GORDURAS DO ESTADO
Quando a crise do subprime de 2008 atravessou as fronteiras dos Estados Unidos e da Europa e chegou a Angola um ano depois, o tema da reforma do Estado monopolizou as arenas do debate público. A sociedade informada voltou-se contra o Estado e exigiu do Governo medidas práticas que combatessem o despesismo público. O Governo respondeu, timidamente, com referências genéricas de que compreendia a urgência de cortes nos gastos supérfluos. Lançada a promessa oficial, ainda que em soltos discursos de circunstância, gerou-se a expectativa colectiva, mas, mal o petróleo regressou à casa dos 100 dólares por barril em 2011, o prometido deixou de ser devido. Não só o Governo ignorou os alertas para a necessidade da diminuição da estrutura do Estado, como descomprometeu-se com o despesismo, amparando uma gestão descontrolada dos recursos, como, por exemplo, não deixam de mentir os resultados que o sector empresarial público vem reportando nos últimos anos.
O regabofe teria, entretanto, de acabar da pior maneira. O país voltou a mergulhar numa crise sem precedentes, quebrando, de forma violenta, a entrada de receitas ordinárias, desde meados de 2014. O tema ‘esquecido’ voltaria a ser chamado, mas, desta vez, perante circunstâncias mais agravadas. O Governo reage, como sempre, com promessas de reformas, mas a evolução para a dimensão prática continua uma miragem. O Estado mantém-se pesado em toda a sua dimensão. Apesar de todos os apertos que afligem a economia desde há mais de dois anos, não há convicção para reformas de fundo. O esforço para a contenção do Orçamento não vai além de cortes nas despesas de capital. O que é sempre uma má notícia, porque, mesmo se tratando de uma medida contextual, a redução da despesa de investimento acarreta sempre consequências estruturais, especialmente para países subdesenvolvidos, tal é o caso de Angola. Na despesa má – nos custos correntes supérfluos - não se mexe, pelo menos em termos estruturais. Falta vontade e coragem políticas, mas também porque o poder encontrou, na dilatação do Estado, um mecanismo de contenção de conflitos ‘intramuros’, por via da acomodação da elite que o serve. Só assim se explica, por exemplo, a manutenção de ministérios justificados por eventos concretos de outros contextos, como é o caso do Ministério dos Antigos Combatentes e Veteranos da Pátria. A este propósito, a avaliação do economista Victor Hugo até é mais extensa, elencando, de forma clara, os departamentos ministeriais que até para a percepção comum deveriam ser fundidos ou simplesmente extintos. O Observatório do VALOR, desta semana, explora, entretanto, uma dimensão ainda mais abaixo dos ministérios e mostra o peso relativo dos institutos públicos, dependentes e autónomos, nas contas do Estado. Exemplifica com casos de sobreposições funcionais ou de institutos que actuam em áreas de grande proximidade conceptual e que, só por isso, justificam, à semelhança do que se exige acima, fusões entre uns e a extinção de outros tantos. Enquanto houver resistência em manter-se as gorduras do Estado intactas, nas condições em que se apresentam, qualquer conversa sobre reforma estruturais será ‘para inglês ver’.
“A Sonangol competia só com as empresas estrangeiras. Agora está a competir...