Queda nas importações sem consequências na produção interna

10 Mar. 2016 José Zangui País

DIVERSIFICAÇÃO. Governo projecta redução das importações, mas estudos colocam reticências e apontam “erros sucessivos”.

A redução significativa das importações, verificada nos últimos dois anos, por efeito da crise de divisas, não teve ainda consequências directas no aumento da produção interna, especialmente entre os produtos de primeira necessidade.

Cálculos conjuntos dos Ministério da Agricultura e das Finanças estimam que o défice de produção de parte significativa dos produtos, incluindo os da cesta básica, está fixado entre os 50 e 70%, números ainda muito acima das expectativas do Governo de redução da dependência externa. Com a necessidade de aceleração da diversificação económica, o Governo traçou metas para a produção autossuficiente de vários produtos, como os cereais, hoje calculada em 1 milhão de toneladas por ano, prevendo que a partir de 2017 este número aumente para 2,5 milhões de toneladas.

A produção de ovos é outro dos casos, em que a meta passa pela duplicação dos números actuais para os 70 milhões de unidades por ano, quantidade considerada necessária para a satisfação do consumo interno. Em relação ao frango, a ambição é responder a procura interna em 60% e diminuir a importação do leite a 15%.

Os dados oficiais indicam, no entanto, exemplos em que a produção nacional já satisfaz a procura interna. Casos como o da banana, com cifras que atingem 1,5 milhões de toneladas por ano e que provocaram a redução drástica das importações desde 2013. O Ministério da Agricultura adianta existirem já ensaios no sentido da exportação da banana para países vizinhos e que a compra deste produto no exterior passou para “quantidades residuais”, justificadas apenas pela necessidade da abertura do mercado à concorrência. O mesmo passa-se com o sector das bebidas, que junta sumos, refrigerantes águas e cervejas, com a produção local, fixada em mais de quatro mil milhões de hectolitros, a resolver 70% das necessidades internas, deixando a diferença para a entrada de outras marcas.

No caso do cimento, a capacidade instalada do conjunto das cinco cimenteiras supera os oito milhões de toneladas por ano, quando o consumo não vai além dos 6,5 milhões de toneladas. Algumas análises apontam no entanto dúvidas sérias quanto à capacidade do Governo de concretizar algumas metas relativas à produção interna não apenas pela guerra que destruiu a capacidade produtiva e a crise económica que afecta a capacidade de investimento público, mas sobretudo pelos consecutivos “erros de política agrícola ao longo de vários anos, com destaque para a falta de investimentos”, como indica o Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC) da Universidade Católica de Angola, no seu relatório económico 2015.

A CONTROVÉRSIA DO CAFÉ

Os baixos níveis de produção do café têm gerado controvérsias diversas entre vários observadores locais, tendo como pano de fundo o “enorme potencial”, que, nos anos 1970, colocaram o país entre os quatro primeiros produtores mundiais. Das 220 mil toneladas por ano há mais de quatro décadas, a produção do café está reduzida a 12 mil toneladas, segundo dados oficiais. Para alguns observadores, há razões objectivas. Guilherme Santos, da ONG Acção para o Desenvolvimento Rural e Ambiente (ADRA), defende, por exemplo, que o principal problema está na perda da competitividade, face aos altos custos de investimento na agrotécnica e os baixos preços no mercado internacional.

“O que aconteceu em termos históricos”, explica o dirigente associativo, “é que, no passado, os colonizadores detinham grandes fazendas com recurso à mão de obra barata, hoje todo o agricultor tem de pagar os seus trabalhadores”, compara. O director da Agricultura de Cabinda, João Tati Luamba, acrescenta o fraco financiamento dos bancos e a falta de mercado interno, como dois dos factores que também contribuem para as baixas estatísticas na produção do ‘bago vermelho’.

MEMORIZE

O Governo estabeleceu a meta de 2017 para alcançar uma produção anual de 2,5 milhões de toneladas de cereais, contra os cerca de 1 milhão de toneladas actuais. Em relação ao frango, pretende resolver a procura interna em 60%.