Resgatar sim, mas como?
Justificada com a necessidade de reposição da autoridade do Estado, a ‘Operação resgate’, liderada pelo Ministério do Interior, foi lançada na semana passada e tem início previsto para amanhã.
Desde logo, é consensual a necessidade de se corrigirem algumas práticas que, sendo anormais, ganharam ao longo do tempo o estatuto de normais por uma série de factores, entre os quais a própria falta de autoridade do Estado.
Dito isto, também é verdade que se levantam agora interrogações sobre a oportunidade de uma operação que, embora as autoridades neguem, tem tudo para criar mais dificuldades a muitas famílias. Sobretudo àquelas que têm como principal fonte de rendimento as actividades a serem perseguidas.
Isto significa que seria imperioso, por exemplo, a criação de soluções práticas para acolher os vendedores de rua, antes de serem combatidos. Ao não pocionar-se destaforma, o Governo arrisca-se a ser acusado de não saber o que quer e, mais grave, de pretender até asfixiar os mais desfavorecidos.
Basta lembrar que a luta contra a fome é um dos deveres fundamentais do Estado e que muitas das actividades a serem eliminadas são efectivamente os únicos meios de subsistência de muitas famílias. Há, aliás, um facto incontestável que não deveria ser descurado pelas autoridades neste frenesim de concertação do ‘caos’. O estado de degradação social a que se chegou no país não resulta senão do falhanço do próprio Estado. As chamadas irregularidades a serem combatidas não estariam a ser classificadas como tal, se o Estado, em dado momento da sua actuação, tivesse criado as condições sociais, ecoconómicas, administrativas e legais que se impunham para que a situação não chegasse ao ponto a que chegou.
Caso assim fosse, talvez hoje fosse desnecessário estar-se a combater, de forma coerciva, os casos como os de ocupação de espaços públicos para a construção de residências, casebres, lanchonetes, instalação de mercados informais e a ocupação de reservas fundiárias.
Para já, continuará a haver uma certa expectativa sobre qual deverá ser o cenário das cidades do país, após o encerramento da presente campanha.
Havendo já a certeza de que, no final, muitas serão as famílias que estarão a fazer contas à vida por culpa da ‘Operação resgate’, é também quase certo que muitos dos visados nessa campanha ressurjam em cena pelo simples facto de a necessidade falar mais alto do que a autoridade.
Daí o apelo para que este combate seja visto também do ponto de vista da legalidade administrativa dos actos, ao contrário da actual aposta que privilegia os métodos coercivos.
JLo do lado errado da história