Empresas portuguesas relatam dificuldades

Angola garante que já pagou 81% dos atrasados

DÍVIDA. Montante certificado abaixo do valor reclamado pelos portugueses. Pagamentos conheceram poucos desenvolvimentos no ano passado, com o Ministério das Finanças a justificar-se com a pandemia e com a queda do preço do petróleo.

Angola garante que já pagou 81% dos atrasados

Angola já pagou cerca de 81% do montante certificado dos atrasados que tem para com as empresas portuguesas, segundo dados das Finanças, mas, ainda assim, há empresas a enfrentar dificuldades atriuídas à falta de pagamento por parte do Governo.

Actualmente, estão registados 40 fornecedores de diversos sectores, cujo montante da dívida certificada é de 191,5 mil milhões de kwanzas (312,2 milhões de dólares), dos quais já se encontram regularizados 155,8 mil milhões de kwanzas (254 milhões de dólares), garante o Ministério das Finanças, em resposta ao VALOR.

Os dados indicam que as dívidas de 24 das 40 empresas estão “completamente pagas e as demais, maioritariamente, encontram-se em fase bastante adiantada”.

No entanto, inúmeras empresas portuguesas relatam várias dificuldades “por causa da dívida de Angola”. Há casos de empresas que foram obrigadas a vender os pertences para “equilibrar as despesas e subsistir de alguma forma”. Algumas, até 2017, tinham mais de 100 trabalhadores, actualmente, têm menos de uma dezena.

Os relatos indicam que, desde a visita do presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, em Março de 2019, que as negociações entre o Ministério das Finanças e estas empresas aceleraram “bastante”, mas os processos “desaceleraram” em 2020.

O Ministério das Finanças justifica o “abrandamento em 2020 com o contexto económico fortemente influenciado pelos efeitos da pandemia covid-19 e a queda dos preços do petróleo no mercado internacional”, neste ano.

E garante que o Executivo “continua firmemente engajado no processo de regularização de atrasados com todos os seus fornecedores sem qualquer discriminação pela sua origem”, realçando que a dívida para com as empresas portuguesas “continua a ser regularizada”.

O Ministério dá conta, por exemplo, que as principais  dificuldades nas negociações foram “o clima de permanente depreciação da moeda nacional bem como o pagamento com base em Obrigações do Tesouro Não-Reajustáveis (OT-NR), que faz com que as empresas se sujeitem a descontos relevantes para transformarem em liquidez”.

Mas a maior parte destas empresas, apesar das dificuldades, “tem conseguido chegar a acordos de regularização de dívida, e muitas delas têm usado as OT-NR para colateralizar operações de financiamento junto dos bancos e continuar a investir em Angola”, garante o Ministério.  “O pagamento de atrasados tem permitido às empresas atenuar as adversidades do actual momento económico”, finaliza.

 

EMPRESAS RECLAMAM QUASE 400 MILHÕES DE DÓLARES

As empresas portuguesas reclamam um montante de 254,8 mil milhões de kwanzas (382 milhões de dólares). Angola certificou apenas 191,5 mil milhões de kwanzas (312,2 milhões de dólares).

Em Maio de 2019, por exemplo, o Governo já dava conta de ter desembolsado 250 milhões de dólares da dívida certificada.

Durante a visita de Marcelo Rebelo de Sousa, as empresas portuguesas reclamavam uma dívida de entre os 400 e 500 milhões de euros (420 a 530 milhões de dólares), mas Angola situava o valor na ordem dos 300 milhões de dólares.  O Presidente João Lourenço garantia, na altura, que a dívida estava “gradualmente” a ser reduzida e deixava claro que a “dívida é para ser paga”.

O Governo definiu três fases no processo de regularização das dívidas das empresas que passavam pelo reconhecimento, certificação e pagamento.

 

TUDO À VENDA

Uma das empresas portuguesa que reclama não ter ainda a dívida saldada colocou à venda, na internet, o seu equipamento incluindo material de escritório. Especialista na construção de estradas, a empresa sentiu-se obrigada a desfazer-se de tudo o que investiu por não ter forma de continuar as operações em Angola. No Facebook, colocou à venda dezenas de camiões, tractores, betoneiras, geradores, empilhadoras, escavadoras, compactadoras de rodas e de cilindros, vibroacabadoras, entre outros equipamentos, de marcas de topo, como a Volvo.

A empresa, com sede no Norte de Portugal, instalou-se em Angola em 2008. Contactada pelo VALOR, uma fonte da empresa limita-se a justificar a venda de todo o equipamento com as dificuldades de tesouraria, precisamente por causa dos atrasos “no recebimento da dívida do Estado”. No entanto, pediu o anonimato justificando com receios de prejudicar as negociações com o Governo.