A Sonangol, a dívida pública e os Lussatys
Que isto fique, mais uma vez, forçosamente registado. Quando um funcionário da Presidência enriquece com os meios de que se serviu Lussaty para enriquecer, o problema não está no major. Está necessariamente no sistema. E por muito espectáculo que se faça com o combate ao roubo ao erário, a verdade é que até hoje, em termos estruturais, nada se fez para se corrigir o problema de fundo. Ou, pelo menos, para se dar início ao processo de correcção do sistema. Há uma razão objectiva para essa incapacidade já mencionada aqui vezes sem conta. Ainda que por remota hipótese o desejasse, os níveis de podridão para o qual o MPLA arrastou as suas elites não lhe permitem empreender um processo sério e profundo de correcção do país. Mas não é apenas isso. Uma agenda verdadeiramente comprometida com a reformatação de Angola implica a efectivação de reformas que comprometem o projecto de poder do MPLA. ‘Aqui é que a porca torce o rabo’ e os factos são contundentes.
Quando João Lourenço chegou ao poder, a crítica avisada recordou-lhe caminhos incontornáveis, admitindo que a promessa de combate ao saque ao erário fosse para levar a sério. Além da montagem de uma estratégia ampla e integrada, como ponto de partida, o Presidente foi desafiado a encomendar auditorias externas e credíveis para duas das principais fontes de irradiação do saque: a Sonangol e a dívida pública. No quadro do que seria a estratégia integrada, foi também solicitado ao Presidente que desse prioridade à alteração do regime de declaração de bens para que, no primeiro ano do seu mandato, os angolanos passassem a saber o património dos seus servidores públicos. A tudo isso João Lourenço respondeu com um rotundo silêncio. E não se incomodou até em passar por cima do contrassenso, ao proclamar, na sua própria voz, que os empréstimos contraídos pelo Estado tinham servido para alimentar o enriquecimento ilícito. Sobre a declaração de bens, como se sabe, depois de quase quatro anos de mandato, nem um comentário. Enquanto se combate a corrupção, todos os dias entram e saem servidores públicos, mas os angolanos não podem saber o que tinham à entrada e o que passaram a ter à saída. No caso da Sonangol, a empresa na origem das maiores fortunas ilícitas do país, nem uma palavra. Aliás, apenas uma: o ataque exclusivo a Isabel dos Santos que tinha estado à frente da empresa por um ano. Tudo o resto sobre a petrolífera que não dissesse respeito à gestão da empresária não foi colocado na agenda da suposta guerra contra os roubos ao Estado. E os casos que foram aparecendo com ligações à Sonangol tinham sempre origem externa à empresa.
A explicação de todos esses cuidados é simples: declarações verdadeiras de todos os bens e auditorias externas credíveis, e sem queima de arquivos, levantam o risco de transformar em grandes e pequenos Lussatys até os actuais paladinos do combate ao saque. E a consequência óbvia seria a descredibilização, sem apelo nem agravo, de toda agenda, colocando em causa a sobrevivência do próprio MPLA. Precisamente por isso é que não há reformas e o combate à roubalheira vai acontecendo ao sabor da circunstância. Ou seja, apenas quando é para atacar um alvo ou quando a exposição dos factos torna a protecção insustentável. Mas também com as devidas excepções.
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