A escolha do ano
A escolha da Personalidade do Ano de 2024 recai sobre João Lourenço. É a terceira vez que o Presidente da República e do MPLA reclama esta posição, nestas nove edições consecutivas em que o Valor Económico faz este exercício. Como já o escrevemos no fecho do ano passado, pela sua regularidade e consistência, a Personalidade do Ano escolhida pelo Valor Económico é a iniciativa do género mais experimentada na imprensa angolana.
Desta vez, não se tratou, entretanto, de uma opção fácil. Contrariamente às edições anteriores, a escolha de João Lourenço foi mais do que controversa. Os jornalistas que têm a responsabilidade de decidir a última capa do jornal jamais estiveram estão divididos. É fácil percebê-los.
O ano de 2024 mostrou de forma expressiva o interesse de João Lourenço em manter-se no poder, ainda que apenas no MPLA. O chefe dos ‘camaradas’ silenciou as vozes críticas internas e decidiu alterar as regras do partido, violando de forma descarada o próprio estatuto. Com a cumplicidade cínica e cobarde de velhos, graúdos e ‘miúdos’, João Lourenço abandalhou o estatuto do MPLA como, na generalidade, o regime que comanda pisoteia a Constituição. Genericamente, a Lei Magna tem mais serventia quando defende e justifica os interesses do regime e do seu chefe. Quando se revela ao contrário, é colocada no seu devido sítio: um amontado de papéis que pouco serve.
Mas a insistência de João Lourenço com o poder terá inapelavelmente algum preço, já que antecipa cenários de instabilidade imensuráveis. Pelo menos para já, não há saídas fáceis. Se, como é o mais provável, concorrer à sua sucessão em 2026 no partido, não pode ter garantias de que um eventual Presidente da República saído do MPLA ‘não lhe faça a folha’. Afinal, foi com ele que os outros todos aprenderam. Se, por hipótese, embarcar na tentativa da alteração constitucional e se a resposta dos partidos políticos na oposição não for à altura, a população poderá reagir de forma descontrolada e instalar-se o caos. Aguardemos para ver mas, até lá, fica a certeza de que João Lourenço aparentemente não se interessa com os meios para atingir o fim, o fim da manutenção no poder.
A aproximação aos Estados Unidos, para já, é apenas e simplesmente uma incógnita. Apesar de ter tido o mérito de trazer Joe Biden, já na condição de praticamente ex-Presidente dos Estados Unidos, o futuro da relação com os norte-americanos dependerá dos humores de Donald Trump. O mesmo, o enigma nas relações também passou a ser válido para a China, a partir do momento em que João Lourenço decidiu relativizar a importância de Xi Jinping. João Lourenço sabe-o bem como desconfiam muitos angolanos.
Nota
O VALOR ECONÓMICO estreou-se, em 2016, com a publicação da ‘Personalidade do Ano’. Trata-se de uma edição especial de periodicidade anual em que é identificada uma pessoa, um grupo, uma instituição, uma ideia, um evento, um facto ou uma invenção que mais se tenha destacado ao longo do ano, emAngola. De acordo com os critérios do jornal, a ‘Personalidade do Ano’ não representa necessariamente uma distinção de mérito ou de qualidade, por feitos positivos. Através de critérios marcadamente objectivos, a ideia é apontar o indivíduo ou facto (como identificado acima) que, por razões diversas e que podem ser de cariz negativo, tenha marcado de forma diferenciada o ano. Os critérios são flexíveis e são ajustados, conforme o jornal o entender justificável. Entretanto, a repercussão e a relevância política, económica e social, além da exposição mediática, é permanente.
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