“Angola a avançar”… no desemprego
Além de ser uma tragédia para os próprios desempregados (ainda por cima num país sem subsídio de desemprego), o desemprego é uma tragédia para a economia. Desempregado não ganha, consome pouco, pouco contribui para a economia.
Uma verdadeira tragédia. No mínimo é o que podemos dizer do desemprego em Angola.
De acordo com Inquérito ao Emprego em Angola referente ao terceiro trimestre de 2021 divulgado na semana passada pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), a taxa de desemprego fixou-se nos 34,1% da população economicamente activa, isto é, da população com mais de 15 anos disponível para trabalhar, o nível mais alto desde que há registos. São cerca de quatro vezes mais do que o mínimo de 9,4% registado em 2010.
Se compararmos com o trimestre anterior, o segundo de 2021, a taxa de desemprego aumentou 2,5 pontos percentuais (pp), o maior aumento trimestral desde que há registos. Em termos anuais comparando com o terceiro trimestre de 2020, o aumento foi de apenas 0,1 pp.
O desemprego afecta mais as mulheres do que os homens: 36,3% das mulheres com mais de 35 anos disponíveis para trabalhar estão desempregadas, uma taxa 4,5 pp superior à de 31,8% entre os homens.
Por área de residência, os mais fustigados são os citadinos com uma taxa de desemprego de 43,4% mais do dobro do que os 21,2% registados no campo.
Por idades, a tragédia atinge especialmente os jovens entre os 15 e os 24 anos, faixa etária que apresenta uma taxa de desemprego de 59,2%. Sim! Quase seis jovens em cada 10 entre os 15 e os 24 anos não têm emprego.
Por trás das percentagens estão pessoas.
No terceiro trimestre de 2021, o número de desempregados voltou a furar a barreira dos cinco milhões fixando-se em 5 517 016 indivíduos, um aumento de 556 854 em cadeia, face ao trimestre anterior, e de 308 371 em termos homólogos, comparando com o mesmo trimestre de 2020.
Provavelmente a tragédia do desemprego ainda é maior.
De acordo com as regras internacionais adoptadas pelo INE, para um indivíduo ser considerado empregado basta que, na última semana do inquérito, tenha efectuado um trabalho de pelo menos uma hora, mediante o pagamento de uma remuneração ou com vista a um benefício ou ganho familiar em dinheiro ou em géneros. Ou seja, muitos desempregados de facto são empregados estatisticamente.
Já para ser considerado desempregado, é necessário que tenha procurado activamente um trabalho remunerado ou não nas três semanas anteriores. Isto faz com que muitos angolanos em idade activa, isto é, com mais de 15 anos, sejam considerados pelo INE como inactivos, isto é, não disponíveis para trabalhar. Ou seja, não são empregados nem desempregados e por isso não contam para as estatísticas.
Se os desempregados são cada vez mais, a qualidade do emprego não pára de descer.
Segundo o INE, no terceiro trimestre de 2021, havia 10 648 511 empregos em Angola, dos quais 8 639 165 informais. Sim! Em cada 100 empregos, 81 são informais, isto é, sem direitos.
O INE considera informal a pessoa com 15 ou mais anos de idade empregada no sector privado, em cooperativas, associações, igrejas, organizações não governamentais (ONG), ou por conta própria, numa das seguintes situações: (1) Trabalha sem um contrato escrito; (2) Trabalha em qualquer unidade de produção de bens ou serviços, não registada junto dos órgãos públicos; (3) Não beneficia de qualquer apoio social (férias anuais pagas, seguro de saúde, (4) Não está inscrito na segurança social. Em duas palavras os informais são trabalhadores sem direitos e não param de subir.
Comparando com o segundo trimestre de 2021, os empregos informais aumentaram em 95 546. Já em termos anuais o aumento foi de 592 947.
Os empregos formais, com direitos, fizeram o caminho inverso e são cada vez menos. No terceiro trimestre de 2021 não ultrapassavam os dois milhões, precisamente 2 009 346, menos 162 269 do que no segundo trimestre e menos 57 335 do que um ano antes.
No início do texto, classifiquei o desemprego como uma verdadeira tragédia. Em rigor, devia ter escrito dupla tragédia.
Em primeiro lugar, o desemprego é uma tragédia para os desempregados que, antes de mais, são pessoas. Em Angola, a tragédia é maior devido à inexistência de uma rede pública de protecção social digna desse nome. Por exemplo, em caso de despedimento, os trabalhadores angolanos ficam entregues a si próprios, pois não há subsídio de desemprego.
Além de ser uma tragédia para os próprios desempregados, o desemprego é uma tragédia para a economia. Desempregado não ganha, consome pouco, pouco contribui para a economia.
A dupla tragédia deixou o Governo com um duplo problema para o qual criou um plano e um programa. O Plano de Acção para a Promoção do Emprego (Pape) e o Programa de Reconversão da Economia Informal (Prei).
Se bem entendi, o Pape aposta fundamentalmente no auto-emprego através da distribuição de ‘kits’ para várias profissões, prática antiga do Governo adoptada, sobretudo, em períodos eleitorais. Ou seja, o Governo troca ‘kits’ por votos.
Mais do que combater a informalidade com o Prei, o Governo pretende captar novos contribuintes: Facilita-lhes o bilhete de identidade e, em troca, cobra-lhes impostos.
O duplo combate – desemprego e informalidade – só precisa de uma coisa: crescimento económico, que é coisa que não temos, vai para seis anos. Nem devemos ter nos próximos tempos. Calculo que, para baixar o desemprego, precisamos de crescer a taxas acima de 4%, o que o FMI não prevê que aconteça até 2026
Para a economia crescer, precisamos de investimento. Para termos investimento, precisamos de um bom ambiente de negócios. Os passos tímidos do passado nesta matéria poderão ser rapidamente revertidos por um Governo cujo único objectivo parece ser manter-se no poder a qualquer preço, a começar por uma gigantesca máquina de propaganda que está a construir uma realidade virtual, incluindo económica.
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