CRISE ECONÓMICA E AUMENTO DOS PREÇOS SÃO AS JUSTIFICAÇÕES

Negócio de ‘reveillon’ em baixa

FESTAS. Produtores profissionais de ‘reveillons’ queixam-se de estar a ganhar menos. Mas operadores informais contrariam, considerando que o negócio se mantém “atractivo”.

 

Negócio de ‘reveillon’ em baixa

A produção de festas de fim de ano foi também afectada pela crise económica, o que provoca a redução do número de ‘reveillons’. Os produtores lamentam a subida dos preços das bebidas e alimentos e queixam-se que os despedimentos de trabalhadores também afectam o número de festas, já que são eles os potenciais clientes. Diferente de períodos anteriores, para a realização de um ‘reveillon’, alguns investem mais de 10 milhões de kwanzas, outros gastam um pouco menos, mas dificilmente chegam abaixo dos quatro ou cinco milhões de kwanzas. Além da licença nas administrações locais, que custam entre 12 mil e 80 mil kwanzas, dependendo da dimensão da festa.

Ao VALOR, Dj Dias Rodrigues, realizador de festas desde 1994, não tem dúvidas de que, há dez anos, o negócio era mais atractivo, não só pelo maior poder de compra do consumidor, mas também pelos preços dos produtos. “Mas hoje, até para passar uma publicidade na rádio, de pouco menos de uma semana, podemos gastar 300 mil ou mesmo 500 mil kwanzas”, lamenta, sublinhando “ser penoso e doloroso investir no sector, dado que, às vezes, acaba por não render”.

Além de festas, Dias Rodrigues é um produtor musical, que se nega a desistir, mesmo com as dificuldades. Considera que a concorrência que paga a músicos para actuar nos ‘reveillons’ “tem mais” gastos do que ele próprio, que, de “modo visionário”, criou o Projecto Pikante em que convidou 87 músicos. Ou seja, como produtor musical, Dias Rodrigues produz para estes cantores e, em contrapartida, os músicos actuam nas suas festas sem serem pagos. Fazem parte do convénio a Ary, Titika, Livong, Kenny Bass, entre outros.

No reveillon do Pikante, da passagem de ano de 2017 para 2018, participaram entre 700 e 800 pessoas, com preços fixos de 23 mil kwanzas. Para 2019, Dias Rodrigues criou dois ingressos, o normal a 12 mil kwanzas e o Vip em 20 mil kwanzas.

Áureo Gama, administrador executivo da MD House, é produtor de eventos há 20 anos e realizador de ‘reveillons’ há dez. Converge com Dias Rodrigues, quanto à realidade do mercado.

Para mitigar o impacto da crise, recrutou pessoal já com alguma experiência e, ele próprio, além das funções que ocupa, tem posto a ‘mão na massa’, trabalhando como produtor. Para a realização do ‘Revellion Familiar’, marcado para 31 deste mês, no espaço da MD House, na Via Expressa, a organização investiu mais de dez milhões de kwanzas, que inclui gastos com os músicos, impressão de bilhetes, decoração, iluminação, som, palco, alimentação, bebidas e outros, bem como a publicidade nos média, esta última estimada em mais de três milhões de kwanzas. Como cabeça de cartaz, tem Paulo Flores e Yola Semedo.

O presidente executivo da MD House apontou ainda, além dos altos pre-ços dos produtos e a desvalorização da moeda, a localização da ‘casa’ como uma das desvantagens da organização. “Esses eventos já foram lucrativos, mas deixaram de ser. Tanto é que devemos ter em conta também que, nestes períodos, os preços das coisas dobram. No dia 31, até o colaborador quer receber mais do que recebe em períodos normais”, sublinha Áureo Gama, considerando “ser uma irresponsabilidade sem dimensão” a realização de um ‘reveillon’ sem licenciamento.

Diferentes de outros, Áureo Gama recusa-se a ter parcerias com marcas de bebidas para não ser forçado a colocar uma única marca no espaço. “Não posso aceitar exclusividades, porque há clientes que só bebem uma determinada marca. Prefiro perder mais 100 ou 200 mil kwanzas e ganhar mais 20 clientes, daí que opto por comprar as bebidas, ao invés de celebrar parcerias com uma empresa”, refere o responsável, que espera uma noite com mais de 700 pessoas.

Na festa de 2018, a MD House comercializou ingressos a 25 mil kwanzas e teve 530 pessoas, o que se traduziu numa arrecadação de 13,2 milhões de kwanzas, só com bilhetes. Para a passagem de ano de 2018 para 2019, a organização fez uma destrinça entre adultos e jovens, sendo o ingresso juvenil a 25 mil kwanzas e o adulto a 35 mil kwanzas.

A Falante Sidney, com sede no Hoji Ya Henda, investiu quatro milhões de kwanzas. Apesar da crise, Alfredo Sidney, dono e gestor da instituição, manifesta fé de que o ‘Reveillon da Paz’ seja melhor do que do ano anterior. E justifica pela venda de ingressos já realizada. Em 2018, apareceram 300 pessoas, porém diz já terem distribuído 325 ingressos, a 20 mil kwanzas cada.

Informais satisfeitos

Ao contrário dos produtores profissionais, alguns realizadores que operam sem licenciamento declaram-se satisfeitos com o mercado. E acreditam, inclusive, que o negócio tem “melhorado” a cada ano. Gil Sampaio, de 32 anos de idade, realiza ‘reveillons’ há três anos, no Sambizanga. Alega nunca ter registado os eventos por, na sua perspectiva, ser “oneroso e demorado”.

O jovem garante que tentou licenciar-se este ano, mas que lhe foi negado por já se ter ultrapassado o período legal para a entrada da documentação. No ‘réveillon’ passado, a organização de Gil Sampaio investiu menos de 500 mil kwanzas e arrecadou 1,2 milhões de kwanzas.

O realizador tem convénio com alguns trabalhadores da Cuca e da Nocal, que lhe trespassam as cervejas, depois de receberem por senhas. Os colaboradores das duas cervejeiras são portadores de senhas que lhes permitem receber dez grades, de três em três meses. Depois, vendem abaixo do preço do mercado. “Para realizar as minhas festas, alugo um espaço, contrato um DJ menos oneroso e vendo bebidas e churrascos. Portanto, lucra-se um bocadinho”, revela. À semelhança de Gil Sampaio, Paulo Fernando está há dois dias a tocar músicas na rua, anunciando a realização do seu ‘réveillon’, na zona do Nzamba I. Este ano, investiu 600 mil kwanzas.

Normas legais

Para a realização de um ‘reveillon’, o requerente deve endereçar, num período de 15 dias antes da data do evento, uma petição à administração local (informando o local, hora e dia), em anexo a cópia do bilhete de identidade, uma declaração da comissão de moradores e o pagamento de 1.300 kwanzas.

Em dois ou três dias, a equipa da cultura, junto da administração, desloca-se ao local para averiguar e emitir um parecer que, pelo qual, o requerente paga cinco mil kwanzas, bem como 12.560 kwanzas para o evento. No entanto, para festas com uma moldura humana superior a 200 pessoas, “paga-se um pouco mais”, segundo uma fonte da administração distrital do Sambizanga.