última eleição? São os colonos que disseram a Paul Kagame para se fazer de Xi Jinping africano? É o colono que mantém a República Centro Africana controlada pelos senhores da guerra? É o colono que convenceu a Frelimo que a sua elite é uma turma de iluminados e que, por isso, são os únicos que podem governar Moçambique? São os colonos que disseram a José Eduardo dos Santos para ficar 38 anos a comandar Angola? São os colonos que convenceram o MPLA de que são os escolhidos de Deus e únicos permitidos a governar Angola? São os colonos que têm orientado o regime controlado por João Lourenço a inviabilizar projectos políticos indesejados, como o Pra-JA de Abel Chivukuvuku? São os colonos que têm inviabilizado a despartidarização dos Tribunais e da CNE? É o colono que ensinou a Presidência da República a criar majores multimilionários, que andam com milhões frescos em casa com selos do BNA? É tudo isso que leva os autoproclamados optimistas a defender que o continente tem rumo? Ou esses optimistas também aprenderam esse optimismo com o colono? Pois, claro, a culpa é mesmo colono.
“A Sonangol competia só com as empresas estrangeiras. Agora está a competir...