Comerciantes temem encerramento definitivo do Xikila Money
NEGÓCIOS. Comerciantes com conta no Xikila Money são obrigados a carregar o dinheiro das vendas para casa. E têm esperança que haja um recuo. Trabalhadores do Banco Postal vêem os planos gorados.
Vendedores das zonas do São Paulo e Hoji Ya Henda, em Luanda, com conta nos quiosques Xikila Money, do Banco Postal, temem que a medida que levou à cassação da licença daquela entidade financeira seja definitiva, apesar da esperada contestação dos accionistas na justiça.
De qualquer forma, enquanto o processo formalmente não termina, os clientes do Xikila Money viram-se obrigados a adoptar a solução anterior que passa por levar o dinheiro a casa, correndo “sérios riscos”. Ao mesmo tempo vão alimentando a esperança de que o banco volte a operar, face às conversas que têm tido com alguns trabalhadores do Xikila.
Ao VALOR, Gonçalo da Silva Leitão, director de comunicação e imagem do Banco Postal, confirma haver uma ‘maratona’ negocial entre os accionistas da entidade e o Banco Nacional de Angola (BNA), sublinhando a “necessidade de uma solução” que não passe pelos tribunais.
Mesmo com o Xikila Money encerrado há mês e meio, muitos comerciantes recusam-se a vincular-se a outros bancos, por causa de alegadas “complexidades” na hora do levantamento, bem como das taxas exigidas para a abertura de uma conta, que, de um modo geral, ultrapassam os nove mil kwanzas. Já no Xikila, a abertura de conta era a partir de 100 kwanzas.
Francisco Neto, vendedor de cigarros e pacotes de uísque, pondera abrir uma conta no Banco Sol, onde a taxa mínima para a abertura é de dez mil kwanzas. No entanto, não esquece a facilidade com que manuseava a conta no Xikila Money. “O Xikila ajudou-me bastante. Depositava mil kwanzas por dia. Até é possível fazer o mesmo noutro banco, mas quem é que vai todos os dias a uma grande estrutura bancária para depositar apenas mil kwanzas? O Xikila era mesmo para a classe baixa, no qual estou incluído”, explica Francisco Neto, para quem o BNA devia dar mais tempo ao banco para que pudesse cumprir com as exigências.
O comerciante, à semelhança de outros, vê-se agora obrigado a carregar para casa o dinheiro conseguido diariamente. Com o Xikila, passou a “poupar mais”. No encerramento do banco, tinha 25 mil kwanzas na conta.
Diferente de Francisco Neto, Adriano Ndombe Catraio, vendedor de saldos de telemóveis e de televisão, alimenta a esperança de o Xikila, voltar a operar e recusa-se a abrir conta em outro banco. E justifica-se não só com as taxas da abertura, mas também com o valor facial das notas disponíveis nos ATM. “Abri a minha conta no Xikila Money com apenas 400 kwanzas e podia levantar apenas o que precisava. Ou seja, se precisasse de 200 ou 700 kwanzas, poderia levantar, mas nos multicaixas, não é possível. Além disso, o Xikila tinha controlo electrónico dos clientes, daí que não exigia muitos documentos e tinha quiosques muito próximos do cidadão. Era muito bom”.
Também Tânia de Abreu, vendedora de chinelas no São Paulo, sente-se desprovida de capacidade financeira para ter uma conta noutro banco. E manifesta-se expectante pela reabertura do Banco Postal. “Um trabalhador do Xikila disse-nos que tem havido negociação com as autoridades para que o banco volte a funcionar. Estamos à espera”, refere. A jovem, que arrecada, em média, sete mil kwanzas diários, lamenta ter de levar o dinheiro para casa, face à “crescente” onda de assaltos na zona.
Sonhos quebrados
Assim como a ordem de encerramento do Banco Postal afectou negativamente os clientes, os trabalhadores, que aguardam em casa por um esclarecimento sobre o futuro profissional, consideram que a decisão do BNA “deitou abaixo” os planos para 2019. E temem que as autoridades decidam pelo encerramento em definitivo da entidade.
Emiliane Bartolomeu, assistente comercial, após ter recebido o salário de Janeiro, ficou apenas a saber que o banco está sob responsabilidade do BNA. A jovem espera que as autoridades recuem. “Face aos preços dos produtos, estar desempregada seria um desastre para mim e para a minha família”, considera a jovem, que já tinha feito muitos planos.
Estudante do curso de secretariado e comunicação empresarial, na Universidade Agostinho Neto, apontou, como meta para este ano, a conclusão de monografia, pela qual previa desembolsar 100 mil kwanzas a um tutor. Além de mensalmente dar uma ajuda financeira à progenitora, é responsável pela formação académica de um irmão menor, cuja propina é de 25 mil kwanzas. “Soubemos do encerramento do banco apenas pela televisão, aquilo foi um choque muito grande, nem quisemos acreditar”, conta a jovem, confessando não saber o que fazer face à nova realidade, dado que vive numa casa arrendada na Nova Marginal, com uma renda de 40 mil kwanzas. Desesperada, apela ao Estado para que encontre uma solução negociada que não seja o encerramento do banco.
Embora também preocupado com o futuro, Cristóvão Vicente manifesta-se menos aflito. Fez uma poupança que lhe pode suportar uns cinco meses, além de ter a esposa a trabalhar. “Diferente de outros, consigo parcialmente safar-me por ter a esposa empregada. Tenho colegas que eram os únicos a trabalhar na família. Se a decisão do BNA se mantiver, sofrerão bastante”, alerta.
Formado em contabilidade e auditoria, ambicionava, para este ano, melhorar o curriculo, concorrendo para uma das vagas de gerente, subgerente, tesoureiro ou de supervisor, dado qeu era política da instituição submeter os trabalhadores com um ano de serviço a um teste para a ascensão.
No seu balcão, Cristóvão Vicente destaca histórias de sucesso. Uma delas com duas vendedoras: uma de gelo e outra de bolas de Berlim. As duas abriram contas com apenas 300 kwanzas e faziam um depósito de mil kwanzas diários, nos quiosques Xikila. Conseguiram comprar uns carrinhos, com os quais realizam as vendas e contrataram mais colaboradores.
Esperança Tomás, também assistente do Xikila durante dois anos, já tinha projectos para este ano. Com um salário de 85 mil kwanzas, agendou comprar um terreno para a realização do sonho da casa própria e ambicionava, face à “pouca poupança”, ingressar na universidade (cursar gestão bancária), já que tem apenas concluído o ensino médio. Além de pretender, também, inscrever-se numa escola de condução.
A jovem, solteira, com uma filha de 13 anos, paga a propina escolar, que inclui transporte, a 24 mil kwanzas. “De facto, não sei o que fazer da minha vida”, lamenta.
Performance do Xikila Money
O Banco Postal foi criado em Setembro de 2016, mas só em Março do ano seguinte começou a operar, com o lançamento do Xikila Money, com 395 colaboradores. Até ao decreto que levou ao encerramento do banco, a unidade controlava mais de 320 mil clientes, abrindo em média 800 contas por dia. E estava presente em 1.250 estabelecimentos comerciais com a rede ‘Paga aqui’.
O BNA decretou a falência e revogou a licença do Banco Postal, por incumprimento do Aviso nº 2/2018, no qual o regulador exige um aumento de capital mínimo dos 2,5 mil milhões para 7,5 mil milhões de kwanzas, até 31 de Dezembro. Inconformada, a direcção do banco recordou, socorrendo-se da lei de base das instituições financeiras, que a medida só seria possível caso se realizasse um esforço de “adopção de providências extraordinárias de recuperação da sociedade e tal não produzisse resultados”.
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