“Aqui temos muitas máscaras”
MÚSICA. Três anos depois de ausência do movimento artístico, Konde Martins ressurge com novos sucessos. Prepara o próximo álbum, ‘Morena’, cuja música promocional já está disponível. Entre os projectos, o artista revelou ao VE as razões da ausência e lamenta a falta de união entre colegas, o que faz com que a “música não goze de boa saúde”.
Ultimamente temos visto muito o Konde fora de Angola...
Chega um momento em que os músicos sentem necessidade de darem cara às comunidades angolanas lá fora, além da promoção da música. Não dava muita atenção a isso. Afinal, existe uma comunidade muito grande de angolanos também que gostam de assistir aos ‘shows’ dos músicos do seu país. Em três anos, tentei fazer uma digressão por Portugal, França, Espanha e Brasil, enquanto aproveitava formar-me em Portugal. Participava em eventos e acabou por dar certo porque também fica mais fácil convidarem o músico que vive na Europa do que tirá-lo daqui.
Esteve a residir na Europa?
Sim, estava a estudar, mas infelizmente não terminei. Não consegui conciliar com a carreira. Pela mesma razão que não terminou Engenharia informática… (Risos) pois é, também! Faz oito anos que tentei terminar Engenharia, mas a música é muito ciumenta, e como profissão que é, era impossível conciliar com os estudos. Vivo da música e tinha de velar muito mais pela segurança financeira para poder garantir o pagamento da propina. Mas tenho de terminar, claro, porque é uma satisfação pessoal, não por obrigação, até porque a minha carreira felizmente já está consolidada.
Entre Angola e a Europa, onde se movimenta mais e tira mais rendimentos?
Em termos de rendimento, Angola, durante uma fase, superou dadas as condições de vida e estatuto como angolano. É diferente em relação a outro país, onde se paga muitos impostos e faz-se muitas contas. Mas agora, infelizmente com a crise, que também veio aguçar a criatividade, fez com que nos interessássemos mais lá fora. A moeda estrangeira valorizou-se de tal forma que se hoje fizer um espectáculo com pouco rendimento, quando vier para cá, é grande coisa.
Se lhe dessem essas duas opções para morar, onde escolheria?
Definitivamente em Angola porque é aqui onde me sinto bem. É o meu povo. Já tenho uma estrada, um estatuto consolidado. No estrangeiro,é muito mais fácil para os outros povos, como os cabo-verdianos, darem-se bem, porque são solidários. Não é fácil um angolano dar um espectáculo e ter muita gente. Já aqui é diferente, anuncia-se um concerto, estou a contar com mais de cem pessoas que são fiéis à minha música. Na Europa participa em eventos de que tipo? Tudo o que tem a ver com datas festivas. Em festivais de kizomba que chamam de ‘workshops’. Os promotores desses cursos convidam para uma prelecção ou uma actuação dos músicos que interpretam temas que normalmente se dançam. Por exemplo, a música ‘Negra’, dos muitos países que fui por causa de festivais, é uma referência para qualquer aluno aprender a dançar.
É a música que mais o promove?
É. Mas até hoje o ‘Cátia’ é uma das músicas indispensáveis nos ‘shows’. Aliás, em qualquer parte do mundo, o primeiro disco (em que consta o tema ‘Cátia’) ainda é o mais vendido, porque marcou a vida de muita gente.
Ainda ganha direitos autorais?
Claro. Para toda a vida.
Obtém um bom rendimento?
É razoável. O rendimento conseguimos dar conta com os anos. Aqui os direitos autorais ainda não se fazem sentir, mas estou inscrito na Sociedade Portuguesa de Autores.
‘Cátia’, ‘Negra’ e ‘Morena’. Porque é que as músicas estão sempre relacionadas a nomes femininos?
É tudo espontâneo. No meio das outras, destacam-se. São histórias fictícias, mas baseadas na realidade. ‘Cátia’, por exemplo, é parte ficção, parte real; ‘Negra’ é homenagem à mulher africana e ‘Morena’ é daquelas cenas de inspiração.
Qual é a percepção que tem da música angolana?
Não está saudável porque não somos tão humildes como era a outra geração, cujos artistas partilhavam os mesmos meios e os mesmos sítios. Hoje é notória a separação entre músicos. Uns acham-se melhores do que outros. Convivi com muitos músicos lá fora, como os cabo-verdianos. Há um respeito mútuo. Depois de voltar, notei a diferença. É como se tivéssemos uma doença que nos separa, aqui temos muitas máscaras.
Nessa fase tem recebido convites de partidos políticos?
Por acaso já…!
De que partidos?
É complicado porque passa tudo pela minha agente. Só depois temos de sentar para avaliar qual é o espectáculo que vamos. Normalmente quem tem a capacidade de custear esses ‘shows’ é só um e sabemos qual é.
A oposição não o convida?
Até já recebi vários convites, mas a minha bandeira sempre foi uma. Não faz sentido, assim não se sabe que causa se está a defender. Numa outra fase, se me convidam para um almoço, por exemplo, aceito. Nesta fase, não aceito, mas respeito quem o faça.
Há quem diga que a sua primeira separação conjugal interferiu na carreira…
Não foi isso. Claro que chocou, porque nesse relacionamento tive filhos. A música interfere muito nas nossas vidas: as ausências, a falta de controlo quando conhecemos um mundo novo, pessoas novas, isso tudo interfere no lar.
Quando está em Angola, onde mais se apresenta?
É raro. Na verdade nunca fiz nenhum ‘show’ de massas aqui. Faço em salas reservadas, para um público mais restrito, como a ‘Casa 70’, mas é diferente de fazer num Atlântico ou na Cidadela. Hoje apresento-me mais em festas de aniversário, casamentos, jantares de empresas.
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