(In)segurança alimentar
As preocupações com a segurança alimentar ganharam importância diferenciada nos últimos seis anos em Angola. O ponto marcante foi a publicação de um Decreto Presidencial que, a partir de 2011, passou a tornar obrigatórias as análises laboratoriais dos produtores alimentares, à entrada do país. O argumento central na alteração legislativa era compreensível. Com o país absolutamente dependente das importações na altura (e em grande medida ainda hoje), fazia sentido o reforço da certificação de que o que entrava era bom para o consumo. Antes de 2011, essas garantias eram significativamente reduzidas na medida em que só se podia confiar na boa-fé dos importadores, dos respectivos fornecedores e na ilusão de que, ao longo do transporte, os produtos não eram afectados com qualquer tipo de contaminantes. Isto, claro, falando dos produtos importados.
Fazendo fé nas declarações que reportamos dos diferentes laboratórios de análises dos produtos alimentares, essa alteração legal produziu sérios efeitos. Há consenso entre os vários operadores de que a situação hoje está mais controlada do que esteve ontem. E esses resultados só foram possíveis porque, além da alteração do quadro legal, houve investimentos de entidades públicas e privadas, que se interpretam comprometidos com a protecção da saúde pública.
Mas, dito isto, do outro lado da moeda, colocam-se inúmeras insuficiências por ultrapassar, já que, na prática, comprometem os avanços verificados, por exemplo, na área dos laboratórios. Como lembram oportunamente os especialistas, a segurança alimentar não se esgota na testificação laboratorial da qualidade dos produtos importados ou dos produzidos localmente. Todas as fases subsequentes até à chegada dos alimentos ao prato do consumidor requerem os mesmos ‘cuidados intensivos’ que, como se sabe, não existem. Até ao momento, o Estado não investiu o mínimo aceitável na fiscalização dos produtos quando já se encontram nas prateleiras das lojas e dos supermercados. O Instituto Nacional de Defesa do Consumidor (INADEC), por exemplo, apesar de toda a exposição mediática, está muito longe de cumprir o mínimo que se lhe exige. A incapacidade operacional do INADEC é, aliás, reiteradas vezes assumida de forma oficial, razão por que sempre houve quem sugerisse a sua extinção, além de outras justificações de natureza técnica, como o facto de o instituto erradamente estar sob dependência directa do Governo.
A colocação de Angola na cauda da segurança alimentar tem, portanto, ponto em que se pegue, apesar da contestação dos laboratórios que assinalam melhorias nos últimos anos. Enquanto houver lacunas graves em factores-chave do processo de segurança alimentar, dificilmente se poderá contrariar, com convicção, a perspectiva do Mundo sobre a qualidade do que se consome em Angola. E, mais importante ainda, dificilmente poderá assegura-se o conforto aos angolanos de que podem estar descansados com o que consomem. Porque, ainda que se certifique, à partida, que não entra arroz e plástico, não há como afiançar que, ao chegar à prateleira da cantina ou ao prato do consumidor, o peixe não apanhou uma boa dose de coliformes fecais.
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