EMÍDIO FERNANDO, O ADEUS AO PATRIOTA

23 Oct. 2024 Editorial

Este é o texto que não devia estar aqui. Que não devia ser escrito. Não hoje. Não amanhã. Não nas próximas décadas. A morte é uma inevitabilidade. É uma fatalidade. Sabemo-lo. Assim como sabemos que jamais estaremos preparados para ver partir um dos nossos. Para dizer adeus ao Emídio Fernando.

EMÍDIO FERNANDO, O ADEUS AO PATRIOTA

As circunstâncias não importam. Não nos servem de consolo. Foste cedo
demais, Emídio! Demasiado jovem! Tinhas muito por fazer. Tinhas tudo para
dar.

O Nova Gazeta, o jornal-mãe da GEM Angola Global Media e que saiu de
circulação em 2018, continua a aguardar para ser ressuscitado. Não sabemos
quando e se conseguiremos fazê-lo. Até aqui seguíamos apenas com a
certeza de que, quando e se se colocasse a oportunidade, serias tu a trazê-lo
de volta. A comandá-lo. Tal como o fizeste ao longo dos sete anos em que
100 mil exemplares do jornal circulavam, todas as semanas, pelas 18 cidades-
capitais e por algumas vilas angolanas.
O Valor Económico, este jornal que persiste contra todas as lutas e
vontades de muitos, vai sentir a falta dos teus alertas de última hora. Do teu
olhar crítico de editor-informal. “Este título eu faria assim, Mulaza”, “Atenção
que já enviei a entrevista editada ao César”, “Esta página tem biliões repetidos
ao lado do que a Geralda assinalou”, “Visita do Biden (se ele souber para
onde vai) está marcada para 13 a 15 de Outubro”. Este eras tu. Não
quebravas. Nem em muitos dos dias terríveis em que as dores da maldita
doença deviam apenas deixar-te na cama. Simplesmente não te permitias
ficar quieto, salvo nas horas absolutamente impossíveis. É disto e muito mais
que fica privado o Valor Económico.
A Rádio Essencial, o teu sonho da TSF angolana, levará tempo para saber
e aprender como viver sem ti. Não é um tempo estimável. Não saberíamos
como fazê-lo. Mas tu foste mais do que tudo isto. Para a família GEM Angola
Global Media, em boa verdade, não há palavras que te façam justiça. E sabes
bem o quanto isto não é um cliché. É apenas uma chata coincidência que esta
tentativa de resumir a tua grandeza ganhe corpo num lugar-comum. Dizemo-
lo nós e dizem-no as dezenas dos nossos jovens que formaste ao longo dos
anos em Angola. Falamos de todos. Dos que persistem na GEM e dos que
decidiram abraçar outros rumos na vida. Mas também dos que formaste em
todos os lugares por onde passaste nesta tua Angola que amaste
devotamente como poucos.
Se há, aliás, uma forma de fazer justiça ao conjunto da tua obra é tratar-te
pelos nomes certos. É lembrarmos que Angola não apenas ficou privada de
um dos seus jornalistas mais bem preparados de todos os tempos, como ficou
desapossada de um ilustre patriota. Sim, de um grande patriota. Sobre a
forma como materializaste o teu amor por Angola, enquanto brilhavas em
Portugal, deixaremos que sejam os outros a escrever de próprio punho. Os
que beneficiaram no osso e na pele da tua infinita generosidade. Os que te
ouviram a defender intransigentemente o teu país nas conferências e

seminários acadêmicos e nas tertúlias de profissionais, durante anos a fio.
Quanto a nós, podes ter uma certeza. Partiste do lado certo da História.
Resta-nos dizer-te tudo o que não dissemos, mas, sobretudo, obrigado. Muito
obrigado, Emídio! Fica a promessa de fazermos o que estiver ao nosso
alcance para honrar o teu legado. Descansa em paz, companheiro.

 

Autor: Evaristo Mulaza