DADO COMO VENCEDOR NAS PRIMEIRAS CONTAGENS DOS VOTOS

Cidade Alta aguarda João Lourenço com alta taxa de inflação e baixa riqueza

DESAFIOS DO NOVO GOVERNO. Candidato do MPLA vencedor das eleições da semana passada prometeu “melhorar o que está bem” e “corrigir o que está mal”, numa altura em que três dos principais indicadores económicos estão piores do que antes do cacimbo de 2014. Alta taxa de inflação, riqueza magra e um kwanza mais fraco são o ‘baptismo de fogo’ ao novo PR.

21151106 806658772792608 624945817 n

A Comissão Nacional Eleitoral (CNE) acaba de apresentar os resultados preliminares das quartas eleições gerais de Angola, dando como vencedor o candidato do MPLA, João Lourenço, absorvendo 61,10% dos votos escrutinados até sexta-feira.

Confirmada a vitória, após a apresentação dos resultados definitivos, o vice-presidente do MPLA deve preparar a logística para se mudar ao Palácio Presidencial, onde começa a ensaiar os quatro principais eixos da sua agenda de governo, que privilegia a melhoria do ambiente de negócio, desenvolvimento do sector privado, aumento do investimento directo estrangeiro e a consolidação do sector financeiro.

As metas de Lourenço encontram uma Angola completamente diferente a anterior ao cacimbo de 2014, quando o preço do barril oscilava entre 98 e 100 dólares e a riqueza nacional a crescer a 8,8%, além de uma taxa de inflação de 7,48%.

Em oposição ao ambiente económico antes da também chamada crise cambial, devido aos recuos expressivos dos recursos em moeda estrangeira, o declarado Presidente da República deverá lutar contar uma inflação que fechou Julho nos 29,01%, um dólar duas vezes mais caro e um flutuante preço do barril de petróleo, fixado nos 52,48 dólares (até à tarde de 25 de Agosto), apesar de constar da sua agenda o “reforço da diversificação da produção nacional, em bases competitivas”.

Aliás, até mesmo o pleito que deve levar João Lourenço e seus auxiliares à condução do Estado nos próximos cinco anos ressentiu-se dos apertos financeiros, marcado por uma forte desvalorização da moeda nacional, o que obrigou a um reforço considerável no valor para custear as campanhas políticas.

Assim, foi libertado dos cofres do Estado um envelope financeiro de cerca de mil milhões de kwanzas, precisamente 1.040.000.000, repartidos para seis formações políticas concorrentes.

Ou seja, foram necessários mais 953,6 milhões de kwanzas sobre o montante disponibilizado nas eleições de 2012 (86.400.000 Kz), divididos entre nove partidos) para fazer acontecer as eleições deste ano. No entanto, face à variação cambial, o orçamento eleitoral de 2017 recua em mais de dois milhões de dólares.

Outra batalha de João Lourenço será devolver o Produto Interno Bruto (PIB) na casa dos 100 mil milhões de dólares. Até às últimas eleições gerais, a riqueza nacional bruta valia 115,3 mil milhões, mas este dinheiro corroeu-se em mais de 22%, tendo fechado o ano de 2016 nos 89.633 milhões de dólares, de acordo com dados do Banco Mundial.

Equilíbrio cambial…

Outra adversidade a encontrar pelo novo presidente angolano será a constante desvalorização da moeda nacional. Desde Junho de 2014, o kwanza já desvalorizou mais de 20%. Estas eleições calham também numa altura em que comprar moeda estrangeira ficou mais caro, face às eleições anteriores de 2008, 2012 e 1992.

Comprar dólar custa, hoje, quase duas vezes mais do que nas últimas eleições, em 2012, com o Banco Nacional de Angola a despachar a moeda norte-americana a 166,7 kwanzas. Nem mesmo em 1992, tempo de guerra civil, era tão caro adquirir moeda estrangeira.

Apesar de não estar disponível na plataforma de pesquisa de taxas câmbios diários do banco central quanto custava o dólar em 1992, banqueiros ouvidos pelo VALOR afirmam que a taxa de compra rondava entre 60 e 80 kwanzas. …

Com substituição do Petróleo 

Tomando posse, João Lourenço prevê acabar com a dependência excessiva do petróleo, ou deixar de colocá-lo como principal fonte de receitas do país, através de um programa de aumento da produção interna de bens e serviços, sobretudo dos produtos da cesta básica e de outros produtos essenciais para o consumo interno e para a exportação.

O político quer também controlar, a curto prazo, a produção dos bens exportáveis de modo a gerar divisas, medidas que serão conseguidas, segundo define o programa de governo 2017-2022, pela intensificação da produção agrícola, pecuária e florestal, além da potenciação e utilização integrada dos recursos do mar e pescas e do desenvolvimento e modernização da indústria extractiva.

Prioridades vistas por analistas

Analistas antevêem, no entanto, outras prioridades, e sugerem que o Governo que sair das eleições realizadas a 23 de Agosto comece por alterar, de alto a baixo, a lei do investimento privado (LIP), a legislação sobre migração e estrangeiro e um “melhor acompanhamento das despesas publicas”. O economista Lopes Paulo e o consultor financeiro Galvão Branco defendem, como prioridades, uma requalificação da despesa, no sentido de se seleccionar, como forma de acabar, também, as assimestrias e fazer “melhor distribuição da riqueza”.

“As questões de natureza orçamental constam, seguramente, da prioridade, no que tem que ver com a despesa pública, no seu todo. Tem de se requalificar, para ver o que é prioritário na sua alocação, neste contexto de escassez”, antevê Lopes Paulo, no que é corroborado pelo dono da GB-consutores.

O também consultor, que já esteve ligado ao Governo, por via Agência para a Promoção de Investimento e Exportação de Angola (APIEX), coloca a necessidade de financiamento na agenda prioritária do novo Governo. Segundo defende, “não se pode governar sem dinheiro”, pelo que aponta a nova emissão dos eurobonds, como um a caminho para incluir na estratégia de administração de João Lourenço. “Está em curso a emissão dos eurobonds e acredito que será uma das prioridades a considerar”, acentua o economista, que sugere ainda a alteração de vários pontos da LIP.

Da LIP, deve ser revisto “tudo”, defende igualmente o pesquisador e estudioso dos assuntos económicos e financeiros, Ivan Negro. Para ele, o futuro Governo deve ainda olhar para a diversificação da economia, a excessiva dependência do petróleo, além da segmentação e privatização das empresas públicas, nomeadamente a Sonangol, TAAG e a Tcul.

Na banca, Ivan Negro considera que o Governo Lourenço deve intervir“nos bancos mais frágeis”. Citando dados do FMI, salienta que as autoridades nacionais“têm de realizar avaliações rigorosas da qualidade dos activos dos bancos”, além de recapitalizar ou encerrar as instituições financeiras mais fracas.

Já Flávio Inocêncio, outro analista e professor da Universidade de Coventry, Inglaterra, considera que o desafio do próximo governo “são enormes”, e começa a elencar os históricos com o preço do petróleo, que, na sua opinião, já não deve chegar aos níveis de 100 dólares. “Por isso é que Angola precisa de um programa acelerado de liberalização económica e uma melhoria significativa do ambiente de negócios que continua a ser um dos piores do mundo e isso requer um Executivo muito mais reduzido e capaz”, advertiu, o também professor das cadeiras de direito comercial internacional e de Direito de Petróleo e Gás.

ESTUDO SOBRE EMPODERAMENTO DA MULHER

O PROGRAMA VENCEDOR 

Comparativamente ao programa proposto para o período 2012/2017, o referente ao quinquénio 2017/2022 manifesta-se mais prático. Para o sector produtivo, por exemplo, a área da agro-pecuária destacam-se com o maior número de metas.

Estabilidade macroeconómica e finanças públicas

Metas macroeconómicas

Taxa de inflação média anual inferior a dois dígitos

Atingir uma taxa média anual de crescimento do PIB não inferior a 3.1%

Atingir um crescimento Médio Anual do PIB não petrolífero superior a 5%

Produção petrolífera a representar menos de 20% do PIB

Garantir cobertura de no mínimo 8 meses de importação pela Reservas Internacionais Líquidas (RIL)

Duplicar a receita tributária não petrolífera.

Comércio e Distribuição

Criar reserva estratégica alimentar (com produtos da cesta básica)

Operacionalizar pelo menos 50% dos Clod`s previstos na Rede Logística Nacional em Parceria com o sector privado

Agro-pecuária e floresta

Passar de uma produção anual de 2 milhões de toneladas de cereais (milho, massango, massambala, arroz e trigo) para 5 milhões de toneladas

Aumentar a produção das leguminosas (feijão, amendoim e soja), passando dos actuais 800 mil para 1 milhão de toneladas, criando excedentes para a reserva alimentar nacional.

Aumentar e melhorar os níveis de produção e produtividade de raízes e tubérculos (mandioca, batata rena e batata doce), passando de uma produção de 11 milhões de toneladas para 15 milhões de toneladas.

Desenvolver a pecuária e construir matadouros de abate de animais em pontos estratégicos do País de modo a criar e cobrir em cerca de 30% as necessidades domésticas de frango e ainda a cobrir em pelo menos 60% as necessidades domésticas de carne bovina, caprina, ovina e suína.

Cobrir em 80% as necessidades domésticas em ovos

Reduzir em cerca de 15% a importação de leite e expandir o seu consumo com recurso a produção interna

Pesca e recursos do Mar

Aumentar o volume de capturas de pescado de 528 mil para 614 mil toneladas/ano

Aumentar a produção de sal iodizado de 97 para 160 mil toneladas/ano

Aumentar a produção de peixe seco de 50 para 70 mil toneladas/ano

Aumentar a produção de farinha de peixe de 20 para 30 mil toneladas/ano

Indústria extractiva

Concluir o Planageo

Aumentar a produção de diamante de diamantes de 9 para 13,8 milhões de quilates/ano

Aumentar a produção de rochas ornamentais de 59.8 para 104.6 mil m3/ano

Iniciar a produção de ferro gusa, produzindo cerca de 420 mil toneladas/ano

Iniciar a produção de minério de ferro, produzindo cerca de 1.7 milhões de toneladas/ano

Iniciar a produção de ouro, produzindo cerca de 25.6 mil onças/ano

Iniciar a produção de fosfato, produzindo cerca de 1.3 milhões de toneladas/ano

Petróleo e Gás

Produzir, pelo menos, uma refinaria

Reduzir a importação de bens e serviços do sector petrolífero em pelo menos 20%

Reduzir a contratação de mão-de-obra especializada estrangeira em pelo menos 15%

Reduzir a mão-de-obra estrangeira para serviços gerais em pelo menos 40%

Garantir a inserção no sector petrolífero de pelo menos 30% de novas empresas nacionais

Indústria Transformadora

Concluir os projectos em curso de produção de fertilizantes

Concluir os projectos em curso de produção de equipamentos e ferramentas agrícolas

Aumentar a cobertura das necessidades do mercado doméstico dos seguintes produtos

Sabão de 31% para 65% Açucar de 19% para 64%

Farinha de milho de 13% para 44%

Farinha de trigo de 0% para 64%

Leite Pasteurizado de 10% para 43%

Massa alimentar de 0% para 73%

Sumos, refrigerantes e cerveja em 100%

Transformados de carne de 4% para 13%

Cimento em 100%

Varão de aço de 60 para 92%

Tubo de aço de 54% para 61%