Governo mantém compromisso de honrar serviço da dívida
MEDIDAS DE CONTIGÊNCIAS. Apesar das fortes dificuldades assumidas, Governo mantém a aposta de honrar o serviço da dívida prevista para 2020 na totalidade. Já em relação ao financiamento interno, Executivo perspectiva novos prazos para pelo menos 50% da dívida.
O Governo “mantém o compromisso de honrar o serviço da dívida” externa, segundo um membro da equipa económica, quando questionado pelo VALOR sobre o facto de a negociação da referida dívida não constar entre as medidas de contingências para fazer face à crise financeira agravada pela pandemia Covid-19.
“De momento, ainda não temos nada a partilhar sobre o assunto [negociação da dívida externa]. Mantemos o compromisso de honrar o serviço da dívida”, respondeu.
A ausência da negociação da dívida externa é um dos aspectos que salta à vista entre as medidas que foram apresentadas na semana passada, na voz da ministra das Finanças, Vera Daves. O ‘rollover’ desta dívida foi inúmeras vezes apresentado como uma das apostas que o Governo devia seguir, considerando o forte peso do serviço da dívida na estrutura do Orçamento de 2020, representando cerca de 60%, e o peso da dívida externa no global.
No plano do Governo, entretanto, consta o alcance de uma taxa de rollover mínima de 50% no financiamento interno, estimando uma poupança de cerca de 1.150 milhões de dólares.
O economista Domingos Forte defende que o Governo deveria tentar uma negociação semelhante com o financiamento externo. “Valeria a pena tentar, também é dívida como a interna. É uma negociação, mas vale a pena dar o passo. Se se conseguir, muito bem, se não, pelo menos tentámos. Não podemos ficar sem tentar. Penso que conseguiríamos”, insiste.
Entretanto, o economista não coloca de parte a possibilidade de a ausência de negociação da dívida externa, entre as medidas, resultar de uma estratégia do Governo. “Deve ter alguma jogada na manga ou talvez não queira enviar aos mercados uma mensagem de fraqueza, preferido esperar pelo que acontecerá no meio do caminho.”
Menos ministérios…
A redução da estrutura governamental é uma das medidas do plano de contingência, passando de 28 para 21 ministérios. Apesar do consenso que a decisão reúne, existem, entretanto, interrogações sobre como a redução do número de ministérios vai traduzir-se em ganhos financeiros. “O Governo, melhor do que ninguém, que se dimensionar a si próprio, respeitando, entretanto, critérios de rigor, eficiência e eficácia”, defendeu o economista Alves da Rocha, acrescentando que esta redução só terá resultado se o Governo não procurar compensar com o aumento de mais secretários de Estado. “Esse é o meu receio. Se a reestruturação for cortar ministério, mas, como compensação, criarem-se mais secretarias de Estado, fica praticamente tudo na mesma. De qualquer maneira, é um sinal de que o Governo entendeu que o país está em crise”, comenta.
O economista defende ainda que o ajustamento da estrutura governativa deveria também representar o fim da “grande instabilidade institucional com exonerações” que se assiste desde que o Presidente tomou posse. “O que significa que ainda não se encontrou a estrutura governativa ideal e pode ser que isso agora venha a acontecer”, admite.
O economista Domingos Fortes também aplaude a redução do número de ministérios, mas sublinha que “não garante, logo à partida, a libertação de meios financeiros” para o reforço do orçamento. “Tudo dependerá das políticas de afectação desse pessoal porque, se se mantiver o mesmo pessoal, não se estará a fazer nada”, defende, para depois sugerir nomeações que permitem que os ministérios se livrem dos “assessores que consomem muito dinheiro”.
“Sou dos que defendem que os secretários de Estado devem ser indivíduos com carreira, pessoas que crescem a pulso e são estes indivíduos que vão assessorar o ministro que pode ser um político. Mas o secretário de Estado tem de ser um tecnocrata e isso não está a acontecer, depois faz-se recurso a muitos assessores”, critica.
‘Morte’ do Fundo Soberano garante 29% do dinheiro necessário
As medidas de emergência decretaram também a descapitalização em 1,5 mil milhões de dólares do Fundo Soberano. Na prática, a capitalização inicial do Fundo fica reduzida a 1,5 mil milhões de dólares, visto que, para a implementação do PIIM, o Governo retirou dos cofres dessa entidade dois mil milhões de dólares. No entanto, “há o compromisso de uma recapitalização futura, logo que as condições das finanças públicas o permitam”, como se lê no documento que elenca as medidas do Governo de João Lourenço.
O economista Domingos Fortes entende tratar-se de uma “decisão acertada”, visto que o “fundo deve produzir efeitos multiplicadores através dos investimentos, estando a cumprir este papel é normal”. “A medida é de aplaudir, porque temos de contar com as nossas forças, temos de tirar gorduras. Tudo é valido, o dinheiro é nosso. Agora a reforçar o orçamento, é preciso que estes fundos sejam aplicados em áreas produtivas que possam produzir retornos. Se assim for, não há nenhum problema porque, dentro de alguns anos, podemos voltar a reconstituir o Fundo”, analisa.
Quem discorda com o fim do Fundo Soberano é o analista Flavio Inocêncio por entender que o fundo “baseia-se na equidade entre gerações”. “Infelizmente com esta crise financeira há pressões muito grandes para usar o dinheiro do Fundo. Na prática esta decisão de retirar 1,5 mil milhões de dólares do Fundo Soberano equivale ao fim do Fundo Soberano, assim como os 2 biliões alocados ao PIIM”.
Os recursos com origem no Fundo Soberano representam cerca de 29,3% do valor que o Governo perspectiva alcançar com as medidas um total de 5.102 milhões de dólares.
E outras medidas…
O Governo decidiu ainda avançar com a revisão do Orçamento Geral do Estado que passa a ter como pressuposto o preço do petróleo a 35 dólares contra os 55 por barril, e a produção de 1,36 milhões de barris/dia contra os 1,43 milhões das projecções em curso. Em relação aos diamantes, manter-se-ia o nível de produção, mas haverá redução do preço médio do quilate que passará dos 162 USD para os 100,3 USD.
Foram tomadas medidas para o período que vai até à aprovação do Orçamento revisto como a “cativação de 30% das despesas da categoria Bens e Serviços desde que não estejam relacionadas com alimentação (principalmente dos hospitais públicos e forças de segurança, medicamentos, limpeza e saneamento)”. Estão ainda suspensas as despesas de capital, com destaque para as novas aquisições de imóveis no país e no exterior, bem como as despesas de apoio ao desenvolvimento que não sejam de carácter prioritário e estrutural.
As suspensões abrangem ainda todos os processos de novas admissões e promoções na função pública, com excepção dos sectores já previamente aprovados, até à finalização da revisão do Orçamento.
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