POR CAUSA DO EXCESSO DE COBRANÇA DOS FISCAIS

Comerciantes ponderam regressar à informalidade

CONFLITO. Comerciantes acusam fiscais de extorsão. E de serem ‘atacados’ por alegados agentes do fisco. Administração Geral Tributária recomenda que se faça queixa à polícia.

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Pequenos comerciantes de vários pontos de Luanda confessam-se tentados a abandonar o circuito formal, pelo “excesso de burocracia” e pelo alegado aproveitamento de agentes da fiscalização.

Entre as queixas mais comuns, destacam-se as multas recorrentes e a exigência do pagamento de ‘gasosa’, mesmo quando se detectam “irregularidades ligeiras”.

Com uma loja de venda de recargas e telemóveis, no distrito do Ngola Kiluange, Luís de Sousa expõe a “dura realidade” com que se depara diariamente, apelando à intervenção da Administração Geral Tributária.

O comerciante acusa muitos fiscais de se aproveitarem da “ignorância jurídica” desses pequenos operadores para “simularem a aplicação de multas de modo a receberem dividendos”. As lojas, como conta, recebem, inclusive, visitas de fiscais destacados nas ruas para a expulsão de zungueiras, que exigem também a confirmação do pagamento de imposto. “E, quando se está em falta com essas obrigações, exigem ‘gasosa’”, com ameaças de pesadas multas.

Para a obtenção do recibo (que são as placas com os nomes das empresas estampadas), os proprietários pagam 17.500 kwanzas no final de cada ano à AGT. “Mas nem sempre conseguimos pagar atempadamente, dado os custos mensais com o pessoal, água e luz eléctrica, bem como os impostos”, justifica Luís de Sousa, que garante nunca ter chegado aos dois meses de mora no pagamento do recibo.

No Prenda, há dois meses, muitos estabelecimentos chegaram a ser importunados por um suposto agente da AGT, já reformado. O alegado técnico, que se fazia acompanhar de “inúmeros documentos”, forçava a cobrança de saldos. “Sob o disfarce de estar em serviço”, alternativamente, exigia, em cada três semanas, entre cinco e sete mil kwanzas das lojas que se encontravam a aguardar por licença, mas, nos últimos dias, desapareceu. “Ele percebeu que já sabemos da sua condição, por isso deixou de nos incomodar”, testemunha João Vingange, proprietário de um atelier ainda sem registo na AGT. O jovem, que vendia capas de telemóveis, baterias e outros equipamentos tecnológicos nas ruas, garante já ter formulado o pedido de licença à administração e que paga três mil kwanzas por mês pela autorização da actividade precária.

À semelhança de outros, Danilo Afonso, dono de um estabelecimento comercial de bebidas, no Cazenga, manifesta-se “arrependido” por ter optado pela formalização do negócio. Aos 37 anos, constituiu a empresa com um capital de 500 mil kwanzas, mas garante ter “imensas saudades” do tempo em que comercializava os produtos sem pagar imposto, limitando-se a dar uma taxa de 15 mil kwanzas por trimestre a um agente fiscal para o proteger. “Registei a empresa e deixei de pagar o fiscal, mas o que achei ser melhor revela-se o contrário. O problema é que há muitos fiscais, não se sabe quem é quem, e o caricato é que parecem alegrar-se com as nossas falhas”, lamenta Danilo Afonso, sublinhando que tem pensado “seriamente” em desistir do circuito formal.

Ao VALOR, Leonor Miguel, directora do gabinete de comunicação institucional da AGT, esclarece ser da competência exclusiva da instituição a cobrança do imposto e aconselha os proprietários das lojas a exigirem o passe de serviço, sempre que pessoas, uniformizadas ou não, se identifiquem como fiscais. “Se os fiscais, destinados a expulsar vendedoras das ruas, vão às lojas cobrar impostos, isso é um caso de polícia. Os proprietários devem apresentar queixa”, recomenda.

Além de levarem a que pequenos empresários ponderem regressar à informalidade, a burocracia e o aproveitamento dos fiscais também servem para inibir quem está no mercado informal. Ou seja, muitos preferem manter-se na pesada estatística de 70% do mercado a enfrentar “muito trabalho para legalizar” os respectivos negócios.