Prostituição prolifera e ‘regulariza-se’ nas redes sociais
JUVENTUDE. Falta de emprego e deterioração dos salários apontados como estando na base do crescimento da prática. Vozes críticas alertan para os perigos da profissão, aconselham alternativas mais “honrosas” e exigem a intervenção do Estado.
A prostituição é uma prática reconhecidamente antiga pelo mundo, havendo cada vez mais países que têm optado pela sua legalização.
Em Angola, por falta de legalização mas também pela condenação moral da sociedade, a prática é normalmente realizada às escondidas. Ou seja, nem as mulheres nem os homens que nela se envolvem querem ser vistos. Mas, nos últimos tempos, sobretudo com o surgimento das redes sociais, com destaque para o Facebook e o Whatsapp, as jovens prostitutas passaram a criar perfis de prostituição, sem receio de colocar o rosto e o corpo explícitos.
Quem visita essas páginas, ou contacta as jovens via telemóvel, fica com a nítida sensação de que, em inúmeros casos, se trata de mulheres cultas ou que têm à disposição um serviço de agenciamento qualificado, não só pelo nível de organização, mas também pelo domínio da língua portuguesa falada e escrita. E há vários sites e páginas dessa natureza, o que também leva à diversificação de preços.
Testemunhos recolhidos pelo VALOR revelam que a definição de preços médios é difícil, mas há uma espécie de categorização, por “critérios de qualidade e de quantidade” que definem as balizas. Esses critérios podem incluir a idade da jovem, a beleza exterior, a zona em que reside e/ou oferece os serviços e uma infinidade de atributos. É por essa razão que, em Luanda, os preços podem começar pelos quatro mil kwanzas por acto sexual ou por hora e atingirem os máximos de 50 mil kwanzas por acto ou hora.
Os valores mais altos são cobrados, geralmente, por determinados grupos que oferecem até serviços mais sofisticados, incluindo ‘callcenter’ durante 24 horas. E para se ter acesso às jovens desses grupos, o cliente deve fazer a reserva com um ou dois dias de antecedência, via Facebook, Whatsapp ou telemóvel. E o ‘freguês’ é direccionado a um dos apartamentos que o grupo tem arrendado na circunscrição mais próxima em que “reside o produto”, nome de código atribuído à requerida.
Ao VALOR, algumas dessas jovens justificam o ofício com a falta de oportunidades de trabalho ou com a generalidade dos salários baixos que não satisfazem as necessidades correntes. Mas muitos dos que estão de fora condenam a prática e aconselham as jovens a investirem na formação técnico-profissional e num “negócio honroso”.
Julieta Fernandes, vendedora de peixe ao domicílio, reconhece que muitas jovens enveredam para a prostituição por causa do desemprego, que já ronda os 4,1 milhões de pessoas, 55% das quais mulheres, segundo os últimos dados do Instituto Nacional de Estatística. Ainda assim, Julieta Fernandes pensa que a situação não pode justificar a “corrida que se verifica à vida fácil (prostituição)”, apontando-se como exemplo. A cuidar de três filhos sozinha, sem emprego nem apoio familiar, a jovem decidiu trabalhar como vendedora de peixe das embarcações, em Cacuaco. Sete anos depois, acabou por criar o próprio negócio, com um investimento de 15 milhões de kwanzas. “A prostituição não leva a lado nenhum, senão à depressão, face ao sentimento de desvalorização humana, além de doenças sexualmente transmissíveis. Apelo às miúdas a investirem em negócio próprio ou a um emprego, mesmo com salário mínimo”, aconselha.
Nancy Ernesto é também uma jovem empreendedora. Fundadora e CEO da Anvon Nancia Comercial, iniciou o negócio de cosméticos em 2012, altura em que regressou ao país, vinda da África do Sul, onde estudou e trabalhou como ‘líder de vendas’ de uma empresa do ramo em que actua.
A jovem, que inicialmente operava na informalidade, investiu 10 milhões de kwanzas para começar o negócio. A aposta, como declara, tem “valido a pena, dado a crescente movimentação diária”. Por exemplo, em 2018, a empresa facturava 1,2 milhões de kwanzas/mês. Neste ano, a facturação mensal subiu 108% para 2,5 milhões de kwanzas.
Declarando-se com problemas como qualquer um, a jovem empreenderora explica que optou por “estudar e trabalhar”. Hoje conta com dez colaboradores directos e quatro ‘líderes de vendas’ (pessoas que gerem um grupo de revendedores). Além de duas lojas em Luanda, possui um quiosque no Zaire. O estabelecimento localizado no Shopping Xyami representa mais de 70% do volume de negócio.
Carla Teresa, funcionária de uma boutique, na rua da Liga Africa, considera que as jovens que se encontram na prostituição desconhecem “o valor do corpo”. Embora gerente do local, tem um salário mínimo que não cobre “muitas despesas”, mas, ainda assim, prefere o trabalho “honesto e honroso” à prostituição.
A gestora viveu 18 anos na Zâmbia e regressou a Angola padecida de uma “forte” pneumonia. Viveu em residências de amigas enquanto procurava tratamento. Antes ser gerente da boutique, vendeu flores e fez outros negócios.
Carla Teresa não tem dúvidas de que as jovens prostitutas “preferem dinheiro fácil e constante”. A jovem chama atenção para os perigos e apela a uma intervenção do Estado.
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