Como ajudar a sua indústria a sobreviver à covid
Os conselhos de gestão universais são bons, mas os de angolanos para angolanos podem ser melhores no que toca a navegar a crise em contexto nacional. Com a perspectiva de quem está no terreno há três décadas, em diferentes sectores, a gerir as características próprias do mercado, contexto, mão-de-obra e relações institucionais locais, aqui ficam passos essenciais para reestruturar a sua empresa ou indústria, e, sobreviver a mais esta crise em que a gestão corrente das empresas está seriamente condicionada.
1. Reestruturação financeira e operacional
É preciso cortar custos e isso exige o exercício do levantamento de dados de cada actividade para análise com caracter de urgência dos ajustes possíveis porque uma crise causa em primeira instância perda de poder de compra e com isso, quebra nas vendas.
Considere que visitas a unidades fabris e empresas fora da capital carecem de autorizações especiais para trânsito interprovincial e maximize as comunicações com os responsáveis das diferentes unidades via online ou telefónica (tenha paciência para aguentar os cortes e interrupções nas linhas) para se manter a par das actividades e dificuldades em tempo útil.
Enfrente a realidade e seja rápido a implementar cortes de produção e respectivos ajustes do quadro de pessoal à produção reduzida. A proibição de despedir acumula passivo para as empresas que têm de continuar a acumular encargos, por isso tenha em conta a legislação de excepção para despedimentos do actual momento, empresa que não vende não pode pagar salários, seja pragmático.
Procure formas de injectar capital nas empresas ou indústrias que tem de salvar. Analise aumentos com recurso a autofinanciamento e parcerias com outros empresários.
2. Reestruturaçãode dívidas
Com as instituições a retraírem a cedência de crédito (que já era muito reduzida) e com o cash flow da sua empresa comprometido, é preciso procurar renegociar dívidas com credores é manter o contacto é essencial. As dívidas à banca devem ser renegociadas idealmente para um período de 5 anos que permita ultrapassar a fase de incerteza causada pela crise e pela pandemia.
Por outro lado, para muitas empresas que fornecem ao Estado é preciso fazer o exercício de pressionar para recebimento das dívidas sem recurso a títulos, que não sendo indexados perdem valor diariamente devido à desvalorização da moeda.
Tanto junto do Estado para recebimento de valores devidos, nesta fase em que as empresas precisam de cash flow para sobreviverem, e mais as indústrias, bem como para intervenção em bloco para renegociação de dívidas de indústrias produtivas junto das instituições financeiras, seria instrumental a acção intensiva e concertada das associações de empresários e industriais.
A união dos empresários que produzem a uma só voz, nesta fase, é vital para advogar a sobrevivência das empresas junto da banca e das instituições públicas.
3. Reestruturação da cadeia logística e de produção
Este ponto vital implica a reavaliação de cadeias de fornecedores, transportes, alfândegas, armazéns e distribuição, porque a pandemia afectou todos os sectores e há fornecedores que perderam a capacidade ou fecharam e há outros a praticar novos preços, mudanças que exigem adaptações rápidas particularmente no nosso contexto em que a matéria prima é frequentemente importada. As mesmas convulsões são visíveis na distribuição com lojas e mercados a fecharem portas e as medidas do estado de calamidade a reduzirem os horários, e com isso o volume de vendas.
Tenha uma equipa dinâmica para acompanhar estes desenvolvimentos. No âmbito da cadeia logística é preciso maior e mais rápido acompanhamento dos processos de franqueamento, licenciamento, cartas de porte e transferências de modo a não comprometer cumprimentos de contratos que podem ser honerosos, ou relações com fornecedores e clientes vitais para a sua empresa.
Recentemente uma transferência internacional para pagamento a um fornecedor, depois de duas semanas em processamento, obrigou a um depósito extra (com um prejuízo de 10 mil USD) para compensar a desvalorização monetária desse período. Há intervenientes que não dependem da sua acção mas garanta que a sua parte no processo de licenciamento decorre com a maior celeridade possível para não perder tanto dinheiro.
Felizmente os prazos de caducidade do nosso produto mais perecível, o óleo, são longos, no entanto para indústrias voltadas para perecíveis com curto prazo de validade, como lacticínios, a gestão de stocks tem de ser bem mais vigiada porque as quebras de poder de compra e os entraves às vendas vão traduzir-se em desperdícios acima dos 10% que minam a viabilidade da empresa. Mais uma vez é preciso acompanhar a par e passo as vendas e adequar os níveis de produção ao que consegue escoar.
4. Adaptar produção para o que vende agora
O que tiver de parar por não ter saída ou estar interdito pelas normas, que pare, mas procure adaptar o seu negócio ao que vende agora, faça a leitura de mercado e volte-se para os produtos de maior utilidade. Uma das fábricas nos planos do grupo subiu na escala de prioridades porque vai produzir luvas. No entanto, “a fome tem a idade do homem” por isso comida vai sempre vender ainda que em quantidades mais repartidas e preços mais baixos, à medida que a classe média se torna pobre e a pobre se torna miserável, há que gerir a realidade da perda generalizada do poder de compra dos angolanos. Medicamentos e produtos hospitalares são outras áreas que vale a pena estudar possibilidades de intervenção nesta fase, se for possível adaptar os canais de fornecimento ou produção da sua empresa.
No entanto, no que toca ao sector industrial as possibilidades de adaptação são limitadas ao equipamento existente. É preciso lembrar que qualquer alteração, qualquer peça ou componente novo pode significar custos elevadíssimos (nesta altura muito difíceis de financiar) e tempo de paralisação à espera de peças ou novas máquinas. Uma fábrica que faz pão por exemplo, não passa do dia para a noite a poder fazer pão com farinha de mandioca porque as máquinas não estão preparadas para isso.
5. Reavaliar necessidades do pessoal essencial
Apesar de nas indústrias a redução de pessoal ser quase impossível porque estão normalmente optimizadas de acordo com as necessidades de operação e controle do equipamento, a implementação das normas para combate à Covid-19 implica por exemplo que mães com filhos pequenos e pessoas de risco permaneçam em casa, o que significa que terá menos pessoal disponível e redução de horários em muitos casos. Reavalie as disponibilidades e necessidades de staff tendo em conta as normas.
Quesitos como transportes, podem estar dificultados pelas restrições do actual estado de calamidade, permita maior flexibilidade e compreensão caso a caso dos constrangimentos do dia-a-dia que aumentam substancialmente, sem deixar ferir a cultura de pontualidade da empresa. Promova formação no uso dos materiais de biossegurança no espaço de trabalho.
6. Evite o pânico
l No que toca à indústria, que no nosso país é um sector com muito por onde crescer e vital para o emprego, lembre-se que uma paralisação fabril é onerosa porque tem de pagar salários dos funcionários a manter ou indemnizações em caso de despedimento e que os equipamentos se deterioram rapidamente sem utilização e manutenção atempada, tudo factores que tornam muito difíceis e caras as reactivações. Paralisação é um último recurso.
Manter o foco, aumentar o comprometimento e a atitude empreendedora é decisivo nesta fase para manter o discernimento e tomar decisões informadas e de cabeça fria.
Estão muitos empresários a vender ao desbarato empresas que levaram anos a construir porque esta crise, sobreposta à crise séria que já se vivia, levou muitos ao desespero absoluto. É preciso lembrar que as crises são passageiras e que também trazem oportunidades, arregace as mangas e, ao trabalho.
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