Mobilizar e operacionalizar fontes de financiamento

A difícil missão de Vera Daves

MACROECONOMIA. Recurso ao FMI, BAD e Banco Mundial estão sobre a mesa da ministra das Finanças. E emissão de Bilhetes de Tesouros constam de entre as sugestões de especialistas. 

A difícil missão de Vera Daves
D.R

Os economistas Laurinda Hoygaard e Jorge Leão Peres concordam ser “difícil” a missão da ministra das Finanças de “identificação e operacionalização de todas as fontes de financiamento possíveis para a mobilização de recursos” para fazer face aos efeitos da pandemia da covid-19. 

O desafio consta do decreto que aprova as medidas transitórias de resposta ao impacto da pandemia sobre o Orçamento Geral de Estado de 2020.

Para Laurinda Hoygaard, “na componente receitas, a margem de manobra da ministra está limitada”, restando as “fontes internacionais agora comprometidas pela crise global”. A docente universitária entende que se pode considerar esta uma missão “difícil”. 

“As prioridades são difíceis de determinar especialmente sem tempo e certamente meios para conhecer integral e rigorosamente todos os factos. Será quase um exercício por tentativas”, acrescenta.

Por sua vez, Jorge Leão Peres classifica como “extremamente difícil” a missão que João Lourenço confiou a Vera Daves.

“A nível dos impostos, espera-se muito pouco por conta da redução da actividade económica e os impostos petrolíferos andam atrelados ao preço do petróleo que está baixo. Geralmente, as fontes de financiamento do Estado são por via dos impostos e do endividamento interno ou externo. No caso do externo, poderemos recorrer, mas teremos de ponderar as condições financeiras que serão impostas e acredito que serão bastante apertadas”, sublinha. E sugere que se aposte no endividamento interno, mais concretamente na emissão de Bilhetes de Tesouro (BT) para os financiamentos de curto prazo e as Obrigações de Tesouro caso existam projectos de médio e longo prazos. “Apontaria para o endividamento interno mediante emissão de Bilhete de Tesouro e vai rolando a dívida. Ou seja, depois de vencerem, voltam a emitir-se títulos de modo a que as pessoas reapliquem e, dessa forma, não há desembolso financeiro efectivo por parte do Estado”, defendeu o antigo administrador do BNA. 

No caso da emissão dos BT, sugere o docente, o ideal seria os bancos comerciais não reterem para as respectivas carteiras, mas “passar ao público para que o sistema bancário possa estar capitalizado para poderem financiar a economia via crédito bancário”.

O também antigo administrador do BCI aponta ainda como outra possível fonte de financiamento o cumprimento da decisão de se “acelerar o processo de alienação de participações e activos do Estado no âmbito do Programa das Privatizações”, que é uma das medidas já aprovadas. Os dois economistas, entretanto, entendem que o sucesso de qualquer uma das operações passará pela racionalização das despesas. “O grande problema é que ainda prevalece uma certa indisciplina financeira por parte dos gestores públicos. Já numeradas uma série de medidas para melhorar as despesas, agora é necessário que sejam de facto cumpridas. Com estas medidas provisórias, sobretudo na contenção das despesas, teremos um orçamento que consiga sobreviver perante esta pandemia”, defende Leão Peres. 

Já Laurinda Hoygaard sublinha que “será mesmo obrigatória” a racionalização das despesas e acrescenta que “mesmo as medidas propostas e aprovadas apresentam muitos riscos”.

O QUE ESTÁ SOBRE A MESA DE VERA DAVES 

O VALOR apurou que algumas das propostas apresentadas pelos especialistas vão ao encontro das possibilidades que se encontram sobre a mesa da ministra das Finanças. “A prioridade será cortar ao máximo nas despesas e procurar manter apenas aqueles programas com financiamento garantidos e os que não tendo financiamento são indispensáveis. Só depois deste arranjo é que se vai definir o valor que se vai buscar e as fontes”, sublinhou fonte que conhece a linha de pensamento de Vera Daves. 

Em relação às opções, a fonte garante, entre as fortes possibilidades, está o recurso a instituições como o FMI, o Banco Mundial e o BAD por garantirem juros mais apelativos. “Esta decisão será tomada em função da necessidade de financiamento que o OGE vai determinar depois da revisão e de todo o exercício para forçar uma queda acentuada das despesas.” Sobre a banca interna, o VALOR apurou que não consta de entre as prioridades do Ministério das Finanças por pretender deixar esta fonte para apoiar os privados.  Entre as medidas já aprovados constam, entre outras, a revisão do OGE e a utilização de 1,5 mil milhões de dólares do Fundo Soberano de Angola.