A CULPA É DE QUEM MANDA

12 Jan. 2022 V E Editorial
A CULPA É DE  QUEM MANDA
D.R

o refrão que se repete ano após ano. Para o poder e para os mancebos e homens que o suportam, não há excepção à regra. Cada novo ano traz consigo irremediavelmente as velhas ladainhas e as antigas batotas. O 2022 também se anunciou desta forma. Mais uma vez, a ignorância, a manipulação e a bajulação procuram condicionar o debate sobre a convulsão social a actos de vandalismo praticados por populares consumidos pela agonia e o desespero. É a conhecida prática de inversão dos factos que releva as consequências e subalterniza as causas. Umas vezes por lamentável desconhecimento. Outras por descarada adulação. E outras ainda por indisfarçável maquinação política.

Há, por isso, uma necessidade crítica de se recentrar o foco e os factos. Na identificação das causas de fundo por detrás dos actos de vandalismo nesta segunda-feira, em Luanda, tem de se apontar o dedo directamente ao MPLA. Ou, para se ser mais preciso, ao longevo e desgastante poder do MPLA e à sua desastrosa governação. Sem rodeios. Sem apelo, nem agravo.

Quando um partido governa por quase meio século, servindo-se de todos os meios imaginários do Estado para se manter no poder, tem de ter o mínimo de vergonha para olhar para o retrovisor e assumir-se como a primeira e última causa do caos. Sobretudo quando nos encontramos na terceira década do século XXI. Sobretudo, quando praticamente todo esse período de governação tem, como marcas salientes e inconfundíveis, a delapidação do erário e a esterilização da democracia. Por outras palavras, a castração do progresso.

As convulsões sociais são, por isso, necessariamente uma consequência desse desgaste do poder e, com certa honestidade, não deviam constituir surpresa. Nos últimos anos, parte substantiva dos angolanos – dos menos letrados aos mais esclarecidos – não tem esperado por conclusões de thinks tanks para alertar para os perigos que a desgovernação do MPLA representa hoje. Ao contrário de ontem, hoje acumulam-se gerações às quais nada diz a ‘legitimidade histórica’ do MPLA, enquanto proclamador da Independência e vencedor da guerra.

Mais do que ontem, hoje juntam-se também outras gerações mais adultas que, libertadas pelo tempo das amarras do fanatismo e da manipulação, passaram a concordar que não se faz país com a forma como o MPLA se mantém a brincar de fazer país. Essas gerações mais adultas passaram a concluir também que não se gera progresso com promessas de aceleração da democracia, ao mesmo tempo que o poder reforça a partidarização do Estado. Passaram a entender que não se promove o desenvolvimento desejado com promessas de combate aos monopólios e aos privilégios nocivos, ao mesmo tempo em que se erguem novos monopólios e se sofisticam, à luz do dia, os métodos de assalto ao erário. É tudo isso que, no fim de contas, propicia as convulsões sociais. E as tentativas apressadas de se culpar adversários políticos são reveladoras do quão o poder se mantém igualzinho a si mesmo.