“A música promove a bajulação”
ENTREVISTA. Toni Nguxi deixou os palcos, não por causa do dinheiro, mas porque precisava de se identificar e buscar satisfação espiritual. Procura agora promover o folclore angolano, através de quatro projectos socioculturais que lidera: Akwafrica, Hanahene, Iumox, WezaAngola. Pensa que as empresas precisam de motivação para apoiar os artistas.
Como está o panorama musical angolanao?
Carece de um profundo trabalho. Passa primeiro por perceber que somos ricos musicalmente, existe um produto e um mercado grande e forte. Dá para fazer uma indústria e sustentar os fazedores e consumidores. Isso é uma verdade incontornável. Estruturar essa indústria passa por uma política do Estado. E depois desagua nas dificuldades que não conhecemos. A música angolana é um produto rico, mas a indústria é pobre. Só conciliando as duas coisas é que teríamos um mercado fértil. Do resto, é um mercado que, no fundo, acaba promovendo a bajulação. As pessoas têm de correr atrás do patrocínio e isso não se faz. Tem de se conciliar a riqueza da música e a política da industrialização do produto.
Tem sido a sua luta?
Não! Porque é uma luta política que está fora do meu alcance.
Porque o folclore não tem o mesmo dinamismo e a expansão da semba?
O semba também é folclore. Era uma dança cantada com batuque e à base do canto. Evoluiu, mas mesmo assim ainda é folclore. Precisa-se trazer o folclore e mostrar a todos. Nem todas as pessoas vão ter acesso ao campo onde o folclore está, é nossa missão trazê-lo.
Faz ‘músicas comerciais’?
Há muito que já não faço ‘música comercial’. Desde 2002, quando rompi contrato com a Gala Record International da África do Sul, descobri que o meu caminho não era estar à frente de luzes e fotografias. O meu caminho era entrar mais no campo, falar com pessoas e trazer mais a cultura.
Porque tomou essa decisão?
Sentia-me aflito, andar de palco em palco, que, muitas vezes, não tinham nada de cultural. A gente ia, às vezes, fazer publicidade de uma marca de cigarro ou disso e daquilo. Mas também, porque não me satisfazia espiritualmente. Descobri que a minha terra não era só Moxico, mas também Angola, África e o Mundo.
Qual foi o seu maior desafio?
O maior desafio fui eu mesmo. Tive de me superar e saber que o mundo não é meu inimigo. Só nos maltratam quando estamos num local que não é nosso. Temos de estar na sociedade como contribuintes e não como heróis e donos da verdade. O resto foi uma jornada e compreender que as lágrimas tinham de existir.
Recebe apoio de empresas?
Pessoalmente não! Os projectos fazem parcerias, trocas, e é assim que funciona o mercado. Não existe nenhuma empresa com um contrato permanente. Há sim parcerias que duram 24 horas, dependendo do evento.
Qual deve ser o papel do empresariado na cultura?
Os fazedores de artes, por exemplo, não devem pedir patrocínio a uma empresa, sem que esta ganhe algo por parte do Estado. Quem dá a motivação ao empresariado é o Estado que deve descontar nos impostos. Ou seja, ela patrocina o artista e, no fim, apresenta as facturas ao Estado que lhe desconta nos impostos. As empresas não sabem o que vão ganhar quando ajudam e isso é uma falha grave.
Como está o projecto Hanahene?
Está na incubadora. Depende de algo que tem de ser feito a nível da SADC e depois a nível nacional. É provável que, até ao próximo ano, saia da incubadora. Falta também criar relações culturais, da arte feita no leste do país, e o intercâmbio dos países vizinhos, e isso passaria por uma apresentação a nível da SADC através do projecto ‘Iumoxi’.
O que é o projecto ‘Eu ainda sou uma criança’?
Foi lançado em 2010 e tem como objectivo transformar os campos de batalha em parques infantis. Começamos com o Kuito Kuanavale. Em 2011, sentimos necessidade de fazer uma pausa e ir buscar mais forças. É um projecto de carácter pedagógico-cultural
Acarreta custos?
Acarreta, mas é preciso que o criador não fique muito agarrado aos custos e à contabilidade, porque os números assustam e fica-se desmotivado. É preciso estabelecer metas e andar devagar. Muitas vezes realizamos grandes sonhos, só depois é que damos conta que custou muito dinheiro.
Lidera quantos projectos?
Só o programa chamado Akwafrica, com várias segmentações e projectos com equipas constituídas. Tem o ‘Eu ainda sou uma criança’, ‘Hanahene’, ‘Iumoxi’ e ‘WezaAngola’. Todos virados ao activismo sociocultural com acções construtivas e positivas. São todos semelhantes, mas com momentos e objectivos diferentes.
Perfil
Nome: António José Augusto
Estado civil: Casado
Aniversário: 16 de Agosto
Formação: Jornalismo comercial
Ocupação: Artista
Referências no musical angolano/estrangeiro: Waldemar Bastos, Bonga, Tela Lando, Sam Manguana, Kassav, Miriam Makeba e Salif Keita.
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