V E

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A agenda do próximo Congresso Extraordinário do MPLA, previsto para Dezembro, é um tema que João Loureço tenta fechar a sete-chaves. Até figuras emblemáticas da direcção do MPLA juram de pés juntos que não têm o mínimo domínio do que está por vir. Garantem, embaraçados, que sabem tanto quanto se comenta no espaço público. E o que se diz, até ao momento, é que João Lourenço pretende alterar os estatutos para voltar à forma de José Eduardo dos Santos. O que significa expurgar o nº. 1 do artigo 120 que impõe o presidente do partido como o cabeça de lista das eleições gerais. Ou seja, João Lourenço quererá regressar ao formato da potencial bicefalia. Qual é a ideia? Manter-se no comando dos ‘camaradas’, caso todos os planos para o terceiro mandato falhem e se veja obrigado a aceitar outro candidato do MPLA à chefia do Estado.  

Adalberto Costa Júnior e Isaías Samakuva deixaram-se fotografar sorridentes e com um aperto de mão, na reunião do Comité Permanente da Comissão Política da Unita, esta terça-feira. A mensagem que se precipita do gesto parece óbvia. Aparentemente, os dois terão optado pela conciliação, após os eventos que destaparam o grave distanciamento entre ambos na última semana. Foi por iniciativa própria de cada um? Não é de todo improvável? Terão sido aconselhados para essa aproximação? É possível. O gesto encerra uma verdadeira reconciliação? Não é de todo credível. Porquê? Porque os sinais que denunciam o afastamento de Samakuva, face a Adalberto Costa Júnior, são excessivamente profundos para serem resolvidos com um simples aperto de mão. Basta revisitarmos os factos mais densos que se tornaram públicos em apenas uma semana.  

Depois de ter sido escolhido por José Eduardo dos Santos como o candidato do MPLA às eleições de 2017, João Lourenço entreteve-se por largos meses a passar a imagem de que percebia alguma coisa do que significava gerir país. Num certo dia, alguém lhe perguntou como gostaria de ser lembrado, após a sua passagem pela Presidência da República. A sua resposta não poderia ter sido mais emblemática e visionária. Mais coisa, menos coisa, com o timbre de quem sabia do que falava, Lourenço afirmou que gostaria de ser lembrado como o “homem do milagre económico”. Disse-o outras vezes de forma diferente. Em entrevista à espanhola EFE, aquando da sua passagem por Espanha, ainda na qualidade de candidato, trocou avisadamente Gorbachev por Xiaoping. Queria ser o homem que abriria a economia angolana ao mundo, como fez Xiaoping com a China, e não o sujeito que tentou reformas falhadas que acabaram por manter o Estado refém de uma poderosa oligarquia, como aconteceu com o russo Gorbachev.

O secretariado do Bureau Político do MPLA abriu a porta à agitação que agora anda a todo o vapor. A cúpula mais restrita do partido no poder orientou o seu Comité Central a convocar um Congresso Extraordinário para Dezembro próximo. O problema ou, pelo menos, o factor de inquietação está no pretexto invocado para a realização da reunião extraordinária. Quase ninguém acredita na balela de que a análise dos 50 anos de governação do MPLA, que coincidem com os 50 anos de Independência do país, é justificação bastante para preencher os critérios impostos pelos estatutos do MPLA. 

Já houve quem afirmasse que o aparente apego compulsivo do Presidente da República aos aviões resulta de uma possível ambição de materializar uma fantasia de infância. Literalmente quis-se com isso dizer que João Lourenço sempre desejou conhecer o mundo e usa o cargo de Presidente, no limite das suas forças, para concretizar o seu sonho de garoto com o máximo de conforto possível. Os angolanos são efectivamente muito bons, quando se trata de usar a criatividade para ridicularizar factos e fenómenos aparentemente complexos. É deste recurso criativo que resultou também o efémero e popularizado ‘meme’, segundo o qual “pessoa com talento para ser aeromoço lhe deram um país para governar”.