Para quando houver transparência…
Das várias leituras que o Orçamento Geral do Estado nos permite fazer, voltamos a destacar a facilidade que o Presidente da República se confere a si próprio de aprovar os chamados créditos adicionais. Trocado por miúdos, são os tais gastos não previstos que o titular do poder executivo pode autorizar, no decurso da execução do Orçamento.
Como é óbvio, não é possível defender a hipótese de se vedar ao Presidente a faculdade de autorizar despesas extra, após a aprovação da planificação financeira do Estado. Variados imprevistos, como a crise pandémica que nos bateu à porta ou eventuais catástrofes naturais, podem exigir recursos inclusive fora das reservas orçamentais.
O problema concreto e que tem justificado inúmeras críticas fundadas é o facto de não existir um limite teórico razoável destas despesas. Pela forma como a Lei do Orçamento consagra essa facilidade, João Lourenço pode gastar os montantes que quiser, desde que os justifique com “projectos de significativa importância”, com fontes de financiamento asseguradas.
Ocorre que a transparência do Orçamento de Estado, enquanto instrumento político de governação, deve ser percebida sobretudo nos limites alcançados na fase de negociação política. Quando se adicionam facilidades que permitem alterar significativamente os compromissos previstos, em última instância, a transparência fica necessariamente comprometida.
Esta leitura é particularmente relevante em períodos de forte competição política, como a fase de eleições que já vivemos. Para quem está no poder, a possibilidade de aprovar gastos públicos, sem uma palavra dos deputados, funciona como um inegável trunfo contra os adversários. Não será surpresa nenhuma, portanto, se, ao chegarmos ao fim de 2022, a soma dos créditos adicionais atingir a níveis proibitivos, com os gastos eleitoralistas.
Precisamente por isso é que, no dia em que se estabelecer em Angola um poder empenhado com a transparência, esta matéria será incontornavelmente revista. Até porque o compromisso com a boa governação implica necessariamente uma maior capacidade de planificação que, como se sabe, este e os outros governos do MPLA nunca tiveram. E maior e melhor capacidade de planificação significa sempre maior e melhor capacidade de execução. Em teoria e na prática, há uma inegável relação de causa-efeito.
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