ANGOLA GROWING
YURI SIMÃO, DIRECTOR DA PRODUTORA NOVA ENERGIA

“O ‘Show do Mês’ não tem bons rendimentos”

24 Jul. 2017 Marcas & Estilos

CONCERTO. É considerada a maior promotora de espectáculos acústicos em Angola. 12 milhões de kwanzas é o valor investido para a realização de uma edição. Para actuar, é necessário ser reconhecido e ter disco consagrado.

thumbnail Yuri Simao 18

Como surgiu o ‘Show do Mês´?

O ‘Show do Mês’ nasce em 2012. Estava a trabalhar num projecto completamente diferente, olhei para a estrutura do mercado e percebi que faltava um espectáculo diferente. Estávamos a viver uma fase em que os artistas de cartazes eram sempre os mesmos, em vários palcos. Criei o conceito e depois juntámos a equipa para desenvolver. Foi no intuito de fazer um ‘show’ diferenciado.

Não teve receio em executar a ideia?

Não. Aqui está um grande diferencial do ‘Show do Mês’: foi olhar para o mercado e perceber que existem vários nichos. Ou seja, também existem mil pessoas que gostam do Filipe Mukenga, e mil que gostam de Selda e tantos de outros… O mercado não vive apenas do que está a bater. Se assim fosse, Roberto Carlos, por exemplo, não teria público durante tantos anos. Isso encorajou-nos a não ter medo de arriscar, e principalmente de querer fazer diferente.

Que desafios enfrentou?

Muitos. Pessoais e profissionais. Não é fácil começar coisas novas e com uma filosofia nova, que possa ser entendida tanto por nós, pelo público e pelos próprios músicos, pois a filosofia do ‘Show do Mês’ é completamente diferente. Quando abordamos o músico, fazemo-lo dentro do projecto, do nosso esquema e métricas. Seleccionamos desde o repertório e tudo o que é esquematizado para o espectáculo. Foram desafios muito grandes, sobretudo devido a falta de ‘sponsor’ (patrocinador, em inglês) para um espectáculo que, à partida, é mais cultural que comercial.

Como é feita a selecção dos artistas?

O músico ou tem muito talento reconhecido por nós ou tem uma obra discográfica consagrada. Por isso, olhamos sempre para o músico que tem um disco com qualidade, mas que não tem muitos palcos para se exibir. Acabamos por selecionar não só o artista de cartaz, como também o convidado-surpresa. Depois, desejamos ter num espectáculo ou fazer outros tipos de conceitos como ‘Angola 70’, ‘Show Piô’, ou homenagens a músicos de outros estilos.

Já pensou em desistir por falta de apoios?

Já. Em 2015 anunciámos que seria o último espectáculo. Tínhamos a promessa de um apoio que não aconteceu.

Como deu volta à situação?

Foi aí que o banco Keve e a Global Seguros salvaram o ‘Show do Mês’. Foi numa altura em que a gente teria desistido, mas eles conseguiram suportar-nos da segunda temporada até ao fim. Depois, conseguimos fechar um acordo de parceria para 2016 e 2017.

Quem mais apoia o projecto?

Os grandes sustentos do projecto são no BAI Artes, o banco Keve, a Unitel, a Rádio Nacional de Angola e o hotel Royal Plaza. Estes conseguem ajudar a pagar cerca de 70% do espectáculo. Depois temos de procurar na bilheteira o resto.

Quanto custa produzir um espectáculo?

O ‘Show do Mês’ custa cerca de 12 milhões de kwanzas por edição. Estamos a falar de um espectáculo em que a gente cometeu o ‘erro’, saudável, de colocar a qualidade do espectáculo num patamar. E hoje, quando o público sai de casa para assistir ao ‘show’, não querem menos do que aquilo. Não estão dispostos a ver menos do que o esperado. Esta fórmula acabou por fazer com que investíssemos bem na luz, no som e na indumentária. Temos uma banda composta por 14 músicos. É difícil encontrar isso em Angola. Colocamos tudo aquilo que a música tem para dar a qualidade acústica necessária. Além disso, tem transmissão online. Hoje, o ‘Show do Mês’ é o maior explorador de música angolana ao vivo. Ou seja, tem mais de 40 espectáculos na Internet e de livre acesso, onde as pessoas podem baixar e guardar, pois é património de todos nós. Toda essa dinâmica e logística está aliada à uma equipa de mais de 50 pessoas.

E os rendimentos…

O ‘Show do Mês’ não tem bons rendimentos. Só conseguimos não ter dívidas.

Qual foi o espectáculo mais difícil de fazer?

Cada espectáculo é um espectáculo. Há ‘shows’ com uma complexidade muito grande. Por exemplo, ‘Vozes de Março’: mulheres são estrelas por si só; é sempre muito complexo de fazer por causa das fórmulas do espectáculo. Mas o mais difícil, e ao mesmo tempo muito prazeroso de produzir, foi o ‘Cantar André Mingas’.

Porquê?

Pela complexidade e pela grandeza do próprio artista. Além disso, tínhamos uma expectativa muito grande. Na altura mudámos de banda e havia muita expectativa em perceber se o espectáculo havia de continuar com o mesmo padrão ou não. Superou as expectativas e retirou-nos o medo.

O que aconteceu com a parceria com a Banda Maravilha?

Trabalhámos juntos da primeira temporada até ao meio da segunda. Havia uma parceria óptima, só que, num determinado momento, o grupo acabou por precisar de ter um aumento de quase 80% do seu ‘cash’ e nós não conseguimos pagar. Entretanto, juntamos outros músicos e hoje montamos a banda do ‘Show do Mês’.

Como anda o mercado musical angolano?

Estagnado. Existe uma mutação de públicos. Há muito público novo para um tipo de música e, principalmente, um público que quer estar com os seus artistas, mas não sabe onde estar. Ou seja, existem três classes de músicos: os que vêm da independência, os que saem dos anos 80 até hoje e o novo público. Falta cada vez mais estruturação de mercado. Tivemos um ‘boom’ económico de artistas a fazerem espectáculos em Portugal, muitos discos, mas a estrutura de mercado, produtoras e produtos não aconteceu. Tivemos tanto dinheiro, mas ninguém fez uma fábrica de discos em Angola. Continuamos a gravar fora. Investiu-se em paredes e máquinas, mas faltou investir no homem. Se isso tudo não ficar harmonizado, os produtores não têm muito para fazer.

Perfil

Nome: Yuri Watayua Leopoldo Simão

Data de nascimento: 2 de Julho

Naturalidade: Luanda

Formação: Licenciatura em Comunicação Social

Estado civil: Casado

Filhos: Dois

Clube desportivo: Petro de Luanda

Um artista: Não tenho