“Malanje só tem dois municípios com energia eléctrica”
A província já recebeu mais energia, mas falta capacidade para expandir a rede eléctrica. Primeiro, para o resto da capital, depois para os outros municípios. Em entrevista ao VALOR, o vice-governador de Malanje para o sector político, económico e social destapa os grandes desafios pela frente, num ano em que o governo local viu o orçamento reduzido em cerca de 30%.
Entre 2 e 5 de Maio, decorre a ‘Expo-Malanje’, a primeira que a província realiza e onde se prevê a abertura do ‘Salão da Mandioca’. O que o governo provincial pretende com este evento?
O governo pretende estimular o desenvolvimento económico da província, promovendo a sua capacidade produtiva real e potencial. Pretendemos atrair novos parceiros e investidores e a consequente criação de novas indústrias.
E por que a aposta na divulgação só da mandioca, quando se sabe que a província até possui outras potencialiadades agrícolas?
A mandioca merece destaque por ser considerada o alimento do século XXI pelo Fundo das Nações Unidas para a Alimentação e porque a província vai receber, muito em breve, o Centro de Investigação Regional da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC) da mandioca. Malanje está bem em termos de produção da mandioca, embora haja algumas pragas que a apodrecem. Mas também este problema será ultrapassado em breve. Temos em curso um programa de reconversão parietal da mandioca que vai permitir a substituição das variantes de mandioca mais propensas em doença por variantes mais resistentes.
Atrair novos investidores implica ter também infra-estruturas. Malanje, por exemplo, regista um grande défice no fornecimento de energia eléctrica. Como o governo local tem estado a tratar disso?
A cidade de Malanje já recebe mais energia eléctrica, mas ainda assim há outro problema relacionado com os investimentos necessários para estender a rede eléctrica a toda a cidade. A província só tem dois municípios cobertos com energia eléctrica: Malanje e Cacuso. Portanto, é um grande desafio. A feira é de facto também um canal de promoção de investimentos. Mas a qualquer momento estes investidores podem deparar-se com o problema da falta de energia. Por isso é que uma das prioridades é levar a energia para o Pólo Industrial de Malanje, que fica a cerca de 20 quilómetros a leste da cidade de Malanje.
Qual é o nível de desenvolvimento deste pólo industrial?
É um pólo que está sob a supervisão do Ministério da Indústria, mas pelo facto de estar instalado na nossa província é do interesse do governo da província que o pólo funcione bem e que possa ser um ponto de atracção de mais investimentos. Então, a nossa luta é que esse pólo seja infra-estruturado e que haja lá acesso à energia eléctrica e à água.
Já há investidores a mostrarem interesse em instalar-se nesse pólo?
Sim! Por exemplo, há uma fábrica de transformação de madeira, muito moderna, que muito em breve será instalada neste pólo.
Além da energia eléctrica, quais são as outras prioridades?
A energia eléctrica, água, saúde e as estradas. São estas as áreas que constituem os principais desafios do actual governo da província. No sector da água, apesar de termos registado alguns avanços, ainda não conseguimos cobrir toda a província. A cobertura para o meio rural anda à volta dos 61% e na cidade de Malanje à volta de 42%, em termos de fornecimento de água potável. Para a cidade de Malanje, estão previstos vários projectos, sendo o de maior importância o de uma nova captação de água a partir do rio Cuiji. É já um projecto em curso e está inserido na linha de crédito da China e a previsão é que esteja concluído o mais tardar em 2021. Por outro lado, Malanje vive algum desequilíbrio demográfico. Isto também tem os seus prós e contras. Aprovíncia está com cerca de 1,108 milhões de habitantes e mais da metade reside na cidade, o que também exerce uma grande pressão sobre a governação e uma grande dispersão da população pelo resto da província.
Em relação às estradas, o Governo central anunciou recentemente a reabertura de alguns troços. Por exemplo, os troços Lucala/Cacuso e Malanje ao longo da estrada nacional 230…
Sim! Mas ainda existem alguns problemas no troço N’dalatando/Maria Teresa que precisa de reabilitação. E depois, no interior da província, temos as vias secundárias e terciárias, que constituem outro grande desafio para a ligação dos municípios e comunas. Temos ainda muitas estradas secundárias e terciárias para reparar. Mas continuamos a trabalhar. Por exemplo, no interior da província, está em reabilitação um grande eixo que sai de Malanje para o sul da província, que liga Malanje à chamada zona Songo. Recentemente, foi inaugurado também um grande troço. É um troço que vai ligar Malanje ao município do Quirima, no sul de Angola, que faz fronteira com o Bié.
Que outros troços estão a ser reabilitados?
Temos também outro troço que vai de Malanje a Marimba, até à RDC. Também temos a extensão da linha que vai até ao Kwanza-Sul, via Mussende. Aí, a estrada foi reabilitada até à fronteira com o Kwanza-Sul. É um eixo importante, porque permite ligar directamente o norte ao centro sul. Portanto, a partir de Malanje, é possível chegar ao Bié e ao Huambo muito rapidamente, do que a partir do centro sul, no Wacu-Kungo.
O acesso a Malanje é feito sobretudo por via rodoviária. É isso o que levou a Sonair a desistir de voar para a província?
É preciso dizer que fomos nós (governo de Malanje) que atraímos a Sonair a voar para Malanje, num período crítico, em termos de acesso à província por via rodoviária. E eles atenderam ao nosso pedido. Até porque, do ponto de vista comercial, era muito atractivo. As pessoas viajavam muito mais de avião. Mas, com uma grande extensão de estrada já reparada, há menos gente a utilizar o avião para viajar para Malanje. Hoje, por estrada, leva-se cerca de quatro horas (de Luanda) quando, há dois anos, se fazia cerca de sete horas. Talvez tenha sido isso o que levou a Sonair a desistir.
Mas nem toda a gente está diposta a viajar de carro. Já houve alguma outra companhia aérea a mostrar interesse?
Certo! É sempre bom termos uma frequência aérea, porque nem toda a agente está disponível para viajar por terra. A Sonair tem a sua política comercial e os seus interesses, de modo que é uma decisão comercial e soberana da empresa na qual não podemos interferir. Mas há outros interessados, como por exemplo, a empresa Air Jet, em cobrir este destino.
O caminhos-de-ferro não está a funcionar em pleno?
Não, funciona com algumas dificuldades. O troço Dondo-Malanje está parado. Houve um desabamento numa das passagens hidráulicas que está a condicionar o tráfico ferroviário entre o Dondo e Malanje. Mas esperemos que se repare em breve. O importante é que o transporte de grande parte das cargas entre Luanda e Malanje e vice-versa, mesmo os combustíveis e produtos agrícolas, já se faz via ferroviária. De facto, a linha férrea é muito importante para Malanje, porque transporta grandes cargas, principalmente a questão dos combustíveis. Mas a linha tem problemas estruturais e precisa de ser melhorada.
O orçamento previsto para Malanje, este ano, sofreu um corte de 30%, na ordem dos 15 mil milhões de kwanzas. Isto complica, seguramente, a gestão orçamental dos programas já previstos. Como o governo se ajustou?
É preciso dizer que não foi só Malanje que sofreu corte no orçamento. Foi uma decisão da Assembleia Nacional em reduzir os orçamentos em 30% para todas as províncias. E todas as unidades orçamentadas vão ser afectadas nessa magnitude. Agora, a nossa proposta para o Ministério das Finanças privilegiou o menor impacto para os sectores sociais, nomeadamente a saúde e educação, particularmente nos orçamentos para os hospitais e centros de saúde. O maior impacto vai verificar-se nos investimentos públicos.
Refere-se a quê? A estradas que deixarão de ser reabilitadas?
Possivelmente, estradas terciárias e secundárias, projectos de requalificação, etc. Mas vamos continuar a negociar, a ver se conseguimos minimizar o impacto desses cortes.
2019 será um ano difícil para Malanje?
O que nos preocupa não é tanto o corte que houve no nosso orçamento. O que nos preocupa é termos um orçamento com afectação de verbas regular. O que chamo de orçamento efectivo. Nós entendemos as dificuldades. O país vive dificuldades orçamentais, financeiras e de tesouraria. Há um grande esforço por parte do Presidente da República em captar recursos, promover também uma boa gestão desses recursos, mas o que realmente também nos preocupa é que haja mais regularidade na afectação de verbas, de pagamento aos fornecedores, prestadores de serviços, etc.
A população malanjina tem estado a expressar, nos últimos tempos, algum descontentamento em relação à forma como a província está a ser governada. Como o governo vê isso?
É preciso dizer que, nestes últimos quatro anos - e esta governação está em funções desde 2013 -, o país entrou numa crise profunda e Malanje não foge à regra. Muitos dos investimentos que estavam previstos não foram realizados em vários sectores, inclusive o social. Isso gera também uma certa frustração e descontentamento na população, porque as necessidades são crescentes e os recursos cada vez mais escassos. É normal que haja essa pressão. Temos estado a comunicar, a informar a população em que condições estamos a governar. Há o corte de 30% no orçamento. Naturalmente que vai haver algum impacto no bem-estar da população e também menos recursos vão ser destinados à satisfação das suas necessidades. Qual o destinatário principal nesses casos de descontentamento? É a governação! Mas temos estado a explicar o que o governo está a fazer e quais são as expectativas.
A centralidade de Malanje foi foco das últimas manifestações de descontentamento. O que se passa neste caso particular?
Essa é outra questão. A população acha que não está a ser bem atendida. Mas é preciso dizer também que há boas perspectivas. As obras da centralidade já estão retomadas, embora não ao ritmo que desejávamos. A requalificação dos bairros da cidade de Malanje, da energia, da água, enfim! O actual governo de Malanje está a fazer tudo para que esses problemas sejam resolvidos. Mas é evidente que não vão ser resolvidos no curto prazo. Isso é um processo. Não se resolve em um ano, mas em vários anos.
Há uma visão estratégica para a província?
A perspectiva, conforme previsto no nosso plano de desenvolvimento nacional 2018-2022, é que Malanje, devido ao seu potencial e à sua localização, se transforme, numa zona de desenvolvimento económico diferenciado e acelerado. E por extensão, a região do médio kwanza tem condições básicas para um desenvolvimento económico diferenciado e acelerado.
Diferenciado porquê?
Porque Malanje vai-se transformar-se no maior produtor de energia eléctrica pelo menos da zona norte do país. E o potencial energético dá-nos possibilidade e perspectivas para a industrialização da região e uma alternativa à industrialização do litoral. Malanje pode ser, por exemplo, uma alternativa a Luanda e partir daí para o interior. E assim desafogar Luanda, mesmo do ponto de vista demográfico. Porque Malanje é servida por uma linha férrea. Está em construção uma plataforma logística com um porto seco associado no município de Cacuso. É servido por dois aeroportos de média dimensão. É uma província que tem um potencial enorme e pode transformar-se numa alternativa de desenvolvimento. Tem ligação directa com a RDC e pode ser um mercado importante para os nossos produtos. Essa é a visão estratégica que temos para Malanje.
E em relação ao potencial turístico, que perspectivas?
Sobre o turismo, há boas perspectivas. É um dos vectores do desenvolvimento da província. Além das Quedas de Calandula, temos mais cerca de 60 pontos turísticos mapeados e localizados. O grande desafio é fazer chegar lá também a infra-estrutura, água e energia e tornar estes pontos apetecíveis aos investidores, no sentido de se criarem infra-estruturas de acomodação. Em Calandula, por exemplo, já o Estado investiu bastante na estrada, vias de comunicação. Hoje, já é muito mais fácil chegar a Calandula, mas temos um grande desafio, que é a energia eléctrica. Prevê-se que, este ano, se resolva esse problema. Em Calandula, foi ainda reabilitado um grande projecto, a pousada de Calandula, que, por mais de 20 e tal anos, foi obstruída pela guerra e que hoje já é um grande ponto de atracção de turistas, onde esteve hospedado Agostinho Neto, nos anos 1970.
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