Os maiores desafios dos alfaiates
OFÍCIOS. Mesmo com o avanço da industrialização da moda, alfaiates de rua e praças continuam na ‘berra’, por isso muitos procuram por oportunidades para o desenvolvimento do negócio. Crédito está no plano de todos, mas o fracasso é uma marca
Alfaiate ou costureiro são dos profissionais que vão resistindo à modernização e com “forte margem de crescimento”, sobretudo no que diz respeito ao ajustamento de peças. O quadro é desenhado ao VALOR por diversos profissionais.
Bento Bento é um deles. O alfaiate trocou o futebol pela tesoura e linhas e conta que, em 1979, ao notar que os seus colegas de equipas jogavam com calções rasgados, resolveu costurar e nunca mais largou a profissão. Aos 56 anos, Bento Bento contabiliza já cerca de 38 anos de profissão, que lhe proporcionaram tudo o que tem.
Segundo estima, nos melhores dias, factura entre 12 e 13 mil kwanzas, valores que servem para a aquisição do material necessário para o ofício, como linhas, tecidos, botões, tesoura e outros utensílios.
A trabalhar por enquanto na rua, Bento Bento tenciona legalizar-se e garante que a profissão significa muito para a sua vida e da família e, por isso, sonha evoluir. Dos planos consta a aquisição de novas máquinas e a montagem de uma oficina para receber jovens que desejam aprender a profissão.
O desejo de conseguir um crédito também faz parte dos objectivos, apesar de ter recorrido a bancos e não ter sido bem-sucedido, por falta de alguns documentos e avalista. Com a nova tentativa, e caso consiga o financiamento, o alfaiate pretende formar uma escola de corte e costura que considera ser uma área que pode gerar muito dinheiro e também empregar pessoas, desde que os recursos sejam bem aplicados. “Preciso de 20 milhões de kwanzas para alavancar o negócio”, precisa.
Quem também encontra dificuldades em obter crédito bancário é o alfaiate Zombo César. De 47 anos, César pretende investir num curso de alta-costura. Para já, trabalha na rua numa pequena sombra improvisada com alguns panos e luando, mas o objectivo é arranjar um lugar com melhores condições.
À porta da quadra festiva, Zombo César conta que consegue obter por dia entre 12 e 15 mil kwanzas e, em dias ruins, o número desce para entre oito e nove mil kwanzas. Além de sustentar a família com o trabalho, está a criar poupanças para arrendar um espaço maior e legalizar a sua profissão. “Já tenho nome da empresa que desejo criar.”
Há 14 anos na costura está também Carlito Kazamba, 34 anos, que diz ter-se apaixonado pela arte quando viu o seu tio coser algumas roupas. Apesar de não concluir os estudos, o jovem alfaiate sublinha que tem na profissão o único ganha-pão. A trabalhar numa alfaiataria com máquinas modernas e eléctricas, junto ao famoso prédio dos cubanos, no Maculusso, revela que fazem de tudo um pouco, desde pequenos remendos até roupa por encomenda.
Kazamba conta que a ideia de empreender, neste ramo, surgiu quando o espaço tinha sido arrendado a outra pessoa e, após o fim do contrato, resolveu apostar na moda. Nesta fase, encontra-se no processo de legalização do negócio, uma vez que conta com “uma boa base de clientes fiéis”. Como o segredo é alma de qualquer negócio, o jovem alfaiate preferiu não revelar a facturação. Nos planos de crescimento, prevê parcerias e a sua presença em “zonas nobres”.
No bairro da Madeira (Calemba), em Luanda, encontrámos Victor Kunbissa, de 68 anos, na chamada ‘Pracinha da Polícia’. Sentado a uma sombra improvisada e com ar de poucos amigos, conta que não consegue bons rendimentos devido ao elevado número de alfaiates. E diz que possui duas máquinas que não consegue utilizar por falta de espaço. “Nunca pensei associar-me a outros colegas e pedir um crédito, por falta mesmo de interesse”, precisa.
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