EUCLIDES DA LOMBA, COMPOSITOR E DIRECTOR DA CULTURA EM CABINDA

“Devia haver uma redução de impostos”

MÚSICA. Com muitos sucessos, mas poucas vezes visto em palco, Euclides da Lomba está prestes a lançar o 5.º álbum. Lamenta as dificuldades encontradas na música, quer ver reconhecido quem tenha mérito e, por isso, defende mais apoios na cultura como, por exemplo, a redução de impostos.

As suas músicas contam histórias verídicas ou imaginárias?

Todas são verídicas. Quando as coisas são reais temos de encontrar uma linguagem. No entanto, muita gente que tem passado por muitas situações, revê-se naquilo que faço. É muito bom sentir que se consegue traduzir, em música, o que muita gente sente e pensa. A música é a maior dádiva que recebi. A maneira como sou abordado, até parece que lancei os discos hoje. Sou muito acarinhado.

Os artistas estão mais preocupados com o imediatismo?

A música é como uma profissão qualquer, quanto mais preparado se estiver, melhor se executa. É uma ciência que requer atenção, embora se consiga rapidamente alguma notoriedade. É uma faca de dois gumes. Nos músicos novos, o que mais me surpreende é a capacidade interpretativa, quase todos têm excelentes condições de interpretação. Mas a composição começa a pesar, porque tem de se ter informação. A música não deixa de ser uma forma de expressão. Mesmo na linguagem comum, se se fala com alguém pouco letrado, dá-se conta.

É solicitado por jovens?

Respeitam-me muito, mas o próprio ambiente já não é como nos anos 1990. Prefiro ser uma pessoa normal e natural e que qualquer um possa olhar para mim e pensar que pode fazer o que estou a fazer, porque, muitas vezes, pensamos que somos muito artistas e ‘estrelas’ e esquecemo-nos de que somos seres humanos.

Sente-se reconhecido?

Falta alguma coisa. Hoje já não devia ter dificuldades em fazer o meu trabalho. Às vezes, quero ter apenas a possibilidade de trabalhar e viver dignamente. Já não procuro muita coisa. Já estamos a meio do ano e só foram lançados cinco discos. Devíamos ver de que maneira a arte não pudesse ser prejudicada por qualquer motivo. E também que se pensasse na redução dos impostos. Talvez os CD seriam mais baratos. A cultura, no seu todo, devia pensar nisso. Ninguém sozinho consegue gravar um CD. Quando as pessoas têm mérito devem ser reconhecidas.

Quando é que abre a escola de música?

Já está feita a estrutura, falta apenas a materialização. Tem de se contratar força estrangeira. Do levantamento feito, temos de ter pelo menos 150 mil dólares, para poder pôr em andamento a escola. Mas já há instrumentos comprados e contactos com Pedro Fançony que comanda a Orquestra Kapossoka.

Em termos culturais, como está Cabinda?

Em tudo o que é o básico, estamos bem, mas temos dificuldades. Cabinda não tem o número de produtores de Luanda, o governo tem de assumir grande parte das despesas. Mas é muito pequena perante o rol de necessidades e tem pequenos produtores de eventos, mas não da dimensão de Luanda. Estamos a fazer o nosso trabalho, uma espécie de levantamentos e de estudos. Os quadros da cultura não são especialistas na área, entram por concurso público, quando a cultura exige especificidade. Temos casas de cultura em quase todos os municípios.

Se não fosse director da cultura, o dinheiro da música daria para sobreviver?

Não chega! Não vivo da música praticamente. Dá-me notoriedade, mas ainda não me deu o conforto para viver. Recebo críticas de que me meti na política, mas digo que tenho de sustentar a minha família, mas grande parte das coisas que tenho é graças à música, como as casas e o carro. Sá aceitei o cargo, porque já tenho idade, experiência e formação para isso. Mas há coisas que nos ultrapassam, como custos, pagar despachantes, desalfandegar já tem que ver com as finanças e ministros de tutela.

A música angolana está no bom caminho?

Está, mas podia estar melhor. A música angolana, nos anos 1950 e 1960, estava à mesma altura das latino-americanas, em que tudo se executava era ‘ao vivo’. Esse virtuosismo dos instrumentistas acabou por desaparecer. Hoje é difícil ver ‘shows’ ao vivo, salvo alguns artistas que levam banda própria. As bandas acompanhantes estão a desaparecer. Houve um retrocesso.

É muito exigente na contratação?

Não, mas não aceito todos os convites. Isso também tem que ver com as condições, muitas vezes, oferecidas. Já actuei em mais de 230 casamentos grátis, caso o convite coincida com a minha presença não paga nada, mas se estiver em Cabinda têm de se acertar alguns detalhes.

Aceita actuar em ‘playback’?

Não consigo. Quando sou confrontado com isso fico desapontado. Salvo para a televisão. Começamos a preocupar-nos pouco com o trabalho vocal. Há artistas que não conseguem fazer ‘shows’ ao vivo. Quando vão às províncias então!!!

É natural de Cabinda, mas só tem uma canção em fiote?

Porquê? Porque prefiro ser artista e deixar a parte tradicional para quem o faz na perfeição. Também falo muito mal o fiote.

 

PERFIL

Nome: Euclides Barros da Lomba

Naturalidade: Cabinda

Formação: Licenciado em ?Educação Musical

Álbum: ‘Livre serás’, ‘Desejo Malandro’, ‘Recado Num Semba’ e ‘3 em 1, grandes sucessos’.