José  Carlos

José Carlos

Bettencourt, Eng.º Agrónomo

Normalmente as crises levam-nos a ver os novos caminhos para a análise da realidade. É o caso da crise humana, ambiental, económica, política e militar provocada pela guerra entre a Rússia e a Ucrânia. Por meio dela, mostra-se a extrema e perigosa dependência de outros países que Angola tem no suprimento de insumos agrícolas, como fertilizantes, fitofármacos, sementes, equipamentos agrícolas e acessórios.

Ou muito me engano, ou nunca se falou tanto da Reserva Estratégica Alimentar, vulgo REA, como hoje. São comentadores de rádio, é nas redes sociais ou nas conversas do dia-a-dia ou ainda em encontros via Zoom. Contudo, nota-se, a todos os níveis, uma falta de rigor gritante quanto ao conceito em si e quais os verdadeiros objectivos do que se está a implementar. Ouve-se falar que chegou ao Porto do Lobito, X mil toneladas de milho para a REA. Todos se indagam, importado? Porquê? Não há milho no país? Mas a REA não deveria ser constituído com produção nacional? Nota-se uma enorme falta de comunicação e quem comunica demonstra um constrangedor desconhecimento do que é efectivamente a REA e quais devem ser os seus objectivos ou quais as razões da sua criação. Ainda antes da pandemia do covid-19, quando se realizou o balanço sobre o cumprimento dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável, notou-se que, o ODS 2.1, “assegurar o acesso de todas as pessoas a uma alimentação sã, nutritiva e suficiente durante todo o ano”, e a meta do ODS 2,2, “erradicar todas as formas de má nutrição”, até 2030, estavam muito distantes. Hoje, com o actual estado pandémico, essa situação tem vindo a agravar-se ainda mais. Os preços dos alimentos aumentaram de forma assustadora, a capacidade de compra reduziu tremendamente, os stocks em determinadas partes do mundo encontra-se a níveis bastante baixos e a situação de determinados Países em África é preocupante. Angola, não foge à regra, agravado pela situação de seca cíclica que afecta determinadas zonas. Milhões de angolanos fazem uma simples refeição por dia ou nenhuma ou ainda não têm garantias que amanhã ou nos próximos dias terão acesso a alimentação. A situação é preocupante. Falar-se da REA poderia ser uma lufada de ar fresco, mas, ao analisar os meandros da sua execução, sentimos uma sensação de fracasso anunciado, ou algo muito pior. Ora vejamos, Reserva alimentar está necessariamente associado à Segurança Alimentar e Nutricional (SAN), à Soberania Alimentar e à estratégia de combate à fome e ao aumento da produção doméstica. Colocar-se-á a questão, o que é Segurança Alimentar e Nutricional (SAN), é a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais e que sejam social, económica e ambientalmente sustentáveis. Situações de insegurança alimentar e nutricional podem ser detectadas a partir de diferentes tipos de problemas, tais como fome, obesidade, doenças associadas à má alimentação, o consumo de alimentos de qualidade duvidosa ou prejudicial à saúde.