MPLA nega ter agenda de revisão constitucional
POLÍTICA PARTIDÁRIA. Oposição e diferentes analistas consideram haver necessidade de uma revisão constitucional, desde que tenha como foco a redução dos poderes do Presidente e a sua forma de eleição.
O MPLA nega estar a promover discussões internas que visem a revisão constitucional, garantindo estar concentrado no apoio ao Governo no combate à pandemia da covid-19.
Falando em exclusivo ao VALOR, em resposta aos rumores que dão conta de debates internos com vista ao alargamento dos anos e do número de mandatos presidenciais com uma possível corrida presidencial de João Lourenço após o eventual segundo mandato, o porta-voz do MPLA assegura que, neste momento, estão focados “a implementar um conjunto de medidas para apoiar as empresas, as famílias e o sector informal da economia, visando mitigar o impacto económico-financeiro da pandemia”.
Albino Carlos destaca que, apesar de o MPLA ter como agenda para 2020, a “intensificação das reformas políticas, económicas e vencer os próximos desafios eleitorais”, o partido está “apostado em ajudar o Executivo e a sociedade” a combater a pandemia da covid-19.
A informação posta a circular por diferentes portais de notícias, segundo a qual a direcção do “MPLA tem discretamente abordado com os militantes a possibilidade de promover a alteração da Constituição”, “visando alargar para três o número de mandatos do Presidente da República e/ou aumentar de cinco para sete os anos de cada mandato” também tem sido seguida atentamente por diversos actores da oposição e não só. Na matéria, os portais sublinham que a pretensão do MPLA se baseia no facto de o Presidente João Lourenço não ter tido tempo para “melhorar a vida dos angolanos” por causa da “corrupção que devia ser combatida”, “além de o ano de 2020 ter sido tomado pela pandemia do novo coronavírus”.
Entretanto, diferentes analistas e actores na oposição mostram-se favoráveis à revisão constitucional, desde que tenha como mote a redução dos poderes do Presidente e do seu modelo de eleição.
De qualquer forma, Sapalo António, político e ex-presidente da bancada parlamentar do Partido de Renovação Social, sublinha que não se manifestaria surpreso caso as notícias sobre a alegada vontade do MPLA em aumentar o limite de mandatos venham a revelar-se verdadeiras. “É característico dos partidos de orientação comunista, como o MPLA, tudo fazerem para se perpetuarem no poder”, argumenta.
Sapalo António é, no entanto, a favor da alteração constitucional “urgente” para a “clara separação de poderes”, tornando o Presidente incompetente na nomeação de governadores e juízes. Para o antigo deputado, a justificação de que o ambiente político “não tem sido favorável” para melhorar a vida das populações “não colhe” e sublinha não serem necessários 15 ou mais anos para se resolver o problema do povo.
Raul Danda, primeiro-ministro do Governo Sombra da Unita, diz esperar que a suposta pretensão do MPLA “não passe de mera especulação”. O também deputado, que se recusa a aceitar que João Lourenço queira “claramente encher-se como ditador”, considera que um possível alargamento do número de mandatos do Presidente da República ou um adicionamento de dois anos em cada mandato seria um golpe constitucional.
À semelhança de Sapalo António, Raul Danda defende, com urgência, a revisão constitucional, com vista a tornar o poder “judicial mais funcional”, além da redução dos poderes do Presidente da República, bem como a alteração do seu modo de eleição. “Queremos que o Presidente se sinta com legitimidade de governar, e o Presidente, para ter legitimidade, devia, pelo menos, ser eleito com 50%+1 dos votos escrutinados”, observa Raul Danda.
Domingos Bernardo, politólogo, também defende uma “urgente revisão constitucional”, visando sobretudo a alteração do modelo das candidaturas. Entre outras, Bernardo acha “normal” que, “estrategicamente, o MPLA queira alterar a Constituição nos aspectos contrários à grande maioria dos cidadãos”, com o objectivo de manter o poder, mas adverte que o partido deve ter em conta as consequências que possam advir.
Para o politólogo, um aumento no limite de mandato do Presidente poderá “desencadear revoltas por parte de militantes mais radicais da oposição”, bem como reduzir o nível de aceitação que o partido granjeou a nível internacional.
Legalidade da alteração constitucional
Aprovada em Janeiro de 2010 e promulgada a 5 de Fevereiro do mesmo ano, a Constituição da República de Angola (CRA) completou dez anos em 2020 e desde 2015 que, legalmente, está apta a revisões.
Com base no artigo 233.º da CRA, a iniciativa de revisão é da competência do Presidente da República ou proposta por 1/3 dos deputados à Assembleia Nacional, sendo que a sua aprovação só é possível por maioria de 2/3 dos deputados, segundo o artigo 234.º. O grupo parlamentar do MPLA tem assim as condições necessárias para promover uma revisão constitucional sem o apoio de qualquer outra organização política, dado que detém 150 dos 220 lugares da Assembleia Nacional. A Unita, maior partido na oposição, controla 51 lugares, a CASA-CE 16, o PRS dois e a FNLA um.
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