SOBRE AS RIQUEZAS
A acumulação de riqueza aumentou nos últimos dez anos em Angola, sem qualquer paralelo. Calcula a consultora britânica Knight Frank que, entre 2005 e 2015, o número de angolanos, com pelo menos um milhão de dólares, cresceu 318%, saindo de 1.600 para 6.400 pessoas.
A fiabilidade dos números, desde já, não é necessariamente relevante. Para todos os efeitos, a consultora faz análises especializadas, o que significa que tem informação diferenciada. Dedica-se à investigação da acumulação e distribuição dos grandes rendimentos pelo mundo, pelo que só é possível confrontá-la com argumentos que se sustentem também em estudos especializados.
Por isso, partamos para o que mais interessa. Desde já, trata-se de uma boa notícia. Pelo simples facto de ser óptimo que haja também angolanos ricos e muito ricos. Em teoria, hoje as economias só se tornam verdadeiramente consolidadas, se alicerçadas também em segmentos da sociedade capazes de criar riqueza. O momento que vivemos hoje será o mais clarificador. Quando o país se abeirou da falência, um dos gritos de socorro mais audíveis foi claramente dirigido aos detentores de grandes recursos para que investissem mais, em auxílio do Estado. E, apesar do contexto de dificuldades, o que se percebe em termos práticos é exactamente isso. Há casos indesmentíveis de investidores angolanos que não desistem. E outros tantos que decidiram, justamente nesta fase, anunciar a implementação de vários projectos, quando, em sentido contrário, se verifica um resfriamento mais agressivo do capital estrangeiro. Não é apenas o legítimo sentido de oportunidade que estará aqui em jogo. Há também laivos de patriotismo que devem ser reconhecidos. Só isso é suficiente para se reafirmar o quão é importante para o país que tenhamos angolanos ricos.
Mas, dito isto, há o outro lado da moeda que não pode ser ignorado. Com os vícios crónicos de corrupção e dilapidação do erário, através de múltiplos esquemas, torna-se quase impossível distinguir os que se tornaram verdadeiramente ricos por esforço próprio. É esta dificuldade que potencia, na verdade, os sentimentos de contestação e abominação contra esse crescimento galopante de ricos. Com o agravante, apesar de compreensível, de esta subida meteórica das fortunas ter-se registado justamente no período em que o país mais prosperou. Por outras palavras, se é lógico que o crescimento económico que Angola registou, depois de 2002, propiciou negócios que, em condições normais, levariam à ‘fabricação’ de muitos ricos, não é menos verdade que foi precisamente essa situação que favoreceu, na maioria dos casos, a acumulação de riqueza de forma criminosa. A descomplexização das fortunas angolanas encalha neste ponto. Uma solução realista seria a instauração prática e definitiva da tolerância zero, da probidade pública. No fundo, da cultura da responsabilização que, até provas em contrário, continua ausente. O partido no poder voltou a assumir o compromisso no último Congresso. Mais uma vez, é uma questão de ver para crer.
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