Visando ‘travar’ a subida exponencial nos preços de produtos da cesta básica

Economistas propõem anulação do IEC e revisão do IVA nos 10%

POLÍTICA.  Economistas escusam-se a censurar empresários por causa do aumento ‘vertiginoso’ nos preços dos produtos que compõem a cesta básica, sublinhando que o fenómeno resulta  dos custos de produção, falta de divisas e a quase inexistente produção interna. Entretanto, apelam ao Governo o cumprimento da orientação da Reserva Federal dos Estados Unidos da América, afastando pessoas politicamente expostas do controlo de bancos.

Economistas propõem anulação do IEC e revisão do IVA nos 10%
D.R

A anulação do Imposto Especial de Consumo (IEC) e a redução para 10% do IVA seriam duas decisões que ajudariam a estancar a tendência crescente dos preços, na opinião de alguns economistas abordados pelo VALOR a propósito da elevada inflação.  

Antes da entrada do IVA, o Governo negava a possibilidade de o imposto precipitar o aumento dos preços dos produtos da cesta básica, considerando a isenção a que esses produtos estão sujeitos. Mas, na prática, os preços aumentaram em flecha tão logo o IVA se tornou uma realidade.  Por exemplo, antes do dia 1 de Outubro, o quilo de arroz da marca ‘Grão Chefe’, que normalmente tem sido o menos oneroso, nos diferentes híper e supermercados, custava, em média, 200 kwanzas. Depois da entrada do IVA, passaram a registar-se subidas graduais. Até há uma semana, o quilo estava  a custar 499 kwanzas, um aumento de 150%.

Um litro de óleo vegetal ‘Master Chefe’, que custava pouco menos de 800 kwanzas, passou a custar 1.006 kwanzas. E uma caixa de coxa de frango da marca Usa de 10 kg, geralmente muito procurada entre as famílias de renda média e que entre Julho e Agosto custava 4.800 e 5.200 kwanzas, está a ser comercializada a 11.000 e 12.000 kwanzas, no mercado formal. No informal, a subida é maior. Como solução para este fenómeno, o economista Celso Sorte, formado pela Universidade Agostinho Neto, sugere a redução da taxa do IVA e do imposto industrial para 27 ou 25%, bem como a anulação “imediata” do IEC. 

Celso Sorte sublinha que o país não está preparado para aplicar os impostos que têm sido aprovados e apela ao Governo, ao invés de procurar introduzir “mais impostos”, a focar-se no melhoramento das vias para facilitar o escoamento da produção local, melhorar o fornecimento de energia eléctrica para os empresários, bem como de água, e cumprir com a orientação norte-americana de afastar dos bancos as pessoas politicamente expostas (PEPs, acrónimo inglês). “A economia não se faz só com a economia em si. Faz-se também com bom ambiente político, e essa situação de pessoas politicamente expostas, embora política, tem tido um impacto negativo na nossa economia, porque está a servir de condição para que voltemos a ter divisas, que são itens importantes para melhorar o mercado”, observa Celso Sorte, sublinhando que os empresários vão continuar a imputar o peso das suas despesas ao consumidor, a menos que o Governo desagrave o mercado.

No mesmo diapasão, o economista Pedro de Oliveira prevê que os preços vão continuar a aumentar, acreditando mesmo que a inspecção que o Governo está a fazer junto dos supermercados “não surtirá os efeitos desejados”, já que os empresários não estão a subir os preços “por má fé, mas por necessidade de manterem o negócio”. 

Pedro de Oliveira, que, à semelhança de Celso Sorte, defende a anulação do IEC e a redução do IVA, apela à justiça na inspecção governamental, para impedir a falência de mais empresários. “O Governo é o responsável pelo que estamos a viver, por ser ele quem traça as políticas. Até aqui, não melhora as estradas para atrair os homens de negócio à agricultura, vem aumentando os custos dos grandes e pequenos empresários, portanto a equipa económica deve reflectir sobre o que quer e o que está a fazer”, exige o economista.

Governo “incapaz”

O professor e director do Instituto Superior de Ciências da Administração e Humanas, Sapalo António, considera, por sua vez, que a subida vertigionsa dos produtos da cesta básica resulta da “recessão que decorre das políticas económicas falhadas” adoptadas pelo Governo. 

“O Governo não está a ser capaz, tanto na tomada como na prática de política de medidas económicas. Falhou quer nas medidas tributárias quer nas medidas fiscais. Ao aumentar e diversificar os impostos, o Governo limitou e enfraqueceu e até excluiu muitas empresas da actividade económica, o que tem enfraquecido a já pouca produção de bens e serviços locais”, repara o também ex-deputado da Assembleia Nacional, pela bancada do PRS.

Na perspectiva de Sapalo António, além de diminuir as taxas dos impostos, Angola “deve tudo fazer” para conquistar a credibilidade junto das instituições financeiras norte-americanas, bem como cumprir, com “urgência”, a orientação expressa que a Reserva Federal dos Estados Unidos da América deu à equipa do Presidente da República, que visa afastar as PEP do controlo de bancos comerciais, para acabar com as restrições do dólar no país.

Especulação e açambarcamento influenciam  em 22% 

O Ministério das Finanças (Minfin) entende que a subida que se tem registado nos preços dos produtos da cesta básica resulta de uma combinação de factores, destacando o “açambarcamento e  a cobrança indevida” do IVA que terá influenciado em cerca 22,34% o aumento.  

Em resposta ao VALOR, o órgão acredita haver muitos empresários a aumentarem os preços, calculando uma “maior queda do kwanza face ao dólar no futuro” e, para compensar a suposta “desvalorização futura”, de forma antecipada, vão “praticando preços altos”. Há ainda, segundo o Minfin, empresários que alargaram os preços “com o pretexto da obrigação da liquidação do IVA”.

Para lá da cobrança indevida do novo imposto e da desvalorização, o Minfin aponta outros factores que têm concorrido para o aumento dos preços, como a especulação, a redução da oferta destes bens, causada pelo aumento dos custos de produção, importação, distribuição e comercialização, bem como as “conhecidas dificuldades de escoamento dos produtos de origem nacional”, entre outros.

Por ser uma problemática quase que constante no país, o Minfin garante que tem realizado estudos censitários para, entre outras, apurar as “reais razões”. O órgão refere que, entre Outubro de 2018 e Outubro deste ano, realizou um estudo, no qual explica que o preço dos produtos da cesta básica nos grossistas, a nível de Luanda, teve uma variação média positiva de 50%.