Altas figuras no saque ao combustível VS “baixas figuras” no saque ao arroz
Do partido-Estado, seus dirigentes e instituições, quase diariamente, chegam denúncias e queixas de vária ordem. O indicador é apontado para todos os lados: oposição, sociedade civil, colegas seus. Mas deles próprios, os acusadores, nunca se ouviu a assunção de qualquer erro, falha ou tropeço. Quais perfeitos! Se não são os vândalos que destroem os bens públicos, são os frustrados que atentam contra a vida do Presidente da República. Se não são os arruaceiros que desacatam as autoridades, são os agentes que cometem erros no exercício das funções. Se não são os indisciplinados que semeiam discórdia dentro do partido, são os que querem o poder a todo o custo e fomentam a balbúrdia.
Se não é a população que contrabandeia litros e litros de combustível, são altas figuras à cabeça do esquema. Ora, esta semana o ministro de Estado e chefe da Casa Militar do Presidente da República denunciou que há governantes, ex-governantes, membros das forças armadas e sobas por trás dos altos níveis de contrabando de combustível. Mas, senhor ministro, mais do que denúncias, queremos nomes, rostos e endereços, principalmente dos governantes que, fazendo parte do Governo de João Lourenço, têm a ousadia de tais práticas que vão contra os ideais do chefe. Atenção: contém ironia! Queremos também saber que tipo de governação é esta em que mais de 90% do combustível destinado a uma determinada província é contrabandeado, sem que haja quem saiba explicar como raios isso acontece. Enquanto não temos estas respostas, a denúncia, que não é propriamente uma novidade para ninguém, não passa do reflexo das entranhas de um sistema em colapso, em que o epicentro da corrupção está nas estruturas mais elevadas do poder. Entretanto, parece que o partido no poder, está mais preocupado em cimentar a sua presença através de demonstrações de apoio ao camarada presidente. Assim mesmo os militantes do MPLA, em Luanda, por exemplo, vão ‘kukulu kukulu’ marchar, este sábado por ordem e comando do governador provincial, Manuel Homem, em apoio a João Lourenço, que, em essência, soa mais a um clamor de perpetuação de um controlo que a sociedade já não deseja. Considerada uma marcha contra os que estarão a promover a indisciplina e a divisão interna no partido, já há quem a tenha apelidado de “marcha do MPLA contra o MPLA”. Mas a verdade é que não se entende se se trata de pura bajulação ou falta do que fazer. Já que se dizem tão unidos e coesos, qual a necessidade dessa demonstração de apoio ao líder?!... Por outro lado, e já que foi aprovada a tão contestada lei de vandalização dos bens públicos, e se, tal como activistas e partidos na oposição vêm denunciando, forem infiltradas pessoas alheias ao propósito da marcha? E se estas mesmas pessoas, com fins inconfessos, vandalizarem, destruírem, queimarem bens públicos? Veremos o feitiço virar-se contra o feiticeiro e será Manuel Homem o primeiro a pagar pelos actos de outrem? Obviamente que não. Mas que seria engraçado, seria! Em suma, Angola vive um momento em que a corrupção e a falta de respeito pela democracia se entrelaçam numa trama que pode definir o futuro. Enquanto o futuro é incerto, o presente é vivido à base da lei do mais vijú, guiado por um instinto primário: a sobrevivência. Pessoas que, em outras situações, seriam consideradas de bem, viraram os ladrões da vez, empurrados pela urgência de satisfação do vazio no estômago. Estas pessoas, hoje, não hesitam em assaltar camiões de arroz. A cena é trágica e quase surreal. No fim das contas não se pode apenas criticar, é preciso entender as condições que levam pais e mães de família, miúdos e graúdos, a sequer inibirem-se perante câmaras de telemóveis para conseguir o seu ‘cassaco’ de arroz. Porque é que estas pessoas sequer pensam no sacrifício do dono da mercadoria? É igualmente necessário entender se, enquanto a fome reinar, seremos todos, de certa forma, ladrões ou vítimas dessa cruel dicotomia…
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