Analistas alertam que não é função do Governo criar fundações
ANÁLISE. Além da intromissão numa esfera reservada ao sector privado, analistas recordam que já existem instituições com competência para absorver as tarefas reservadas à nova fundação.
Não cabe ao Governo a criação de fundações, porque estas radicam da Lei do mecenato e por esta via “devem ser entes insuflados” pelo sector privado. As palavras são de José Severino, presidente da Associação Industrial Angolana (AIA). Também membro do Conselho Económico e Social, Severino indica que ao Governo cabe montar institutos a exemplo do Instituto de Desenvolvimento Florestal (IDF) que se ocupada aplicação de políticas de exploração e gestão florestal.
Para o ‘número um’ da AIA, ao avançar nesta direcção, o Governo estará a retirar iniciativa ao sector privado. “Uma coisa são instituições ligadas ao aparelho de Estado e outra são fundações com a sua função económica e social bem definidas”, defende, alertando para o perigo da criação de fundações, como aconteceu no passado com a Fesa, “que promovia reuniões e festas, e o fundo Lwini, quando queriam acabar com a AIA”, há mais de 20 anos. “Quando aparecem organizações que depois se transformam em doadoras já é mau. Ou seja, primeiro, põem a pessoa à fome e, depois, surgem com um prato de lentilhas e exibem na televisão, isso é crime”, compara o líder associativo que pede maior atenção ao Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos “para evitar esses atropelos às regras”.
Por sua vez, o jurista António Pedro também reprova esta iniciativa governamental, argumentando que “o melhor seria fazer funcionar instituições já existentes”. Sendo que “o país está cheio delas que não funcionam”, cita o exemplo das fraquezas do sistema de justiça e de entidades que deviam na prática impulsionar a economia como o Instituto para as Pequenas e Médias Empresas (Inapem) e o Banco de Desenvolvimento de Angola (BDA) ou ainda o Prodesi “envoltas num manto de muita burocracia”.
Igualmente professor universitário, nota que “nada está a alavancar de facto o desenvolvimento”, acrescentando que “tudo isso ocorre, por falhas no sistema de fiscalização do Estado”.
Quem também discorda é Arlindo Sicato, antigo vice-ministro das Finanças, para quem “não faz sentido” o Governo avançar com o Fundo para o desenvolvimento. “Se o problema é conferir fundamentação científica aos programas do Executivo, então para que serve o Ministério da Economia e Planeamento?”, questiona, avançando que “o novo ente parte em desvantagem a não ser que o Presidente João Lourenço queira acomodar alguém”.
O problema, diz ainda, “não reside na criação de várias estruturas e organizações, comissões e mudanças de certos iluminados, mas o que se passa decorre de sucessivos fracassos de programas e organismos do Executivo que vivem interferindo no ‘modus operandi’ dos outros e no fim ninguém presta contas como devia ser”.
Nesta linha de ideias, prossegue que estão condenados o ‘Programa de reforma do Estado’, da ‘Alta autoridade contra a corrupção’ e a ‘Inspecção-geral do Estado’, tal como ‘morreu’ o SEF - Saneamento Económico e Financeiro, nos anos do partido-Estado.
De acordo com o também economista, "isso tudo se resume ou na incapacidade institucional das estruturas do Estado, incompetência dos recursos humanos (crise de autoridade e falta de qualidade dos serviços), ausência de auditorias e inspeções de facto ou existência de um circuito interno bem instalado que vai trabalhando na sabotagem e contra os bons programas de desenvolvimento económico e social”. Ao contrário, enumera que seriam suficientes as acções dos ministérios das Finanças, Planeamento, Ciência, Tecnologia, Ensino Superior e dos órgãos de defesa e segurança, etc.
Sicato aconselha mesmo que evite“mandar para a reforma antecipada novas estruturas que se criem com tendência de policiamento, quando já existem”.
NOVO ENTE COM ESTATUTO
A Fundação Nacional para o Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico, criada para captação e gestão de financiamento, apoiar a ciência e estar alinhada aos padrões internacionais, tem o seu estatuto orgânico já aprovado pelo Conselho de Ministros. Com isso, o Executivo quer que o investimento na ciência seja, pelo menos, de 1% do Produto Interno Bruto (PIB), conforme recomendado pelo Fundo das Nações Unidas para Ciência e Educação (Unesco).
A ministra do Ensino Superior, Ciência, Tecnologia e Inovação, Maria do Rosário Sambo, afirmou, à saída da reunião que aprovou o seu estatuto, que o FUNDECIT terá a categoria de instituto público com a missão de implementar as políticas de ciência, tecnologia e inovação, com meios financeiros do Orçamento Geral do Estado e outros provenientes de doações destinados à investigação científica e desenvolvimento.
A FUNDECIT vai igualmente proceder à avaliação e acreditação das instituições que se dedicam à investigação científica e desenvolvimento do país, de forma a aumentar a eficácia no aproveitamento dos recursos financeiros disponíveis e o apoio à produção científica nacional.
"É uma aprovação que é conseguida no Dia de África, relevante para nós, porque a investigação científica é, sem dúvida nenhuma, a base do desenvolvimento. Esperamos que com esta medida o nosso Governo consiga de facto contribuir para melhorar a produção científica nacional”, disse ainda Maria do Rosário Sambo, destacando também os projectos de investigação científica levados a cabo pelo Executivo, no âmbito do projecto de Desenvolvimento da Ciência e Tecnologia, financiados pelo Banco Africano de Desenvolvimento.
A FUNDECIT, criada por Decreto Presidencial, é tutelada pelo pelouro do Ensino Superior Ciência e Tecnologia e Inovação, enquanto órgão de superintendência a quem cabe criar as condições para o seu funcionamento, com base nas prioridades definidas na Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, que define a forma de organização da investigação científica no país.
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