BUROCRACIA E POUCA DIVULGAÇÃO

Agências de microcrédito perdem para kínguilas

MICROFINANÇAS. Depois de anos a liderarem a preferência na compra e venda de divisas, as kínguilas tornam-se na primeira opção de trabalhadores, para fazer face à incapacidade de gerir os salários.

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A incapacidade de grande parte dos empregadores reajustar os salários ao ritmo da desvalorização do kwanza e, consequentemente, da inflação dos últimos anos expõe os trabalhadores maiores dificuldades para gerir o que ganham.

Como recurso, cada vez mais, os trabalhadores procuram pelo microcrédito. Um cenário que se apresenta favorável a bons negócios para as instituições que se dedicam à microfinança. Actualmente, existem 40 no país, 34 das quais em Luanda.

No entanto, estas também não têm sido a solução para muitos dos trabalhadores, que preferem recorrer ao mercado informal e negociar com as kínguilas devido à burocracia das agências. As kínguilas, por sua vez, aproveitam-se da realidade para solucionar a dificuldade de manter o negócio de compra e venda de cambiais, devido à escassez de divisas.

“Se não fosse este negócio, já estaríamos em casa porque o dólar está difícil. Praticamente, nós agora estamos mesmo a fazer este negócio de emprestar dinheiro” explica uma kínguila.

O negócio, na verdade, não é totalmente novo entre as kínguilas que, entretanto, sempre deram primazia à venda e à compra de cambiais.

Agora que prestam mais atenção ao negócio, consideram ser “muito bom” e todas, segundo apurou o VE, vão criando condições para ter o maior número de clientes, visto ser a confiança o factor determinante.

“O problema é que não se pode emprestar o dinheiro a qualquer pessoa, tem de se conhecer para não se perder o dinheiro. Então vamos falando com os nossos clientes confiados para nos arranjar em outros. Com o dólar não é necessário, pode-se vender ou comprar sem conhecer a pessoa”, conta Maria de Jesus.

O VE constatou que 50, 100 e ou 150 mil kwanzas estão entre os valores mais solicitados pelos clientes. Mas há kínguilas em condições de disponibilizar somas superiores a um milhão de kwanzas, o valor máximo previsto por lei para o microcrédito.

“Se alguém precisar agora de dois milhões, posso emprestar, mas nunca ninguém solicitou este valor. O máximo que já emprestei foram 800 mil kwanzas”, acrescenta Maria de Jesus. Segundo esta kínguila, por norma, quando emprestam valores muito elevados aceitam negociar o tradicional prazo de reembolso que é de um mês. “Depois do prazo, os clientes podem atrasar mais uma semana, é normal porque sabemos, que muitas vezes, os salários atrasam, o importante é avisar”, explica.

Por norma, cobram entre 20% e 50% de juros em um mês e, quase sempre, não assinam nada, ou seja ficam pelo acordo verbal. Esta facilidade, de resto, é o principal segredo do sucesso do negócio e elas sabem disso. “É assim [fácil], porque as pessoas já vêm aqui. Nos bancos, pedem muitos documentos, então já não podemos exigir muito. O segredo é mesmo conhecer as pessoas”, argumenta. A explicação é apoiada pelo depoimento de alguns clientes. Argumentam, por exemplo, tratar-se de mera teoria o discurso das agências de microcrédito, segundo o qual não existe burocracia.

“Se compararmos aos bancos, é verdade não têm burocracia, mas não é desta forma que as coisas devem ser vistas, mas sim olhando para as voltas ou documento que o cliente terá de tratar”, defende Paulo Coelho, que assume fazer, muitas vezes, recurso ao serviço de crédito das kínguilas.

Outra realidade que concorre para que o mercado informal vá ganhando força é a quase ausência de publicidade do mercado formal, visto serem muitos os potenciais clientes que desconhecem a existência de agências a prestarem o referido serviço, como o afirmaram vários técnicos de algumas instituições de microcrédito.