Pela justiça
A Procuradoria-Geral da República (PGR) deixou uma mensagem poderosa contra a espectacularização e a instrumentalização da justiça. O pedido de absolvição de Norberto Garcia e de outros réus, no caso conhecido como ‘burla à tailandesa’, é triplamente simbólico quanto ao ideal do funcionamento da justiça. Em primeiro lugar, significa que quem é inocente deve ser absolvido e respeitado como tal, independentemente dos julgamentos antecipados em praça pública. Em segundo lugar, significa que a PGR, os tribunais e os demais órgãos que intervêm na materialização da justiça devem sempre ceder a quaisquer oportunidades para corrigirem os seus próprios erros, ainda que lhes custe o orgulho e a crítica da opinião pública. Finalmente, que a justiça deve mostrar na prática o descolamento necessário da agenda política, sob pena da sua descredibilização permanente.
Tudo isso pode ser dito de outra forma. Não se pode alcançar a decisão do Ministério Público, sem o seu devido enquadramento na actual conjuntura política. O discurso e a prática de combate à impunidade e à corrupção não estimularam apenas o ímpeto da controversa vingança popular. Colocaram, por arrasto, uma pressão sobredimensionada na justiça, que potencia a cedência ao juízo público, ao achincalhamento mediático e à chantagem política. No fundo, por muito paradoxal que pareça, o novo contexto político criou condições para forçar alinhamentos da justiça, susceptíveis de produzirem erros processuais grotescos, por razões de serviço. O recente acordo a que o Estado teve de chegar com o empresário Jean Claude Bastos de Morais é disso exemplo. Os esclarecimentos posteriores da PGR não deixaram dúvidas. O processo tinha sido mal construído à nascença. Aliás, só terá havido processo, porque a investigação não investigou o suficiente para descartá-lo logo à partida. No caso de Norberto Garcia, ao que tudo indica, a PGR chega à mesma conclusão. No que coube ao ex-director da extinta Utip, se a questão de fundo tivesse sido verdadeiramente escrutinada, Norberto Garcia jamais responderia na condição de réu.
Mas, como ‘mais vale tarde do que nunca’, ainda bem que se foi a tempo de se corrigir o ‘tiro’. Só uma verdadeira justiça pode garantir que ninguém efectivamente seja punido só pelo facto de ostentar um nome apetecível ao delírio popular.
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