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Como privatizar a Sonangol

08 Dec. 2020 Opinião
Como privatizar a Sonangol

Pergunta – No dia 9 do corrente, o engenheiro António Vieira publicou um artigo através do qual fazia uma estimativa do valor da Sonangol. Nesse artigo, dizia que a privatização da Sonangol poderia injectar na economia na sua totalidade entre 117 e 145 mil milhões de dólares norte-americanos.

Resposta – É verdade que eu acredito que, pelas suas reservas, a Sonangol deverá trazer aos cofres do Estado um substancial montante de dólares. Ainda esta semana, a ministra das Finanças fez referência pública à privatização da petrolífera nacional algures entre 2021 e 2022. Portanto, vai sendo altura de as entidades governamentais fazerem uma avaliação dos recursos da empresa a fim de definirem o valor real da Sonangol.

Pergunta – Entretanto avançou que a Sonangol valia entre 117 e 145 milhões. Como chegou a este número?

Resposta – Trata-se de um cálculo básico feito em função das reservas de óleo e gás que a companhia tem no seu portfólio. Por conveniência de simplicidade, optei por olhar só para as reservas de óleo e gás. Na minha estimativa, propositadamente ignorei o valor de todos os outros ‘assets’ da companhia. Evidentemente que toda a gente irá apontar diferenças relativamente ao valor de venda do barril no reservatório usado no meu cálculo. Porém, convém aqui salientar que é obrigação dos agentes do Estado negociarem o melhor possível para o país. Se, como exemplo, fizerem um negócio igual ao que fizeram com o Bloco 21, onde compraram 25% da participação no bloco por cerca de três mil milhões para de seguida venderem 80% dessa mesma participação por cerca de meio milhão, então é melhor ficar parado. A Assembleia Nacional é cúmplice nesse negócio, uma vez que a entrada de um novo parceiro no bloco necessita de validação da Assembleia.

Pergunta – Portanto, o negócio da venda a TOTAL das participações no Blocos 20 e 21 foi um mau negócio?

Resposta – Para a TOTAL, foi um grande negócio. Se calhar o melhor negócio feito por eles em Angola: compraram dois blocos com sete descobertas comerciais contendo pelo menos três mil milhões de barris por pouco mais de 750 milhões de dólares. Por outras palavras, pagaram mais ou menos vinte e cinco cêntimos por barril dum petróleo que, colocado hoje no mercado, valeria 42 dólares. Para Angola, foi um péssimo negócio. A esse negócio eu chamo de traição à pátria.

Pergunta – Voltando à privatização da Sonangol, é necessário que se faça um bom negócio. Como o faria?

Resposta – Podemos partir a procura duma multinacional para ficar com a companhia. Porém, neste momento, quem estaria interessado a pagar o preço justo da companhia? Angola está mal de reputação e tem dificuldade em atrair investidores ocidentais de qualidade. Para além disso, irmos de encontro aos apetites sanguinolentos do capitalismo, quem mostrar interesse querer ficar com a companhia por ‘peanuts’. E não é isso o que nos interessa.

Assim sendo, eu sou de opinião que a empresa deve ser colocada numa bolsa de valores. E, se vamos ter que gemer com a dificuldade de vender pelo preço certo, então entraríamos num negócio muito mais alargado. É altura de darmos corpo à Bodiva.

Pergunta – Porém, a BODIVA não transacciona acções de empresas…

Resposta – A Bodiva encontra-se na sua fase inicial e de estabelecimento. A nossa bolsa ainda está a procura de uma direcção e do caminho a seguir. Daí eu ver vantagens em listar a Sonangol na Bodiva e ser colocada à disposição do mundo investidor.

Pergunta – Como é que isso funcionaria, se os angolanos não têm dinheiro?

Resposta – Os angolanos não têm dinheiro, mas há alguns angolanos e instituições com dinheiro e que, certamente, precisam de onde investir os seus recursos até para a sua sobrevivência. Para além disso, a Bodiva poder-se-á fazer listar numa outra bolsa de valores e, com uma equipa de correctores internacionais, acredito que é não só possível, mas possível.

A alternativa é listar a companhia directamente num mercado no exterior do país. Acredito que haja apetite para uma companhia com as reservas da Sonangol em Singapura, Hong Kong, Tóquio e Londres.

Pergunta – Colocando a empresa numa bolsa de valores, o Governo angolano perde o controlo da empresa e, se calhar, isso não é conveniente para o país…

Resposta – De que vale o controlo duma empresa que pouco mais faz do que alimentar a corrupção no país? Será possível acabar com a corrupção na Sonangol? A venda das participações dos Blocos 20 e 21 não será mais uma página triste deste historial de corrupção?

A Sonangol, deixando de ser uma empresa estatal, vai ter que ser gerida para dar lucros aos accionistas. Ponto final. Para tal, os accionistas imporão uma gestão firme, objectiva e muito mais honesta. Com uma empresa a dar lucros, toda a gente ganha. E Angola ganharia os impostos sobre a produção, bem como sobre os lucros duma empresa a operar no positivo.

Nesse processo de privatização, o Governo poderá reter uma parcela significativa da empresa, sem, no entanto, gerir a empresa. Poderá ainda alocar a presença de interesses nacionais tais como companhias de seguros, fundos de pensões e quaisquer cidadãos nacionais interessados em adquirir acções da sua companhia. A Sonangol continuará a ser uma empresa angolana, só que o seu dono já não será o Governo angolano.

Só assim, iremos corrigir o que está mal e melhorar o que está bem. E quem ganhará é o povo. O futuro promete.

António  Vieira

António Vieira

Ex-director da Cobalt Angola