Trabalho Temporário – Um prenúncio do agravamento da precariedade laboral em Angola

24 Nov. 2021 Opinião

As crises socioeconómicas que têm sido registadas nos últimos tempos têm agravado de forma considerável as condições de trabalho e, consequentemente, o aumento da contratação a termo e da precariedade nas relações laborais. O contrato de trabalho a termo é um instrumento sedutor, para quem o estuda, porque é dinâmico e versátil, tendo demonstrado, ao longo das últimas décadas, uma enorme capacidade de resposta às necessidades da economia e do mercado.

Trabalho Temporário – Um prenúncio do agravamento da precariedade laboral em Angola

Nos últimos anos, temos assistido a um conjunto de iniciativas que visam a redução da precariedade laboral que o país regista.

Em 2019, o executivo lançou o PAPE (Plano de Acção de Promoção da Empregabilidade) e, em 2020, por intermédio do Ministério da Economia e Planeamento, apresentou o Programa de Reconversão da Economia Informal (PREI)

O contexto laboral angolano é fortemente marcado pelo trabalho informal, que, por sua vez, contribui directamente para o aumento exponencial da precariedade laboral em Angola. Adicionalmente, nos últimos tempos, tem-se registado um aumento significativo no número de empresas prestadoras de serviços de cedência de Trabalhadores Temporários a terceiros. O que deixa um sério prenúncio do agravamento da precariedade laboral no mercado angolano.

A maioria dos estudos indica que as primeiras actividades, preconizadoras das actuais empresas de Trabalho Temporário, surgiram em Inglaterra e nos Estados Unidos, no princípio do século XX, tendo, mais tarde, durante os anos 50, alcançado o resto dos países industrializados.

O Contrato de Trabalho Temporário é uma modalidade especial de contrato laboral, na qual existe uma relação de trabalho triangular, em que uma entidade empregadora (empresa de trabalho temporário – ETT), contrata, remunera e exerce poder disciplinar sobre um trabalhador (trabalhador temporário), colocando-o a prestar a sua actividade numa outra entidade (empresa utilizadora), que recebe e exerce de forma delegada, os poderes de autoridade e direcção sobre o Trabalhador.

Relativamente ao enquadramento jurídico do Trabalho Temporário em Angola, destaca-se o decreto presidencial 272/11 de 26 de Outubro, que, posteriormente, foi revogado pelo decreto presidencial 31/17 de 22 de Fevereiro, que aborda as questões de cedência de Trabalhadores Temporários, por parte das ETT, bem como as formalidades para a autorização do exercício desta actividade em Angola. A LGT em vigor, no seu artigo 31.º complementa o enquadramento jurídico do T.T no território nacional.

Por norma, o regime de Trabalho Temporário acarreta vários pontos negativos como a instabilidade do vínculo contratual, a insegurança causada na situação profissional, patrimonial, social, familiar, afectiva e emocional, a estigmatização sofrida pelos grupos mais débeis do ponto de vista laboral, tais como jovens, mulheres, pessoas mais velhas, pessoas com capacidade diminuída, estrangeiros, trabalhadores não qualificados, a menor propensão reivindicativa e organizativa, a falta ou déficit de formação profissional e a elevada sinistralidade. No entanto, também existem pontos negativos para o lado do empregador. À contratação a termo associam-se, em regra a menor produtividade, problemas de gestão de equipas, de cultura organizacional, de engajamento, de dumping social causado entre empresa etc.

Normalmente o T.T tem sido associado a vários aspectos negativos para os colaboradores, nomeadamente, salários baixos e poucos benefícios ou mesmo inexistentes. Sendo assim, qual a razão que leva os trabalhadores a aceitarem estas modalidades de contrato? Esta questão pode ser respondida com base em duas perspectivas, uma voluntária e outra involuntária. Do ponto de vista voluntário, o trabalhador aceita o contrato temporário por razões de flexibilidade, liberdade e pela diversidade de tarefas inerentes aos T.T, enquanto do ponto de vista involuntário o trabalhador aceita o contrato temporário por obrigação (necessidade) ou por ser uma das formas de conseguir um contrato permanente. De um modo geral, pode defender-se que o contrato de trabalho a termo permite o acesso ao mercado de trabalho no início da carreira e permite adquirir experiência profissional. Para alguns trabalhadores é vantajoso, ainda, na medida em que permite diversificar experiências e conhecimentos de um modo flexível, obtendo ainda rendimentos suplementares, ou até favorecendo um melhor uso do tempo de trabalho, de modo a gozar mais tempo livre.

A competitividade no mercado de profissional tem sido factor de criação de novas formas de trabalho para o aumento de produtividade. Isso, tem sido incentivo do uso de formas de emprego atípicas como, o trabalho parcial, contratos temporários, horários de trabalho não normalizados, teletrabalho etc., o que repercutiu no local de trabalho, em termos de relacionamento empregador-empregado.

O tema leva à reflexão sobre a precariedade e a escolha da mesma, em termos de contratação. Porque contratar por termo e não ser efectivo? Porque receber poucas condições de trabalho ou nenhumas e aceitar as mesmas?

Ao mesmo tempo, o recurso ao trabalho temporário tem sido uma forma de transformar custos fixos em variáveis. Sem dúvida, este tem sido o alargamento das possibilidades de recurso ao trabalho temporário, libertando as empresas de custos fixos não justificados e de tempos improdutivos. Por um lado, ele agrava a precariedade do emprego e por outro possibilita o aumento da competitividade das empresas, visando a satisfação de necessidades pontuais de mão-de-obra, ou necessidades imprevistas de curta duração

Economistas e formuladores de políticas também estão cada vez mais interessados em investigar o impacto do emprego precário sobre o bem-estar e a qualidade de vida das pessoas. Os trabalhadores temporários, como não são enraizados numa comunidade estável, não têm uma organização, tornando-os expostos a riscos de conflitos laborais. 

Contudo, vale realçar que a questão da precariedade não é uma questão exclusiva dos contratos a prazo. A precariedade laboral em Angola também é uma realidade na vida de trabalhadores com contratos efectivos. Neste sentido, torna-se cada vez mais necessária a fiscalização e o acompanhamento contínuo das condições de trabalho em Angola, por parte da Inspecção Geral do Trabalho – IGT.

Edivaldo  João

Edivaldo João

Consultant EY, People Advisory Services