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Projectos não resolvem problema da mobilidade

Engenheiros chumbam construção de 40 viadutos em Luanda

04 Aug. 2021 Economia / Política

INFRA-ESTRUTURAS. Governo prevê construção de 40 viadutos em Luanda, mas apenas nove foram concluídos por culpa da crise. Projectos suscitam, no entanto, críticas dos experientes engenheiros William Paulo e António Venâncio. Ambos sugerem desinvestimento nestas infra-estruturas.

Engenheiros chumbam construção de 40 viadutos em Luanda

Dois experientes engenheiros ligados à construção civil são contra a construção de 40 viadutos na capital, sem a elaboração prévia de um estudo aturado de engenharia de tráfego.

William Paulo e António Venâncio argumentam que as infra-estruturas em nada ajudam na mobilidade na capital cada vez mais afunilada.

“A resolução do problema de mobilidade na nossa capital Luanda não passa meramente pela construção de 10, 40 ou 100 viadutos. Antes de mais, temos de estar conscientes de que o processo de resolução dos problemas de mobilidade da cidade é evolutivo, as soluções de hoje poderão não se enquadrar com as necessidades de uma Luanda do futuro. Entretanto, há formas e técnicas de se prever o crescimento demográfico expectável bem como o parque automóvel associado”, refere William Paulo.

O engenheiro repara, questionando a utilidade dos viadutos se as vias continuam a ser “as mesmas construídas há 50 anos, com a capacidade reduzida de acomodação de veículos”, como é o caso da via que liga a vila de Viana e o Zango.

António Venâncio, por sua vez, vai mais longe ao sugerir desinvestimento nestas infra-estruturas por serem inviáveis à mobilidade urbana que se pretende. Recomenda, entretanto, a aposta na construção de auto-estradas em Luanda e no resto do país. “Não é tão profícuo investir fortemente em mobilidade urbana localizada, quando não existe uma mobilidade rodoviária nacional operacionalizada com boas estradas de muito bom nível. A nossa mobilidade rodoviária nacional actual não confere com as exigências da cidade de Luanda, que já está na ordem dos 10 milhões de habitantes”, nota.

Dos 40 viadutos a contruir dentro do Programa Especial de Obras Públicas para a Cidade de Luanda (PEOPL), conforme dava conta em 2019 o ministro das Obras Públicas e Ordenamento do Território, Manuel Tavares de Almeida, só nove foram concluídos devido à crise. Deste número, os engenheiros chumbam, de forma particular, os do Cazenga e da Samba.

António Venâncio, por exemplo, não entende a construção da infra-estrutura do Cazenga visto que trabalha de forma isolada.“O viaduto do Cazenga não resolve nenhum problema de mobilidade, pelo contrário, pode complicar. Se não for associado a outros nós rodoviários, este viaduto é um empecilho para o tráfego, saneamento e drenagem das águas”, alerta.

A mesma crítica é feita por William Paulo ao viaduto da Samba. O engenheiro não percebe efectivamente o benefício da infra-estrutura. “Será o mesmo parte integrante da nova via da marginal a ser construída, conforme anunciado há anos? Será que, no actual contexto caracterizado por uma crise financeira profunda, o projecto da nova marginal será levado a cabo? A nossa economia hoje não tem espaço para comportar projectos desta envergadura. Porquê se fazer uma secção do projecto sem finalidade nenhuma se os outros 90% estão em risco de não serem implementados?”, questiona.

Em sentido inverso, sugere que o que tinha de ser feito na Samba é investir no estado do tapete asfáltico, iluminação da via, sinalização horizontal e vertical, gastos que teriam “maior utilidade ao cidadão”, ao contrário do que está a ser feito. “O Ministério das Obras Públicas precisa de adoptar uma postura de maior clareza, abertura e auscultação pública no que toca à implementação dos diversos projectos. O cidadão que paga os seus impostos, que directa ou indirectamente contribuem para a construção destes projectos públicos, precisa de compreender o que vai ser feito, como vai ser feito, qual é o impacto positivo que vai ter na sua vida, quanto tempo vai demorar, quanto vai custar, quem vai construir”, chama a atenção.

Questionado pelo Valor Económico, há mais de um mês sobre o assunto, o ministro das Obras Públicas e Ordenamento do Território não respondeu. Até ao momento, não se sabe o custo dos 40 viadutos ou ainda o investimento nos nove concluídos e nos outros três em fase de construção.

Crise trava obras

No passado mês de Junho, Manuel Tavares de Almeida, numa visita a obras estruturantes na cidade de Luanda, justificou a paralisação das obras do viaduto da UGP com a crise financeira. E avançou que a situação da obra, orçada em 55,4 milhões de dólares, seria ultrapassada, mas, até ao momento, tudo se mantém na mesma.

Quanto ao viaduto da Samba (Corimba), a obra orçada em 41,3 milhões de dólares não parou, porque o empreiteiro é responsável pelos encargos financeiros. O mesmo não se pode dizer do viaduto do Novo Aeroporto, cujas obras estão no 'pára arranca' há muito tempo.