“90 por cento da moda em Angola é cópia”
ENTREVISTA. Assume-se como a maior estilista angolana genuinamente africana e não aceita modelos já feitos, pois defende com garras a sua identidade. Eleva a moda angolana a um patamar mais próximo das principais indústrias de África, da lusofonia e do mundo, como França, EUA, África do Sul, México, Coreia do Sul, Togo, Moçambique, África do Sul, Alemanha, Quénia, Tanzânia, Macau, Espanha e Portugal.
As suas roupas têm identidade?
Quem conhece o meu trabalho, muito rapidamente identifica. Tenho um país que conhece muito bem as minhas roupas, apesar de termos milhões de cópias e pessoas a fazerem o que estou a fazer logo a seguir, mas isso também é bom, não me atrapalha em nada, porque são seguidores. O estilista não se senta para copiar, mas sim para criar. Vejo muito nos trabalhos dos angolanos um Valentino, Channel ou Armani. 90 por cento da moda em Angola é cópia de alguma marca.
Repete algum modelo?
Não repito nenhum modelo e nem tenho noção da quantidade já criada. Esse é o meu trabalho como criadora: tentar ao máximo não repetir. Embora a marca ‘Nadir Tati’ comece a estar virada para o pronto-a-vestir.
Os estilistas angolanos estão preocupados em levar a cultura para fora?
Sim. Temos acompanhado um processo de crescimento da moda em Angola. Mas há muitos criadores com trabalhos, não diria completos, que não passam de imitações. É importante criar uma identidade e é essa preocupação que a maioria dos criadores não tem. Começa a ser um bocado mecânico e esforçado quando, uma ‘passerelle’, aparece uma saia que depois encontramos no mercado. A ideia é apresentar novas tendências.
Tem clientes direccionados?
Costuro para todos os bolsos. Cada vez vamos tendo mais, porque crio, não só alta-costura, mas uma linha mais básica.
Aceita encomendas com modelos já feitos?
Tenho isso todos os dias, mas não faço cópias. O cliente, quando vem para o meu atelier, tem de vestir ‘Nadir Tati’.
Quais os momentos altos na sua carreira?
Sou a criadora com mais prémios em Angola, de Diva e criadora do ano. Tive muitos momentos bons, mas é claro, há alguns muito especiais, como vestir a primeira-dama Ana Paula dos Santos na posse do presidente José Eduardo dos Santos, vestir a actriz congolesa Rachel Mwanda, nos Óscares de 2013, entre outros. O meu primeiro desfile no México, em Cancun no Fashion Week, foi extremamente importante, porque foi o início. Tenho muitos momentos e é isso que me motiva a continuar com essa garra, porque não é fácil. Também é necessário ter um pouco de sorte, mas acima de tudo as coisas acontecem porque faço com que aconteçam. Durmo pouco, trabalho muito, porque o meu trabalho é exactamente criar. Vestir a Ana Paula foi a maior conquista, por ser minha amiga e primeira-dama. Crio quase numa base semanal e tiro sempre um tempo para ela. É uma mulher bonita com um corpo invejável e tem quase tudo no lugar, tudo lhe fica bem. O que mais me fascina nela é querer vestir sempre algo meu ou africano.
Veste roupas de estilistas angolanos?
Gosto de experimentar roupas de criadores angolanos e não só.
Tem projectos fora da moda?
Estou a redigir um livro sobre a ‘História da Moda em Angola e Exploração Sexual Comercial de Crianças’.
Como é que lida com o mercado nacional?
Ser estilista em Angola e em África não é fácil. É preciso muita dedicação. Claro que o talento é importante, mas a motivação para mim é chave. Quando temos poucos meios para criar, quando as portas nem sempre são abertas é preciso muita luta e força de vontade, muito sacrifício, por parte dos criadores para poder expor as suas obras e poder fazer com que a voz chegue em toda parte do mundo, principalmente em Angola. Sou conhecida pelo trabalho que faço, de Cabinda ao Cunene. É um desafio constante, todos os dias acordar e superar-me a mim mesmo. Não temos condições criadas para uma indústria de moda.
PERFIL
Nome: Nadir Luzianne Casimiro Tati
Nascimento: 2 de Setembro de 1974
Filhos: Dois
Formação: Licenciada em Sociologia, com uma pós-graduação em Criminologia em Exploração Sexual Comercial de Crianças e bacharelato em Design de Moda
Idiomas: Português, alemão, inglês, espanhol e francês
Prémios: 2011 e 2012, homenageada com o título Diva da moda angolana; melhor estilista do ano nos prémios da Moda Luanda em 2010, 2011, 2012, 2013 e novamente em 2015. Em 2015, estreou-se com a colecção ‘Liberdade nos 40 anos de Independência’, na 44.ª edição da Moda Lisboa.
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